segunda-feira, 20 de abril de 2015

O fracasso da governabilidade

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Quando Lula se aproximou dos velhos coronéis e de setores das classes dominantes para as eleições de 2002 muitos militantes, ativistas sociais e simpatizantes honestos acreditaram que se tratava de uma tática sofisticada elaborada pela direção do PT para poder enganar as oligarquias e fazer um governo popular e dos trabalhadores.

A própria direção do partido justificava essas alianças com o discurso de que estavam construindo uma governabilidade para poder administrar o país e que dessa forma as mudanças viriam mas que seriam lentas. Diante das medidas contraditórias abraçadas alegavam que a governabilidade exigia concessões. Criticado por manter a política econômica de Fernando Henrique e anunciar como primeira medida de seu governo uma contra-reforma na previdência que atacou direitos dos trabalhadores e privatizou parte dela, Lula se defendeu bradando que “não se pode dar cavalo de pau em transatlântico”.

Como se sabe o transatlântico não mudou de rota e a cada eleição, diante da apresentação de mais antigos inimigos como novos companheiros, o discurso da governabilidade era erigido por dirigentes e intelectuais petistas. Bandeiras históricas iam sendo abandonadas e os críticos de esquerda eram estigmatizados como inconsequentes apressados que não compreendiam a dinâmica da realidade social e política brasileira.

As reformas sociais nunca fizeram a mínima menção de serem propostas ou apreciadas, cada vez mais medidas do antecessor eram tomadas (privatizações, superávit primário, etc) mas ainda assim o mais importante era ter o controle do governo para “seguir avançando nas mudanças” - leia-se: medidas compensatórias apoiadas e toleradas pelas próprias classes dominantes que não raro lucravam com elas, como o Prouni, o Pronatec e o Minha Casa Minha Vida.

Mas quem muito se abaixa mostra o que não deve e perde o respeito, diz um ditado popular. Distribuição de cargos, queima de bandeiras históricas e apropriação das bandeiras dos antigos inimigos não foram suficientes para a governabilidade. Em seu “desenvolvimento” ela terminou por transformar-se no seu contrário até a sua própria negação. É exatamente isso que estamos assistindo neste momento em que Dilma entregou o governo, com a atuação decisiva de Lula, para o PMDB e o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, representante direto dos banqueiros.

E enquanto o Governo Dilma se afunda cada vez mais em desgaste e impopularidade devido às suas próprias ações, como a implementação de um ajuste fiscal que corta inclusive dos “avanços”, o PT reclama de um conservadorismo que ele próprio alimentou e fortaleceu com a sua tática de governabilidade e apela aos trabalhadores e a esquerda que desprezou para que defendam um governo que renunciou brancamente sem acenar com nenhuma mudança de rota do transatlântico mas apenas para permanecer no cargo de forma ainda mais subalterna.

É certo que a esquerda e muitos trabalhadores não tolerariam nenhum golpe. Mas não é isso que deseja a oposição demotucana como já deixou claro o próprio Fernando Henrique Cardoso, que criticou os pedidos de impeachment. Esse tipo de alarmismo não passa de espantalho para desviar o foco do retumbante fracasso que resultou a tão propalada governabilidade e tentar evitar que os trabalhadores lutem contra as medidas impopulares do próprio Governo Dilma.

A lição histórica que a tática política do petismo deixa é a de que governar com as velhas elites é governar para elas, inclusive se utilizando de seus métodos corruptos. Não é possível enganá-las se aliando com elas. Os enganados dessa história foram outros. Que estes aprendam a lição para que nunca mais sejam ludibriados e que outras organizações de esquerda não ousem trilhar esse caminho.

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sábado, 18 de abril de 2015

De onde vem o conservadorismo?

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Publicado em 15/04/2015

Por Mauro Luis Iasi


Atrás da aparente beleza, estão os assassinos em massa, a abolição da dignidade, os campos de trabalho forçado, a rejeição de toda a noção de liberdade e fraternidade. (…) [O comunista] é aparentemente inofensivo, será o seu mais querido amigo, o mais sincero, o mais leal… até o dia em que ele o assassinará pelas costas.”

(O GORILA, folheto anticomunista distribuído no interior das Forças Armadas como preparação para o Golpe de 1964)


Há um certo espanto com as recentes manifestações de direita no Brasil, como se fossem algo fora do lugar e do tempo, resquícios de um tempo obscuro que se esperava superado. Por outro lado, espantam-se os que crêem que tal fenômeno é absolutamente novo – daí os epítetos tais como “nova direita”, “onda conservadora” e outros. Acreditamos que o conservadorismo que se apresenta na ação política de direita não é algo do passado que se apresenta anacronicamente no cenário de uma democracia, nem algo novo que brota do nada.

O conservadorismo sempre esteve por aqui, forte e persistente. O fato é que não foi enfrentado como deveria e nos cabe perguntar: por que?

CONSERVADORISMO E LUTA DE CLASSES

O conservadorismo não pode ser entendido em si mesmo, ele é expressão de algo mais profundo que o determina. Estamos convencidos que ele é uma expressão da luta de classes, isto é, que manifesta em sua aparência a dinâmica de luta entre interesses antagônicos que formam a sociabilidade burguesa. Nesta direção é importante que comecemos por delinear o cenário no qual o conservadorismo se apresenta.

