sábado, 3 de janeiro de 2015

O que esperar dos governos?

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Com o aprofundamento da crise capitalista no país como pano de fundo tomaram posse, no dia 1º de janeiro, os governos eleitos e reeleitos pelo país, incluindo o governo central.

Depois de prometer, mentir e esconder seus reais programas nas eleições eis que os candidatos eleitos começaram a expor e aplicar as medidas que realmente defendem: ataques aos direitos das classes trabalhadoras e populares e benesses para si e para os grandes grupos econômicos.

Se durante a campanha eleitoral Dilma acusou corretamente Marina Silva e Aécio Neves de pretenderem entregar a economia para os banqueiros e que iam tomar medidas que tiravam dos trabalhadores para dar aos mesmos, tão logo encerrou-se a eleição e ela própria nomeou uma equipe econômica de confiança do mercado financeiro, tendo colocado no Ministério da Fazenda, Joaquim Levy, homem do Bradesco, ou seja, um representante direto dos banqueiros. Cabe ainda ressaltar que Levy coordenou o programa econômico do então candidato presidencial Aécio Neves que o considera “amigo pessoal”. [1]

O Governo Dilma ainda aumentou por duas vezes as taxas de juros para beneficiar os banqueiros e especuladores e promoveu, via Medida Provisória (MP), há dois dias do final de 2014, mudanças nas regras da concessão do seguro-desemprego e do auxílio-doença, com o objetivo declarado de economizar com os trabalhadores para entregar aos banqueiros e especuladores. [2] Privatizações de hospitais universitários e aumentos de preços completaram esse cardápio nada modesto e indigesto servido nos últimos dois meses do ano findante e que, a depender do governo que já anunciou pelo menos dois anos seguidos de ajuste fiscal [3], integrará a dieta dos brasileiros no próximo período.

Com tais medidas fica completamente desmoralizado o argumento do retrocesso alardeado na campanha. Mas o estelionato eleitoral e o ajuste não marcam apenas o governo central. Em São Paulo, o governador tucano Geraldo Alckmin, escondeu da população a real gravidade da crise hídrica para se reeleger e agora anuncia, junto com o prefeito petista Fernando Haddad, aumento das tarifas do transporte coletivo (metrô, CPTM e ônibus), o que evidencia que PT e PSDB atuam conjuntamente para garantir os interesses das classes dominantes e tentar ludibriar o povo – tanto que escolheram um período de férias para anunciar o aumento pois temem protestos massivos como os de junho de 2013.

No Rio Grande do Sul, onde José Ivo Sartori (PMDB) se elegeu em cima do desgaste do Governo Tarso, cuja marca foi o calote no piso do magistério, os deputados aprovaram na Assembleia Legislativa um aumento de 33,1% nos próprios salários e ainda de 75,6% para o salário do vice-governador e secretários e 55,4% no do governador. [4] No mesmo período o vice-governador eleito, o empresário José Paulo Cairoli, se batia contra o reajuste de 16% no salário mínimo regional, cujo índice considerava elevado.

Embora “Sem discurso para exigir sacrifícios” [5], como alertou a própria colunista de Zero Hora, Rosane de Oliveira, sem ruborizar-se minimamente o senhor Sartori e a sua base de deputados, pregando o catastrofismo anunciaram “medidas duras” [6] para o povo gaúcho e pedem sua paciência e compreensão. Uma das primeiras ações do governador eleito será assinar um decreto suspendendo, por 180 dias, pagamentos com fornecedores, congelamento de concursos públicos e nomeações e até compra de materiais de expediente! [7] 20 mil trabalhadores podem perder o emprego devido à suspensão dos pagamentos a fornecedores. [8]

Como se percebe nas palavras e ações dos próprios governos não há motivos para a mínima ilusão em nenhum deles. Integrantes e beneficiários do atual modelo sócioeconômico os políticos eleitos já escolheram sacrificar o andar de baixo para tentar manter o processo de acumulação e reprodução do capital no país, uma vez que o modelo “anticrise” de consumo via crédito esgotou-se.

Se os governadores utilizam a desculpa de crises locais para pregar a inevitabilidade do ajuste contra o povo o governo Dilma usa a desculpa da retomada do crescimento da economia. Trata-se de uma curiosa mudança de discurso uma vez que antes ela se gabava de enfrentar a crise financeira de forma distinta de outros governos pelo mundo - o que uma análise criteriosa mostrava ser inverídico. [9]

Mas se antes a aparência enganava agora não mais se poderá ocultar a essência das medidas econômicas. O caminho do ajuste fiscal para sair da estagnação, vendido agora como panacéia, pode conduzir o país à recessão como ocorreu com Grécia, Espanha, Portugal, entre outros.

Se as próprias classes dominantes e os políticos a seu serviço falam em aperto, ajustes, medidas duras e impopulares, ou seja, se eles próprios anunciam um presente e futuro próximo nada promissores para o andar de baixo, nada mais resta à classe trabalhadora, às classes populares, aos estudantes e demais explorados do que a rejeição de todos esses governos e organizar-se e mobilizar-se para derrotar as suas medidas.

Não cabem vacilos com pautas distracionistas nem com frentes governistas que visam confundir e blindar o governo. Está em jogo quem vai pagar a conta da crise capitalista no país e as classes dominantes e os governos ao seu serviço já mostraram que pretendem sugar o sangue do povo e devorar a sua carcaça empalidecida se preciso for.


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[1] Aécio ironiza provável indicação de Levy. 25/11/2014.

[2] Governo aperta o cerco contra abusos na concessão de seguro-desemprego e outros benefícios. 29/12/2014.

[3] Governo focará em ajuste fiscal por dois anos antes de priorizar crescimento. 30/11/2014.

[4] Vice de Sartori é contra aumento de 16% para trabalhadores, mas pode ter salário reajustado em 75%. Rachel Duarte, 15/12/2014.

[5] Sem discurso para exigir sacrifícios. Rosane de Oliveira, 18/12/2014.

[6] José Ivo Sartori toma posse e fala em 'medidas duras' contra crise no RS. 01/01/2015.

[7] Rosane de Oliveira: governo Sartori começa com pacote de cortes. 01/01/2015.

[8] Sindicato prevê 20 mil demissões com suspensão de pagamentos a fornecedores do Estado. 02/01/2015.

[9] A crise no Brasil. Jorge Nogueira, 06/05/2012.


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