domingo, 28 de maio de 2017

Uma breve reflexão para o debate de conjuntura

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Em uma eventual saída de Temer a eleição indireta é simplesmente inaceitável e toda a esquerda concorda com isso. A alternativa para isso é que precisa ser analisada minuciosamente e debatida de forma fraterna pois seus efeitos poderão ser sentidos por um bom período.

Se é ponto pacífico entre nós que o central da conjuntura é derrotar o ajuste fiscal e as suas contra-reformas saídas por dentro do regime podem acabar potencializando aquilo que tanto temos combatido no último período.

O regime agoniza em praça pública e não é nossa tarefa tentar reanimá-lo. Nesse sentido “Diretas Já” e “Eleições Gerais” podem até parecer mais palpáveis para serem defendidas mas estão longe de resolver nossos problemas e, pior: podem acabar alimentando o monstro do ajuste que tanto combatemos - em realidade a tendência seria essa mesma.

Não há saída fácil para a crise da República burguesa brasileira e o provável é que mesmo que se imponham saídas por dentro do regime a crise continue. Mas há um sentimento na massa muito forte de rejeição das instituições do regime. Nesse sentido apresentar para ela saídas institucionais que ela própria não acredita ser a solução dos seus problemas só nos trará mais descrédito e a conjuntura tem mostrado que este tem sido o destino daqueles que jogam para a institucionalidade a rejeição popular delas - vide o caso do enfraquecimento do Podemos na Espanha.

É hora de pensar em alternativas radicais (para fora das instituições carcomidas), anticapitalistas e antissistema. Defender um programa anti-ajuste e classista. Seguir apostando na mobilização desde baixo e principalmente lutar por uma nova greve geral - este poderoso instrumento da nossa classe capaz de derrubar governos, medidas impopulares e regimes inteiros.


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sábado, 13 de maio de 2017

A esquerda e o depoimento de Lula

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No momento presente, em que os pequeno-burgueses democratas são oprimidos por toda a parte, eles pregam ao proletariado em geral a união e a conciliação, estendem-lhe a mão e aspiram à formação de um grande partido de oposição que abarque todos os matizes no partido democrático; isto é, anseiam por envolver os operários numa organização partidária onde predominem as frases sociais-democratas gerais, atrás das quais se escondem os seus interesses particulares e onde as reivindicações bem determinadas do proletariado não possam ser apresentadas por mor da querida paz. Uma tal união resultaria apenas em proveito deles e em completo desproveito do proletariado. O proletariado perderia toda a sua posição autónoma arduamente conseguida e afundar-se-ia outra vez, tornando-se apêndice da democracia burguesa oficial. Essa união tem de ser recusada, por conseguinte, da maneira mais decidida. Em vez de condescender uma vez mais em servir de claque dos democratas burgueses, os operários, principalmente a Liga, têm de trabalhar para constituir, ao lado dos democratas oficiais, uma organização do partido operário, autónoma, secreta e pública, e para fazer de cada comunidade o centro e o núcleo de agrupamentos operários, nos quais a posição e os interesses do proletariado sejam discutidos independentemente das influências burguesas.” (Mensagem da Direcção Central à Liga dos Comunistas. Karl Marx, Friedrich Engels. Março de 1850)



Em 2005, quando estourou o escândalo de corrupção do mensalão José Dirceu foi criticado duramente, ainda que de forma oportunista, por importantes dirigentes petistas. Ele era considerado o grande responsável pela política de alianças espúrias e práticas corruptas.

Delúbio Soares foi expulso, Lula veio a público pedir desculpas, embora tenha se esquivado dizendo-se traído e que não sabia de nada. Falava-se em refundação do PT e a própria militância petista dizia que o seu partido tratava os seus corruptos de forma diferente dos outros partidos.

Como atestou posteriormente a história nada mudou mas a existência de um polo de oposição à esquerda obrigava os dirigentes petistas a fingirem que faziam alguma coisa sob pena de verem uma debandada no partido, que estava perdendo militantes e apoiadores. Sim, no ano de 2005 foi a esquerda que saiu às ruas “contra a corrupção” e até pelo “Fora Lula”.

Naquela época quase ninguém na esquerda acreditava que uma liderança como Lula, com a influência que possui dentro do PT, poderia estar por fora dos acontecimentos e de que “não sabia de nada”, mesmo que o próprio delator do esquema, o então deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ), dissesse que Lula era inocente. Até porque em termos morais a esquerda inteira sabia das irregularidades praticadas pela corrente política de Lula nas eleições internas do PT para manter o aparato e o controle do partido.

Com a Lava Jato as coisas ocorreram de forma distinta. Sem nenhum constrangimento e autocrítica o PT passou a fazer discurso de vitimismo e de “perseguição política” em parte porque essa elaboração encontrou aceitação e foi reproduzida por boa parte da esquerda, incluindo uma parcela que esteve nos atos do “Fora Lula” em 2005, embora a relação de Lula com as empreiteiras hoje esteja bem mais visível do que a sua atuação no mensalão.

As relações de Lula com a burguesia é um fato que nem o petista mais fanático ousa negar. A única coisa que se discute é se os agrados e os milhões que recebeu da burguesia estavam dentro da legislação burguesa ou não. Por isso, apesar das viagens nos jatinhos das empreiteiras, das palestras realizadas, dos prêmios recebidos, alguns insistem nos pedidos de apresentação de “provas”. Com esta linha a traição de classe torna-se supérflua. O que importa se Lula se vendeu? Importa é saber se se vendeu dentro dos limites permitidos pela legislação burguesa.