O impacto da ação política de direita espanta aqueles que julgavam que as classes sociais não eram mais categorias que poderiam explicar a sociedade contemporânea. De certa forma, prevaleceu uma estratégia política que orientou de forma determinante a ação política dos trabalhadores que esperava amenizar ou contornar a luta de classes para que fosse possível um conjunto de reformas de baixa intensidade no longo prazo.

Esta estratégia, denominada de Democrática e Popular, se fundamenta na convicção que a crise da autocracia burguesa permitiria superar uma característica histórica de nossa formação social, isto é, seu caráter “prussiano”. O Brasil era uma sociedade com um Estado forte e uma sociedade civil fraca, assim o fortalecimento da “sociedade civil” geraria um cenário no qual a disputa de hegemonia favoreceria às classes trabalhadoras, diminuindo o espaço próprio da direta e favorecendo a política de esquerda.

Não foi o que ocorreu. A estratégia burguesa de transição pelo alto, controlada e segura, venceu. Não porque não se tenha fortalecido a sociedade civil burguesa e o Brasil não tenha se “ocidentalizado” nos termos gramscianos, mas justamente pelo fato do fortalecimento da sociedade civil burguesa ter acabado por criar um quadro no qual a hegemonia burguesa se consolidou, diminuindo e não ampliando o espaço para a política de esquerda.

Há aqui duas incompreensões graves no que diz respeito ao conceito de hegemonia e, por conseguinte, da compreensão do caráter do Estado. Prevaleceu uma visão mecânica que associou a autocracia ao uso da força e a democracia ao consenso. Desta forma dicotômica, ao optar pela disputa de hegemonia supostamente favorecida pelo fortalecimento da sociedade civil burguesa, retira-se da paleta de opções políticas o uso da força – seja da esquerda, abandonando a perspectiva de ruptura revolucionária, seja pela direita, com sua tradicional tendência golpista que interrompe os processos institucionais.

A maneira de contornar a luta de classes e tornar possível as reformas de longo prazo seria o pacto social. Isto é, deixar a burguesia ganhar seus lucros e criar as condições favoráveis para seus negócios enquanto, pouco a pouco, gotejam melhorias pontuais para os mais pobres. Assim a burguesia não teria razão para interromper o processo político e a disputa seria desviada para o terreno que interessaria aos trabalhadores: a disputa eleitoral e o reformismo de baixa intensidade gradualista que seria aceito pelas classes dominantes uma vez que não se trata de nenhuma mudança socialista, mas de buscar uma maior justiça social.

Neste cenário ideal a direita e suas manifestações mais gritantes se isolariam, o conservadorismo iria cedendo espaço para uma consciência social cada vez mais progressista e viveríamos felizes para sempre.

A primeira incompreensão grave é que a hegemonia de uma classe social não se define, pelo menos como Gramsci pensava a questão, pela mera disputa das consciências sociais e da legitimidade, mas tem suas raízes nas relações sociais de produção e de propriedade determinantes numa certa época histórica. A hegemonia nasce da fábrica, dizia o comunista italiano. Querer reverter a direção moral de uma sociedade mantendo as relações sociais de produção e formas de propriedade inalterada é uma tarefa impossível.

Da mesma forma é impossível separar os dois elementos constitutivos do Estado, isto é, a coerção e a busca do consenso. Dizia Gramsci:

“O exercício “normal” da hegemonia, no terreno tornado clássico do regime parlamentar, caracteriza-se pela combinação da força e do consenso, que se equilibram de modo variado, sem que a força suplante muito o consenso, mas ao contrário, tentando fazer com que a força pareça apoiada no consenso da maioria”
(Antonio Gramsci, Cadernos do Cárcere, v. III, 2007, p. 95)

Vejam que combinados os elementos do par dialético força/consentimento, o Estado burguês precisa apresentar sua dominação de classe como expressão de um interesse geral, e não de seus egoístas interesses particulares.

Esta é a função da ideologia, mas como isso é possível?

Como já diziam Marx e Engels na Ideologia alemã, as ideias dominantes em uma soctiedade são as ideias das classes dominantes, mas estas só são dominantes porque expressam no campo das ideias as relações que fazem de uma classe a classe dominante. Tal aproximação teórica é essencial à compreensão do nosso tema.

O conservadorismo não é um desvio cognitivo ou moral, não é fruto de uma educação mal feita ou de preconceitos vazios de significado. O conservadorismo é uma das expressões da consciência reificada, nos termos de Lukács, ou do chamado senso comum, nas palavras de Gramsci, isto é, é uma expresso da consciência imediata que prevalece em uma certa sociedade e que manifesta, ainda que de forma desordenada e bizarra, os valores determinantes que tem por fundamento as relações sociais determinantes.

