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Adriano Benayon
1. A desindustrialização
do Brasil não tem sido explicada adequadamente, sequer pelos
economistas menos vinculados à ideologia das corporações
transnacionais.
2. Em entrevista à BBC
(13.07.2012), Gabriel Palma, professor da Universidade de Cambridge,
Inglaterra, lembrou que, em 1980, a produção industrial no Brasil
superava a do conjunto formado por China, Índia, Coreia do Sul,
Malásia e Tailândia e que, em 2010, já não representava senão
10% do total produzido nesses países.
3. O economista Leonardo
Guimarães Neto, publicou artigo no portal do Centro Celso Furtado,
Ano 6 - Edição 8, Recife, 13.04.2012, intitulado "A retomada
da indústria brasileira: o recado de Antônio Barros de Castro".
4. Nele, aprecia o pacote
de estímulos, de R$ 60 bilhões, à indústria brasileira (sic),
incluindo: desoneração fiscal, ampliação e barateamento do
crédito; redução de até 30% do imposto sobre produtos
industrializados para o setor automobilístico; redirecionamento de
compras governamentais para bens produzidos internamente; redução
de impostos na tecnologia da informação.
5. Deixa de denunciar
mais esse absurdo presente à predadora indústria automobilística
estrangeira, que não cessa de descapitalizar o país, enviando ao
exterior os ganhos oligopolistas arrancados dos consumidores
nacionais.
6. Omite também que, sob
a presente estrutura industrial, dominada pelas transnacionais, os
investimentos e subsídios aos centros de pesquisa tecnológica
significam desperdício de recursos públicos, porquanto, não
havendo empresas nacionais viáveis no mercado, só ínfima fração
do resultado das pesquisas resultará em inovação tecnológica.
7. Observa Guimarães
que, embora bem recebido, o pacote foi considerado insuficiente por
sindicatos patronais e de trabalhadores. Esses reclamam: (i)
desvalorização cambial, (ii) redução dos juros e dos spreads
bancários e (iii) redução do preço de insumos fundamentais para a
atividade industrial, como a energia elétrica.
8. Segundo Guimarães, a
perda de competitividade da indústria nacional (sic) não se deve só
ao custo Brasil: enorme carga tributária; juros e spreads bancários
altos; elevados preços da energia elétrica; enormes déficits de
infra-estrutura de transporte e logística.
9. A perda estaria
associada à reduzida capacidade de inovação da grande maioria dos
segmentos produtivos da indústria nacional (sic), em contexto de
acelerado avanço tecnológico nos países competidores, tais como a
China.
10. Precisamos, porém,
ir mais fundo. Entender por que essa capacidade é reduzida. Daí,
inseri três vezes o advérbio latino "sic", após
"indústria brasileira ou nacional", porque a questão
básica, intocada nas discussões correntes, é a desnacionalização,
o fato de a produção realizada no Brasil não ser nacional, mas
subordinada às matrizes das transnacionais estrangeiras que a
controlam.
11. É ridículo falar em
inovação tecnológica com a indústria desnacionalizada e com os
seus centros das decisões sobre produção e mercados situados no
exterior.
12. Se não há inovação
tecnológica no Brasil é porque as transnacionais se apropriaram de
tecnologias no exterior, amortizaram-nas com as vendas em outros
mercados e as utilizam aqui a custo real zero, tal como acontece com
as máquinas e equipamentos importados a preços superfaturados.
13. Por que, então, tais
indústrias não são competitivas, se seus custos reais de produção
são extremamente baixos, ademais de as transnacionais receberem
colossais subsídios prodigalizados pelos governos federal, estaduais
e municipais?
14. Porque o valor
contábil das despesas das subsidiárias no Brasil é levado às
alturas, através dos preços que estas pagam às matrizes nas
importações dos bens de produção (inclusive o da tecnologia,
jamais transferida): os bens de capital e os insumos, tudo é
superfaturado, além de serviços sobrefaturados e até fictícios.
15. Em suma, as políticas
de favorecimento às transnacionais, inauguradas em 1954, e
intensificadas desde então, fazem que os brasileiros paguem para se
tornarem pobres. Os fabulosos lucros reais obtidos pelas
transnacionais são transferidos ao exterior, não apenas como tais,
mas também através desses superfaturamentos e do subfaturamento de
exportações.
16. Estando a economia
concentrada por empresas transnacionais e bancos, na maioria
desnacionalizados, e os "nacionais" associados aos
estrangeiros e com eles ideologicamente alinhados, é esse sistema
imperial que elege os "governantes" nos poderes do Estado
brasileiro, pois as eleições dependem dos dinheiros para as
campanhas e do acesso às redes de TV comerciais, vinculadas aos
mesmos interesses.