É evidente que traição de classe e corrupção política não são necessariamente confluentes. Pode-se trair uma causa, ou uma classe, sem receber um único centavo. Um participante de um movimento reivindicatório que, por inocência, entregue a tática das lideranças estará traindo o movimento sem auferir nenhuma vantagem material. Por outro lado, pode-se praticar corrupção e manter a fidelidade de classe, vide os subornos pagos pela burguesia para que parlamentares de direita fisiológicos aprovem projetos e medidas em seu favor.

Ocorre que o nível de exigência de uma parcela importante da esquerda brasileira recuou de tal maneira que não há o mínimo incômodo com a “corrupção legal” praticada por Lula e o PT. Recebe-se milhões, se viaja nos jatinhos dos empreiteiros e depois se editam Medidas Provisórias que os beneficiam, lhes são concedidos financiamentos públicos a fundo perdido, se descolam contratos de obras no Brasil e no exterior, e é como se tudo não passasse de mera coincidência.

Coincidências que não cessam de se acumular, como verificável no próprio dia do depoimento: Lula chegou em Curitiba no jatinho de Walfrido Mares Guia, que ocupou os ministérios do Turismo e das Relações Institucionais durante o seu governo. Walfrido é um grande empresário da área da educação, dono do grupo Kroton, e esteve envolvido no chamado “mensalão mineiro”, esquema de corrupção montado pelo PSDB - principal concorrente do PT.

A condição de lobista de empreiteira parece tão arraigada e naturalizada que Lula chegou a questionar Sérgio Moro se o juiz não se sentia responsável pela “destruição da construção civil” o que teria gerado o desemprego de 600 milhões de pessoas – o que foi uma tremenda e constrangedora gafe já que a população brasileira é de pouco mais de 207 milhões de habitantes.

Alguns alegam que é preciso defender Lula e o PT para manter o Estado democrático de direito, que hoje seriam eles as vítimas mas que amanhã seria a esquerda e toda a classe. Esquece-se de todo o aparato repressivo e de espionagem montado e utilizado pelo PT nos anos em que governou, em algumas ocasiões em aliança com governantes demotucanos. Deixo disponível um artigo para recordar alguns fatos ocorridos durante a “democracia petista”. [*]

O argumento do Estado democrático de direito tem limites de critério. E há um método infalível e muito simples para saber se a defesa de uma causa é realmente de uma causa ou se está acobertando a defesa de determinadas figuras e/ou organizações: testar o critério no sentido contrário.

Muita gente que foi para as ruas contra o impeachment de Dilma alegava estar apenas defendendo a democracia mas tergiversava, engasgava, emudecia quando se perguntava se no lugar de Dilma fosse Aécio Neves se iria para as ruas também. Com as chamadas conduções coercitivas muitos dos que se escandalizaram quando eram os petistas, emudeceram e até debocharam quando o mesmo aconteceu com gente como Silas Malafaia. O mesmo ocorre com relação às delações, que só são colocadas em questionamento quando envolvem dirigentes e políticos do PT. Idem para as listas divulgadas e as prisões.

A seletividade nunca foi um critério de coerência. Alguns a praticam malandramente, outros são levados pela atmosfera produzida pelos malandros. É verdade que alguns poucos se dizem contra tudo isso e contra todos. Mas essa coerência esbarra no empenho, na verdade na falta dele. Nenhuma nota, texto, artigo ou simples postagem em rede social é publicada quando trata-se de não petistas.

Toda essa seletividade e empenho para defender os dirigentes petistas deve-se a caracterização de que o PT é um “mal menor” em relação ao conjunto dos partidos da ordem. É uma caracterização que alguns já não escondem possuir. E o pano de fundo que reaproximou a maior parte da esquerda da órbita petista foi a crença na “onda conservadora” e até “fascista”.

Só que essa reaproximação resulta “apenas em proveito deles e em completo desproveito do proletariado”, para utilizar as adequadas palavras de Marx e Engels destacadas no início deste artigo. Os petistas “pregam ao proletariado em geral a união e a conciliação” agora para traí-los mais uma vez logo ali adiante. Foi assim depois das eleições de 2014 quando após derrotar Aécio Neves, Dilma passou a aplicar medidas de ajustes fiscais que o tucano implementaria. Foi assim na primeira eleição depois do impeachment quando o PT aliou-se aos partidos que votaram pela saída de Dilma. Foi assim nas eleições dos dirigentes das casas parlamentares onde o PT apoiou os candidatos dos partidos que votaram pelo impeachment de Dilma (incluindo os candidatos de Temer) mesmo quando tinha candidaturas de esquerda, como do PSOL.

Em vez de condescender uma vez mais em servir de claque do PT e se desmoralizar a esquerda brasileira deve organizar-se de forma independente, priorizar a luta contra o ajuste fiscal, trabalhar para construir uma nova greve geral, defender a investigação e prisão de todos os corruptos e assim ajudar a forjar uma alternativa de classe.

É preciso retomar a linha combativa do início dos governos petistas. Uma linha que neutralizava a demagogia da direita. E isso não será alcançado se colocando na defesa de Lula e participando de caravanas como a de Curitiba. Tampouco celebrando a soltura de José Dirceu.



Leia também:
O mensalão e a amnésia do governismo

Do “Fora Lula” ao “Fica Dilma”: o que aconteceu com a esquerda brasileira?

[*] Alguns fatos para refletir sobre democracia e garantias constitucionais. 24/03/2016.



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