Neste sentido, o conservadorismo não veio de lugar nenhum, sempre esteve ali nas relações que constituem o cotidiano e na consciência imediata. As características desta consciência imediata já foram delineadas por Lukács e se centram nos seguintes aspectos:

a) imediaticidade, o que significa que é uma consciência que se forma nas relações imediatas do ser social com as coisas e pessoas próximas, nos contextos presenciais e que tem por horizonte de ação o tempo presente;

b) heterogeneidade, o que implica que as diferentes esferas de ação da pessoa no trabalho, na vida afetiva, nos vínculos com o sagrado (o que inclui o futebol, além da religião), na adesão à valores morais, ganham autonomia e coexistem lado a lado sem a exigência de coerência entre os elementos que conformam um determinado modo de vida e uma correspondente concepção ideal de mundo;

c) superficialidade extensiva, ou ultrageneralização, mecanismo pelo qual a experiência imediata é estendida e universalizada de contextos particulares para generalizações carentes de mediações, o que leva ao preconceito como forma imediata do pensamento no cotidiano.

Esta consciência imediata forma uma senso comum, bizarro e ocasional, isto é, formado por elementos dispares e heterogêneos relativos aos diferentes grupos ou segmentos sociais que o indivíduo entra em contato em sua vida, na família, nos diversos grupos, no trabalho, na vida pública e outras esferas.

Ainda que todo senso comum expresse as relações sociais determinantes e portanto valores da ordem burguesa, nem todo senso comum é conservador. Faz parte do senso comum, até pela característica da imediaticidade, a reação a uma situação vivida como injusta ou intolerável, a necessidade da solidariedade entre os que vivem as mesmas situações, o que constitui um núcleo saudável do senso comum ou o bom senso. Entretanto, tais características também são cruzadas pela luta de classes, isto é, podem ser elementos basilares da constituição de uma consciência de classe dos trabalhadores ou de formação de uma ação política conservadora.

Neste ponto as duas dimensões da análise se encontram. A estratégia gradualista e o governo de pacto social que dela deriva, desarmam a consciência de classe forjada nas décadas anteriores e criam uma situação na qual a consciência dos trabalhadores reverte-se novamente em alienação, em serialidade, fortalecendo o senso comum. A consciência de classe dos trabalhadores pressupõe uma clara definição do inimigo, como dizia Marx, para que os trabalhadores se vejam como uma classe que pode representar uma alternativa universal para o sociedade, outra classe tem que se expressar como um empecilho universal, um entrave que precisa ser superado; ou como dizia Freud, só é possível manter alguns em união quando se dirige o ódio para outros.

O pacto social e a política da pequena burguesia procura diluir as diferenciações de classe, em outras coisas, com a enganosa ideia de nação. Ocorre que a consciência de classe não é uma naturalidade sociológica, de forma que cada classe tem a consciência que lhe corresponde, mas ela se forma na ação política desta classe e, em grande medida, pala forma política que assume sua vanguarda. Uma ação política classista gera um forte sentimento de pertencimento e identidade de classe, uma política diluída de cidadãos, consumidores, parceiros, e outras gera indiferenciação, permitindo que se imponha a inércia da visão de mundo própria da sociedade dos indivíduos em livre concorrência.

Desarmada a classe trabalhadora de sua consciência de classe, a luta de classes que se esperava contornar e que é impossível de evitar, se manifesta. É fácil identificar os setores de direita que operam no jogo político, mas não é tão simples entender por que meios logram a adesão de segmentos sociais diversos.

A iniciativa política e o trabalho ideológico da direita é facilitado por um mecanismo que Althusser identificava como “reconhecimento”, isto é, a ideologia só pode ser efetiva se o valor ideológico encontrar na consciência imediata algo que produza um reconhecimento e assujeite a pessoa a determinadas práticas. Neste ponto, o funcionamento da ideologia é preciso. As relações sociais interiorizadas na forma de valores que constituem uma determinada visão de mundo são apresentada à estes valores agora na forma do discurso ideológico.

Ocorre que o discurso não é uma mera reapresentação do conteúdo mais substantivo das relações sociais internalizadas, ele o conforma de uma determinada maneira e com certa intencionalidade, produzindo um efeito político extremamente útil à dominação. Certas palavras chaves, “significantes mestres” nos termos de Lacan, ordenam a serie de palavras que são veículos de valores dando consistência a uma determinada visão de mundo orientada ideologicamente.

Isto significa, em última instância, algo muito simples. A disputa de hegemonia, que implica também, mas não somente, na disputa das consciências, é uma luta de classes e não um debate sobre valores. Só se afirma uma visão de mundo, numa sociedade de classes, contra outra visão de mundo. Neste sentido a meta do consenso nos quadros do Estado burguês é ela mesma ideológica.

No inevitável acirramento da luta de classes, os governistas do pacto social ficam à deriva porque não esperavam ter que enfrentar a direita neste cenário na qual ela, ao contrario dos gradualistas, consegue dialogar com a consciência imediata das massas. E o fazem operando eficientemente os elementos do conservadorismo deixado inalterado.

CONSERVADORISMO E FASCISMO

Há um certo exagero conceitual na tentativa de identificar este conservadorismo como fascista. Mas, nos seria útil identificar nesta ideologia elementos que correspondem ao discurso conservador no intuito de compreender sob que significantes o conservadorismo abre o dialogo com a consciência imediata.

Leandro Konder em seu livro Introdução ao fascismo (São Paulo, Expressão Popular, 2009) nos dá um bom caminho nesta direção. Primeiro ressaltemos que o fascismo, tal como Togliatti e outros definiram, é uma expressão política da pequena burguesia que serve aos interesses do grande capital monopolista/financeiro e que logra uma apoio de massas nas classes trabalhadoras. Ideologicamente ele opera necessariamente apagando suas pegadas relativas ao seu pertencimento de classe, e para tanto é essencial a ideia de Nação, de onde deriva a primeira característica do pensamento conservador: ele é extremadamente nacionalista.

