domingo, 10 de janeiro de 2021

Leite paga em dia. E agora?

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Promessa cumprida? Apenas obrigação?

 

Acho que tem que ter os pés no chão, mas também tem que tirar a bunda da cadeira”. Essa frase dita por Eduardo Leite ao então governador José Ivo Sartori (MDB) viralizou durante o segundo turno da eleição de 2018. O tucano se referia à crise do Estado do Rio Grande do Sul e ao atraso no pagamento do salário do funcionalismo, problema que prometeu resolver já no primeiro ano de sua gestão.

Um ano de governo se passou e os atrasos seguiram. O segundo ano seguia na mesma. A frase famosa passou a ser relembrada mas agora como um bumerangue que acertava em cheio o próprio tucano. Porém, nos últimos dois meses de 2020 os salários foram pagos em dia, na verdade parcialmente em dia já que o 13º foi pago como nos anos anteriores: ou como empréstimo do banco estatal local (Banrisul) ou em 12 parcelas!

Na imprensa local a informação é de que nos próximos meses o funcionalismo seguirá recebendo em dia. A conferir! Mas, e se passar a receber? Leite terá finalmente cumprido a sua promessa de campanha? Ou não estará fazendo nada mais do que cumprir com uma obrigação?

A promessa de campanha já foi quebrada uma vez que ele não pagou em dia no primeiro ano de mandato. Mas e quanto à obrigação? Aqui é preciso uma observação atenta dos fatos para obter uma resposta adequada.

Os dois ataques mais profundos do governo Leite até aqui foram as contrarreformas administrativa e previdenciária. Com elas alguns direitos do funcionalismo foram retirados e alíquotas de desconto foram elevadas ou passaram a ser cobradas (caso dos aposentados). Dessa forma a remuneração dos servidores foi reduzida.

A categoria do magistério foi uma das mais atingidas pois além das medidas que afetaram o conjunto do funcionalismo ela ainda teve perdas no plano de carreira e retirada de direitos como o difícil acesso.

Leite dizia que para pagar os servidores em dia bastava uma adequada “gestão do fluxo de caixa”. Mais uma promessa quebrada! O que se viu foi a redução da remuneração dos servidores. Mas e a obrigação? Foi cumprida?

Quando o governador assume o mandato e assina a posse se compromete com os contratos estabelecidos pelo Estado. A remuneração dos servidores é um desses contratos. É verdade que contratos podem ser modificados mas precisam da participação e da concordância das partes envolvidas para gozar de legitimidade. Se, como se viu, Leite mudou unilateralmente as regras do contrato de trabalho dos servidores reduzindo a remuneração dos mesmos ele descumpriu com essa obrigação assumida na posse.

Pode-se alegar que o governo teve o apoio dos deputados o que não invalida o fato de que a mudança foi unilateral uma vez que a outra parte integrante do contrato (os servidores) não fez parte das negociações. E aqui se revela toda a hipocrisia do discurso burguês de “respeito aos contratos” e “segurança jurídica”. A sacralidade contratual só vale para o capital.

A oposição e os sindicatos dos servidores precisam ter isso muito claro para enfrentar a poderosa máquina de propaganda que será posta em funcionamento tanto pelo governo quanto pela classe dominante que o apoia. Contrapor que “é obrigação pagar em dia” só esticará o tapete para o governo e a burguesia desfilarem as maravilhas do ajuste neoliberal. É um argumento fácil de desmanchar além de não corresponder a realidade dos fatos.

A realidade é: 1. Leite mentiu que pagaria em dia já no primeiro ano de mandato; 2. admitindo a hipótese de que não haverá mais atrasos para pagar em dia o tucano rebaixou, unilateralmente, a remuneração dos servidores de duas formas: cortando direitos e aumentando os descontos; 3. com tais medidas descumpriu com o contrato de trabalho dos servidores que assumiu na posse, logo ele não está cumprindo com a obrigação.