17. Em tais condições,
tornam-se inócuos os votos piedosos dos economistas, quando
recomendam reformular a infra-estrutura de transportes e logística,
baixar os juros até o patamar internacional (o que viabilizaria
reduzir a carga tributária), desvalorizar a taxa cambial etc.
18. Mantendo-se a atual
estrutura de poder, essas medidas seriam irrealizáveis, além de
que, para funcionarem, acarretariam a necessidade do controle de
capitais e da estatização dos principais bancos, ou seja, políticas
ainda menos toleráveis para os aproveitadores dessa estrutura.
19. Assim, o governo que
empreendesse tais políticas, seria desestabilizado e derrubado antes
de promover a indispensável passagem do controle da indústria para
capitais nacionais, privados e públicos.
20. Se a indústria não
for realmente nacional, jamais terá chance de ser competitiva. O
mesmo se aplica à infra-estrutura econômica (energia, transportes e
comunicações) e à social (saúde, educação e cultura). Há que
desmercadorizar os serviços públicos e eliminar as agências
"reguladoras", devolvendo o poder delas ao Estado.
21. Também importante
para o Estado recuperar funções perdidas com o modelo do "consenso
de Washington" é a total reformulação da administração
pública, generalizando-se os concursos públicos, a formação de
técnicos e administradores e instituindo-se a aferição de
desempenho, com possibilidade de demissão, seleção de quadros
desde a escola primária etc.
22. Voltando a Guimarães:
"Segundo Antônio Barros de Castro... não se trata hoje de
superar um hiato em relação a concorrentes que evoluíam lentamente
em termos tecnológicos e de produtividade. Para ele, esta premissa
não existe mais, e os concorrentes do Brasil, notadamente a China,
'ainda estão alcançando novos patamares de produtividade e
aumentando o esforço tecnológico para acelerar sua eficiência'. A
China teria superado a fase de "made in China" para outra
de "created in China".
23. Ora, como assinalei
no artigo "Tecnologia e Desenvolvimento", publicado em
maio, é incrível que até os economistas que não se restringem a
discutir política macroeconômica conclamem para a necessidade de
inovação tecnológica sem reconhecerem a impossibilidade dela num
país cujos mercados estão sob controle praticamente total de
empresas transnacionais.
24. Em artigo próximo
tentarei resumir a avassaladora ocupação da economia brasileira, a
qual prossegue em tal velocidade, que a empresa nacional é, cada vez
mais, espécie em extinção.
25. De novo, Guimarães:
"Castro acredita que o Brasil, de início, deve ganhar tempo até
induzir as grandes transformações, garantindo superávits no
balanço de pagamento por 10 ou 15 anos com petróleo e matérias
primas agrícolas, além da expansão do mercado interno 'colocando
areia para limitar a ocupação do mercado interno por
importações...'."
26. Isso seria, na
realidade, perder tempo. E o Brasil já se atrasou demasiado nos
últimos 58 anos! Proteção para a indústria, na atual estrutura,
só favorece as transnacionais e eleva os incalculáveis prejuízos
que vêm causando ao país.
27. De resto, enquanto se
dilapidam os recursos naturais através das exportações primárias,
as receitas são usadas para pagar por serviços superfaturados e
fictícios às matrizes das transnacionais, e para importar bens de
alto valor agregado e insumos grandemente superfaturados. Nem se fica
sabendo o que valem as matérias-primas exportadas, nem o balanço de
pagamentos se equilibra sem endividamento.
28. Isso implica fomentar
a estrutura econômica atrasada, como a da Venezuela, por mais de um
século, antes de Chávez: exportar quantidades fabulosas de petróleo
e ficar com a estrutura econômica mais primitiva da América do Sul,
para gáudio do império anglo-americano.
29. Com governos
acomodados às imposições do império, até por carecerem de
consciência nacional, as transnacionais estão ocupando até os
espaços recomendados por Barros de Castro e seguidores, como a
agroindústria do etanol e a química baseada na energia vegetal.
Note-se que nem falam dos óleos vegetais, como o dendê, capaz de
produzir mais óleo – melhor que o de petróleo – do que a Arábia
Saudita.
Adriano Benayon.
Consultor em finanças e em biomassa. Doutor em Economia, pela
Universidade de Hamburgo, Bacharel em Direito, pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Diplomado no Curso de Altos Estudos
do Instituto Rio Branco, Itamaraty. Diplomata de carreira, postos na
Holanda, Paraguai, Bulgária, Alemanha, Estados Unidos e México.
Delegado do Brasil em reuniões multilaterais nas áreas econômica
tecnológica. Depois, Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados
e do Senado Federal na área de economia. Professor da Universidade
de Brasília (Empresas Multinacionais; Sistema Financeiro
Internacional; Estado e Desenvolvimento no Brasil). Autor de
Globalização versus Desenvolvimento, 2ª ed. Editora Escrituras,
São Paulo.
Extraído de:
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