A esquerda sempre flertou com a ideia de nação, mas ela é uma patrimônio da direita e uma propriedade intelectual da pequena burguesia, que por ser uma classe de transição (não é trabalhadora nem burguesa) se crê acima dos interesses de classe, sendo a legitima detentora do interesse nacional. Não cabe aqui avançar na discussão se este valor pode ou não servir a propósitos de esquerda – já serviram. Sempre achei temerário e as consequências não costumam ser boas. O que nos interessa diretamente aqui nesta reflexão é que a direita, de novo, manipula com eficiência esta ideia vaga que a nação precisa ser defendida contra seus adversários e sai às ruas com as cores da CBF.

Outro aspecto importante a ser destacado na ideologia fascista, que aqui nos serve apenas de parâmetro de análise, é o pragmatismo imediatista. Derivado de um quadro de referencia imediato, de problemas ou contradições que lhe afetam de forma direta, o fascista assim como todo conservador quer uma solução. Não há história, assim como inexistem determinações fora do campo do visível. Desta forma o pensamento conservador não se preocupa se antes falava uma coisa e agora fala outra, pois não conexão entre estas dimensões, só existe o agora, o presentismo exacerbado. Dane-se o passado e não me interessa as consequências disso para o futuro, me interessa o gozo presente, o êxtase.

Tal característica remete a outras duas próprias do pensamento conservador: a preponderância das paixões e o irracionalismo. Como não existem determinações mais profundas além da aparência dos fenômenos, assim como não existe história que articule formas passadas às presentes, tudo se resume a reação instintiva e animal, as paixões. Daí que o conservador é por natureza violento e irracional.

Um fato ilustra bem isso. Um fotógrafo mineiro foi agredido na manifestação da direita porque se parecia com Lula. Vejam, um ser racional não agrediria alguém por querer participar de ato público, mas um ser irracional não se permite perguntar algo ainda mais elementar: o que estaria fazendo o ex-presidente da República disfarçado de repórter num ato da direita?

Tentar buscar algum tipo de racionalidade na direita conservadora (uma redundância, não é?) é tarefa inútil. Assim como a Globo tentando derivar dos atos uma pauta, quando se via claramente um exercício sistemático de ódio; ou ainda a presidente Dilma e seus perdidos ministros reafirmando questão abertas ao dialogo com a malta que pede sua cabeça.

Há um aspecto que deriva, tanto do nacionalismo, como do imediatismo e do irracionalismo apaixonado: o preconceito. Todo fascista e a maioria dos conservadores tem que desembocar, mais cedo ou mais tarde, em algum tipo de supremacia que justifique sua ação. Aqui ganha uma densidade visível a operação do princípio freudiano segundo o qual o que permite a solidificação da identidade grupal é a transferência do ódio para algo ou alguém fora do grupo. É preciso criar um estigma, um preconceito, para que a paixão violenta se expresse.

Não basta a oposição a um governo, um debate sobre alternativas de sociedade. Isto tudo é racional demais. É preciso colar algo mais atávico, afetivo, que mobilize paixões irracionais. Daí a funcionalidade dos estigmas, e entre eles do anticomunismo, ainda que o alvo da raiva não seja, nem de longe, algo parecido com um alternativa comunista. Desta maneira eu posso atacar, pedir o impedimento, xingar, desejar matar e acusar sem entender o porquê. Simplesmente porque é comunista (ou judeu, ou negro, ou homossexual, etc…).

Em função da grande carga afetiva mobilizada na opção conservadora, ela exige e pressupõe a repressão da sexualidade, como já analisou brilhantemente Willian Reich. Por isso o fascista e o conservador é um moralista. O moralismo e suas manifestações associadas, como a intransigente defesa da família, por exemplo, são um elemento constante no discurso conservador, mas aqui também é necessário a alteridade, um outro que ameace a ordem e a harmonia do padrão moral, daí que não nos espanta que o discurso conservador associe o nacionalismo, a irracionalidade, o moralismo com a homofobia.

Por fim, o fascismo sempre foi um crítico da democracia e do regime parlamentar e defendeu a solução autoritária. O conservadorismo é sempre elitista. A noção de supremacia, seja racial ou outra qualquer, age aqui como a convicção que o governo deve ser entregue a uma elite capaz, forte e moralmente firme, para conduzir a sociedade na direção correta. No fundo o autoritarismo é uma consequência de tudo o que foi dito, pois aquele que clama contra o desvio moral, o risco da corrupção, na verdade está clamando por controle, inclusive contra seus próprios impulsos. Todo conservador é um sádico.

O que nos salta aos olhos é que estes elementos do discurso ideológico conservador produz a função do reconhecimento com os elementos da consciência imediata reificada, com o senso comum. Por ouro lado, a consciência de classe se constitui num tortuoso processo de rompimento com o senso comum, ainda que sempre partindo dele.