É muito fácil usar exemplos didáticos para explicar para a população o que está se passando:

Fulano, imagina que te devo 100 por mês e que te pago parcelado esses 100 em duas ou três vezes. De repente, eu crio uma regra da minha cabeça, sem a tua concordância, e passo a te pagar 70 em uma única vez. Estou cumprindo com a obrigação que assumi contigo?

É possível até colocar em evidência a hipocrisia da própria burguesia:

Você aí empresário/banqueiro/especulador/etc que acha certo o ajuste de Leite: aceitaria que os teus clientes criassem regras para te pagar como o governador paga os servidores?”

Some-se a isso o roubo do salário dos professores e funcionários de escola que recuperaram os dias da greve que fizeram e o roubo dos salários das direções de escola, dois episódios de perseguição política explícita. Esses fatos não podem cair no esquecimento, devem ser denunciados à exaustão.

A burguesia e o seu governo vão tentar inculcar na sociedade a ideia de que o ajuste neoliberal está funcionando e que é o caminho para o Rio Grande do Sul. Precisaremos intensificar a batalha em duas frentes: na luta social direta (greves, protestos, etc) e na luta intelectual (desmascarando as tramoias neoliberais).

A poderosa greve de 2019 do funcionalismo ganhou o apoio da maioria da sociedade e derrubou a aprovação do governo Leite. Em 2020, a parceria com as comunidades escolares evitou a abertura indiscriminada das escolas em plena pandemia. Esses dois exemplos mostram que as tarefas que temos não são simples mas são realizáveis.


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http://blogdomonjn.blogspot.com/2021/01/no-rs-voce-pode-ficar-sem-salario-se.html



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sábado, 2 de janeiro de 2021

No RS você pode ficar sem salário se discordar do governo

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No final de 2019 o governo Leite-Lemann enviou ao parlamento gaúcho uma contrarreforma administrativa e outra previdenciária que atacou os servidores, os aposentados e os serviços públicos. Com o protagonismo dos profissionais da educação o funcionalismo realizou uma das maiores greves da história do Rio Grande do Sul.

O governo tucano-rentista retaliou os grevistas com o desconto dos dias parados. Chamou a atenção o argumento central utilizado para justificar o corte do ponto: “medida pedagógica”!

A questão não era que os grevistas haviam interrompido a prestação do serviço – até houve menção a isso mas de forma secundária – mas que ousaram contrariar o governo. A pedagogia do confisco ensinava que estava aberta a temporada de perseguição política.

O sindicato do magistério entrou na justiça pois havia decisão do STF que não permitia descontar de quem não recebe em dia (caso do funcionalismo do RS) além de que os grevistas recuperaram os dias parados. Mesmo assim o Tribunal de Justiça decidiu a favor do confisco. E quem recuperou os dias de greve terminou trabalhando de graça.

No último mês do ano a “medida pedagógica” recaiu sobre as direções escolares que se organizaram com as comunidades para evitar a reabertura das escolas em meio ao aumento dos casos de Covid-19. Desde setembro Leite-Lemann queriam reabrir as escolas a qualquer custo, sem disponibilizar as condições mínimas e jogando a responsabilidade das contaminações e das mortes nas costas de pais, mães, responsáveis e dos profissionais da educação.

Os contracheques de 40 direções de escolas vieram quase zerados no mês de dezembro. Segundo o governo essas direções não realizaram os plantões para receber a entrega do álcool. Mentira deslavada!

Apesar de tal operação ter sido realizada em forma de emboscada contra os profissionais da educação – pois o governo se negava a informar a escala das entregas e por semanas escolas foram abertas diariamente apenas para esperar por algo que não chegava enquanto os casos de Covid-19 aumentavam nas escolas – eles estiveram lá.

A gestão Leite-Lemann faz do RS um laboratório que visa terminar no Palácio do Planalto e isso é admitido tanto pelo jovem tucano ambicioso quanto pelo rentista mais rico do país. Por isso a denúncia e a solidariedade de classe precisam ser fortes e em âmbito nacional e até internacional. Porém, o fortalecimento dessa luta não combina com a formação de “frentes amplas pela democracia” com os tucanos, como desejam alguns.

 

 

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