A única maneira de enfrentar o discurso e a prática política da direita é revelando sua particularidade e a natureza de seus interesses de classe. No entanto esta não é uma mera operação racional, em grande medida a luta de classes exige que a transição da alienação para a consciência de classe também opere com mecanismos subjetivos, de identidade de classe, de formação de uma nova subjetividade, de transformação cultural. O fascismo só tem espaço para crescer na derrota da esquerda.

Contra esta ofensiva da direita, que era inevitável, seria necessário agora uma classe trabalhadora que constituída enquanto classe e portadora de valores e uma visão de mundo revolucionária, que visse na ameaça fascista a necessidade de sua maior unidade. Na ausência desta consciência de classe, na desarticulação da visão de mundo de esquerda que poderia ordenar o senso comum numa direção diferente, os membros das classes trabalhadoras são devolvidos à serialidade e viram presas do discurso conservador.

Enganam-se os que querem restringir o pensamento conservador a uma categoria de eleitores, ou apenas aos segmentos médios. O grande risco é que a base de massas para alternativas conservadoras (não creio que no momento possam ser identificadas como fascistas) não pode ser somente as chamadas “classes médias”, ainda que sejam estas a caixa de ressonância por natureza da proposta conservadora. O alvo é outro. São os trabalhadores. Por isso o abandono das demandas próprias de nossa classe pelo governo de pacto social é o caminho mais rápido para dotar a alternativa de direita da base social que ela precisa.


Extraído de:


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quarta-feira, 15 de abril de 2015

Causas econômicas do antipetismo da classe média


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05 Abril 2015



Golbery Lessa





Se a esquerda deseja ter clareza sobre como agir diante da ampliação das manifestações organizadas por setores reacionários da classe média, precisa procurar uma explicação científica para o fato e não embarcar na versão apresentada pelo governo federal. É mais fértil procurar entender as bases econômicas, culturais e políticas do reacionarismo do que concebê-lo como um improvável desvio moral simultâneo de milhões de indivíduos. Seria desastroso fundamentar apenas na intuição o discurso e as ações contrários às dimensões ultradireitistas das manifestações corridas no último 15 de março. Para a esquerda, é mais importante tentar compreender os fatos do que promover uma competição para saber qual dos seus analistas ridiculariza melhor o bizarro discurso das passeatas verde-amarelas e cria o mais engenhoso anátema para estigmatizar os setores médios.



É infértil fazer uma análise estanque das ideias e das posições políticas da classe média. Não é sustentável considerar que este grupo social tenha condições objetivas apenas de comportar-se e expressar-se de modo conservador. Como demonstrou Karl Marx, ainda no século XIX, é próprio dos setores médios da sociedade moderna oscilarem entre posições ideológicas e políticas de direita e de esquerda e, inclusive, misturarem essas posições antípodas. Na atual conjuntura brasileira, uma das provas desse movimento pendular é o fato de que um setor numeroso da mesma classe comporta-se de maneira progressista, defende a esquerda e repudia o discurso do tipo proferido por Jair Bolsonaro.



Nos últimos anos, o marketing do governo federal apostou na estigmatização dos setores médios com o objetivo de aproveitar o descontentamento de alguns dos seus estratos com o PT para “provar” que “a tradicional elite brasileira” seria contrária aos “avanços sociais” dos governos Lula e Dilma. Manipulou o sentido da palavra “elite” para que esta abarcasse apenas a classe média e fez desaparecer nessa bruma sociológica a grande burguesia aliada aos petistas. A família com renda de cinco salários mínimos ou mais começou a aparecer na fala governista como a adversária natural dos trabalhadores e a senadora Kátia Abreu, para surpresa do público, passou a ser mostrada como heroína da economia brasileira. Como cereja do bolo dessa sociologia pelo método confuso, possivelmente criada pelo marqueteiro João Santana, enquanto a classe média real se contraía, os governos petistas fantasiavam sobre a existência de uma “nova classe média” formada pelas famílias de trabalhadores com carteira assinada e acesso ao consumo de massa.



Para compreender as últimas manifestações de direita contrárias ao governo Dilma é preciso, igualmente, desconfiar dos motivos alegados pelos próprios setores médios envolvidos, pois um grupo social não é, necessariamente, o que afirma de si mesmo. Para parte da esquerda, é tentador imaginar que uma fatia da classe média está insatisfeita apenas devido a arraigados preconceitos contra os pobres, as minorias étnicas, a população LGBTT, o campesinato e o operariado, entre outros grupos. Entretanto, se observarmos os dados empíricos existentes, é possível perceber que a insatisfação tem outros motivos, a maioria de ordem econômica.



Comecemos pelo que tem sido esquecido pela maioria dos analistas: observemos os dados empíricos sobre a trajetória econômica e demográfica da classe média na Era PT.



Entre 2001 e 2013, na Região Metropolitana de São Paulo (RM-SP), palco da maior manifestação do dia 15 de março passado, segundo a PNAD/2013, o número absoluto de famílias de classe média (consideradas como aquelas cuja pessoa de referência da família tinha renda mensal de cinco salários mínimos ou mais) diminuiu 31,57%, enquanto o número absoluto de famílias da classe trabalhadora (consideradas como aquelas com renda mensal inferior a cinco salários mínimos) ampliou-se 57.64%. Se observarmos a variável contabilizando a renda de todas as pessoas do núcleo familiar, a situação melhora para a classe média, entretanto, a sua trajetória passa a ser de crescimento (12,00%), mas muito menor do que o da classe trabalhadora (65,48%). Mesmo nesse caso, os estratos entre 10 e 20 salários mínimos e acima de 20 salários mínimos tiveram encolhimentos absolutos de 23,00% e 38,90%.



A constatação é ainda mais surpreendente quando comparamos esses números com aqueles das mesmas variáveis e dos mesmos parâmetros imediatamente referidos entre os anos de 1991 e 2000. Nesse intervalo de tempo, segundo os censos demográficos do IBGE, o número absoluto de famílias de classe média no Estado de São Paulo (não tivemos acesso a dados da RM-SP para o período) quase dobrou (96,61%) e o de famílias da classe trabalhadora ampliou-se em apenas 19,70%. No país, os números foram, respectivamente, 185,26% e 21,00%. Primeira conclusão: a Era PT estancou o desenvolvimento demográfico da classe média e fez dois dos estratos desse grupo social encolherem.



Se corrigirmos pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Ampliado) o valor nominal da renda média mensal das famílias calculado na PNAD/2013, constataremos que, entre 2001 e 2013, todos os estratos salariais da RM-SP tiveram um ganho real de renda aproximado de 38%. Será que a melhoria da renda das famílias de trabalhadores originou-se em recursos anteriormente de posse dos setores médios? Como, ainda segundo a PNDA/2013, apenas 4,39% dos integrantes da classe média da RM-SP eram, em 2013, empregadores de trabalhadores não-domésticos (nesse número estão inclusos os membros da grande burguesia, pois IBGE não os discrimina) e 7, 07% dos assalariados eram trabalhadores domésticos, a melhoria da renda dos trabalhadores na Era PT não pode ter se originado, a não ser residualmente, de recursos provenientes da classe média.



O aumento da renda dos trabalhadores na Era PT foi determinado por uma significativa ampliação da oferta de empregos formais em um momento de relativa estabilidade monetária. Uma tendência econômica presente em dezenas de países do Sul do planeta na primeira década do século XX e condicionada pelo deslocamento de grandes massas de capital para a periferia do sistema. Configurou-se como um ganho dos trabalhadores na luta econômica contra o capital, mesmo que as grandes empresas tenham abocanhado a maior parte da riqueza derivada do aumento de produtividade e da ampliação das escalas produtivas. A classe média não perdeu nada com o avanço do consumo dos trabalhadores, a multiplicação dos empregos e a expansão (mercantilizada) de algumas políticas sociais, como o Bolsa Família e os subsídios para matrículas no sistema de ensino superior. A baixa qualidade da maioria dos cursos universitários e a precariedade da assistência estudantil, entre outras variáveis, fizeram com que expansão da presença dos trabalhadores no ensino superior não lhes tenha garantido efetiva capacidade de competição com os setores médios no mercado de trabalho, representando mais uma ganho simbólico do que uma efetiva qualificação (com exceção das trajetórias individuais particularmente exitosas e motivadas por talento excepcional).



A contração demográfica de estratos da classe média foi determinada por duas variáveis: 1) nos 13 anos considerados (2001-20013), o aumento de 38% na renda real mensal não foi suficiente para cobrir o crescimento das necessidades de consumo impostas pela dinâmica da sociedade a esta classe; e 2) a reestruturação produtiva das empresas privadas e órgãos públicos, no início do século XX, baseada na diminuição dos níveis de chefia e no avanço tecnológico dissolvedor de funções especializadas, diminuiu muito os postos de trabalho para os setores médios. Esses fatores atingiram de modo distinto os trabalhadores, pois suas necessidades ainda eram as básicas e os postos de trabalho que podiam ocupar multiplicaram-se.



A sociedade capitalista é estruturada de tal modo que o nível de consumo imposto socialmente aos indivíduos desenvolve-se numa espiral crescente e avassaladora. O telefone celular e o computador pessoal, por exemplo, inicialmente apenas curiosidades tecnológicas, tornaram-se instrumentos profissionais e sociais incontornáveis. A primeira década do século XXI no Brasil foi marcada por um notável acréscimo de novas necessidades sociais para as famílias de classe média, sendo suficiente elencar o crescimento da adesão aos planos de saúde, a inflação das mensalidades escolares, a ampliação dos gastos com equipamentos eletrônicos e o boom do acesso à banda larga. Diante dessa tendência intrínseca ao capitalismo, apenas o aumento correspondente da renda e das oportunidades de trabalho seria capaz de evitar disfuncionalidades e insatisfação social. O choque entre o aumento das necessidades de consumo impostas socialmente e a renda foi, no período considerado, respondido pelas famílias com a renúncia ao consumo e o endividamento, uma combinação politicamente explosiva.



Também nos governos petistas, a classe média tem perdido renda para o grande capital, principalmente por meio de preços de monopólio cobrados por faculdades privadas, bancos, planos de saúde, montadoras de automóvel e outros setores. Parte deste grupo social imputará essas perdas a qualquer governo dominado pelas grandes empresas e tenderá a usar a retórica antigovernista à mão para explicitar sua crítica e propor um governo diferente, via eleição ou impeachment. Se o governo for do PSDB ou outro partido de direita, usará a retórica da esquerda, como o fez na crítica aos governos FHC e Collor. Caso o governo seja petista e a esquerda alternativa ainda não tenha adquirido visibilidade e significativo peso político, usará a retórica da direita e mesmo da extrema direita. Vejamos uma prova empírica desse movimento pendular: poucos dias antes do segundo turno da eleição presidencial de 2002, pesquisa do Instituto Datafolha mostrava que 60% da classe média paulistana, replicando tendência nacional, votaria em Lula. Na véspera do segundo turno da eleição de 2006, o mesmo Datafolha divulgava que cerca de 50% dos setores médios paulistanos votariam no candidato do PT. O antipetismo não é e nunca foi intrínseco à classe média brasileira.



O setor da classe média que se expressa, na atual conjuntura, por meio de ideias reacionárias o faz, entre outros motivos, porque percebe os governos petistas como dominados pelo grande capital, o adversário econômico por excelência da pequena burguesia. A fala contra a corrupção colocada no centro do discurso desses estratos médios é, além de uma simplificação exagerada do complexo tema das políticas públicas, uma crítica a governantes, de fato, capturados pelo empresariado. A atitude dos governos petistas de defender os monopólios e abandonar a classe média levou o discurso de setores desse grupo social a expressar-se numa retórica contra o PT, seu passado proletário, as políticas sociais e a esquerda em geral. É a fala de um anticapitalismo de direita (defende o mercado, mas é contra a acumulação, deseja o individualismo, mas é contra a igualdade de oportunidades, etc), que, por também não confiar na oposição, apela cada vez mais para entidades abstratas, com a pátria, em busca de forças políticas descompromissadas com o governo de plantão e o grande capital. É uma situação típica na qual a classe média pode se tornar presa das ideias fascistas. Algo particularmente perigoso num momento em que os movimentos sociais e os sindicatos estão neutralizados pelo direitismo do governo, pois os aludidos estratos dos setores médios tornam-se uma vanguarda reacionária que pode imantar o resto da população. A esquerda precisa, urgentemente, entender os motivos econômicos desta classe social e lhe apresentar um programa alternativo.



Extraído de:


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domingo, 5 de abril de 2015

Uma Frente Governista!

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Qualquer manifesto que busque a "reaglutinação de forças" para uma determinada causa ou objetivo, mesmo que dentro de um mesmo espectro ideológico, deve levar em conta a diversidade do referido campo e não impor como condição apoio a governos ou organizações políticas. Ao fazer essa exigência pede-se não um apoio de princípios mas uma adesão ao governo. Isso não é um manifesto mas uma ficha de filiação. (Um manifesto em defesa do governo. Jorge Nogueira, 18/11/2012 [1] )


Redigi as linhas acima quando, em 2012, um grupo composto por dirigentes sociais ligados ao governo petista, intelectuais, e membros/ex-membros do próprio governo petista assim como até do Governo FHC divulgaram um manifesto intitulado “A crise mundial, a defesa do Brasil e da paz” com o objetivo de buscar a “reaglutinação de forças no Brasil para enfrentar crise mundial”.

O manifesto, que sequer analisava a crise financeira e que apresentava propostas inaceitáveis do ponto de vista popular, não escondia que um dos seus principais objetivos era a defesa e a blindagem do governo petista para que este pudesse impor, de forma mais sossegada, o ajuste contra o andar de baixo.

Aquelas linhas seguem mais atuais do que nunca e se encaixam perfeitamente na mais nova manobra dos governistas na defesa do seu governo: o que eles têm chamado de “Frente de Esquerda” - termo que só confunde, enlameia e atrapalha a luta e a reorganização da esquerda no país - é na verdade uma “Frente Governista”. [2]

Isso ficou evidente na intervenção do presidente da CUT, Vagner Freitas, que apelou à defesa do projeto político de Dilma e Lula, em uma plenária realizada na quadra do Sindicato dos Bancários, em São Paulo, no último dia 31 de março, evento que contou com a presença do próprio Lula. [3]

Tal promessa de fidelidade ao governo federal se deu poucos dias após Dilma defender o ajuste fiscal, o agronegócio e criticar as tímidas objeções de João Pedro Stédile dentro de um assentamento do próprio MST. [4] E de dar como resposta ao ato governista do dia 13 de março a irreversibilidade do ajuste contra os trabalhadores e a privatização de distribuidoras, termelétricas e postos de gasolina da Petrobras – sendo que o Bradesco BBI ficou encarregado de dirigir a venda de ativos da Petrobras Distribuidora. [5]

Diante das respostas do governo qualquer dirigente social minimamente comprometido de forma sincera com a pauta da classe trabalhadora não teria dúvidas de retirar qualquer apoio ao mesmo. Mas não foi a atitude da direção da CUT, da UNE e do MST, o que evidencia que os direitos dos trabalhadores não passam de cortina de fumaça para disfarçar o seu apoio ao governo e de uma falsa satisfação para as suas bases.

Para aumentar a cortina de fumaça, justificar o seu apoio ao projeto político dos governos petistas e tentar arrastar a esquerda para a sua “Frente Governista” é erigido o espantalho do golpe da direita – chegando alguns ao ponto de dizer que há uma conspiração desde Washington contra o governo petista devido ao pré-sal, como se este já não estivesse sendo entregue como nos atesta o leilão do Campo de Libra realizado em 2013 em uma operação repleta de irregularidades, repressão desmedida e valores irrisórios. [6]

Esse argumento não é novo e uma análise criteriosa dos fatos não deixa dúvidas de que se trata de um tremendo espantalho.

Em 2005, diante do escândalo do mensalão, não foram poucos os dirigentes governistas que alardearam que estava em curso um “golpe das elites” contra o então Governo Lula. Com essa justificativa dirigentes da CUT, da UNE e do MST organizaram atos em defesa do governo. Não tardou para que desde Washington o então presidente George Bush enviasse o seu secretário, John Snow, para prestar solidariedade a Lula, sendo que depois o próprio Bush veio pessoalmente fazer o mesmo.

Posteriormente os inúmeros prêmios distribuídos à Lula em vários países e eventos organizados pelos ricos – como o de “Estadista Global” conferido pelo Fórum Econômico Mundial em 2010 – mostraram o quanto as elites odeiam os governos do PT. [7] Um governo que serve de inspiração para políticos como o venezuelano Henrique Capriles [8] e o golpista paraguaio Federico Franco. [9]

O espantalho do “golpe das elites” foi levantado também durante o julgamento do mensalão. José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoíno seriam vítimas de perseguição, embora o próprio PT já os tivesse considerado responsáveis por irregularidades nos anos de 2005 e 2006. [10] Curiosamente o mesmo tratamento era dispensado aos políticos de outros partidos envolvidos, como o PP e o PTB, e ao publicitário Marcos Valério – que continua preso, ao passo que os perseguidos petistas encontram-se soltos.

Sobre a atual polarização social que se aprofunda no país muitos autores já elucidaram detalhadamente a inexistência de tentativa de golpe contra Dilma. Destaco aqui a análise do professor Mauro Iasi. [11]

No último dia 30 de março, o presidente estadunidense, Barack Obama, demonstrou mais uma vez o ódio das elites contra os petistas ao defender o nome de Lula para o posto de Secretário-Geral da ONU. [12]

Trata-se de uma tática para afastar Lula da eleição de 2018, poderá dizer o governista incorrigível. Mas se os fatos anteriores já desmontavam esse argumento o que dizer quando, em 2009, após Serra procurar a embaixada estadunidense para tentar se mostrar mais entreguista que o PT, a diplomacia de Washington rejeitar o tucano e demonstrar preferência pelos petistas? [13]

É oportuno destacar que a perda de controle dos movimentos sociais por parte do PT, a crescente impopularidade da presidente e o aprofundamento da polarização social no país deixem um setor da burguesia em dúvida quanto a capacidade de o Governo Dilma implementar o ajuste fiscal e nisso se desloquem para outras alternativas políticas, como se viu na eleição de 2014.

Mas, assim como no processo eleitoral, na atual conjuntura o grosso da burguesia ainda se sente contemplada pelo governo petista, assim como Washington. Não há, portanto, a mínima disposição de ruptura institucional. Bem pelo contrário, em um acordo costurado por cima, os nomes de Dilma Rousseff e Aécio Neves foram poupados de investigação no escândalo da Petrobras. [14]

Há 12 anos no governo central o projeto político petista consiste em manter o processo de acumulação e reprodução do capital no país e distribuir as migalhas que sobram do banquete dos ricos para as classes populares. Mas com o esgotamento das medidas “anticrise” adotadas a partir de 2008 a única forma de manter esse processo de acumulação e reprodução do capital, do ponto de vista das classes dominantes que o PT hoje representa, é recolhendo inclusive as migalhas.

Muitos dirigentes sociais governistas ganham com esse projeto político e não é de se admirar que clamem pela sua defesa. Convertidos em empresários, consultores e gestores de fundos de pensão ganham com as privatizações, com cortes de direitos dos trabalhadores e até mesmo com a especulação. Sua adesão e grau de comprometimento com o atual sistema sócioeconômico é tamanho que não lutam de forma consequente mais nem contra os concorrentes políticos do PT e nem contra os patrões privados, como temos visto nas demissões nas montadoras.

Em um contexto de ajustes em favor do capital torna-se impossível conciliar a defesa dos direitos dos trabalhadores e das classes populares com o projeto político aplicado pelos governos petistas, como tentam fazer crer as direções sociais governistas. As próprias ações anunciadas pelo governo demonstram isso. Ao não romper com o governo e chamar pela defesa do seu projeto tais direções nada mais fazem do que fortalecer os ataques contra o andar de baixo. Entrar em uma Frente dessas significa aderir ao governo.

A esquerda brasileira e os lutadores sociais honestos não podem vacilar nem se deixar enganar. Rejeitar de forma contundente a “Frente Governista” e organizar uma autêntica “Frente de Esquerda” que levante bem alto as bandeiras da classe trabalhadora, da soberania nacional e se oponha de forma firme e decidida aos ajustes de todos os governos e empresários.

Uma Frente que não se acanhe de enfrentar o Governo Dilma até as últimas consequências, até porque se a esquerda não o fizer será a direita que capitalizará o crescente e justo descontentamento popular. Não há mais espaço para a lenga lenga do mal menor, tampouco para conselhos pela esquerda para corrigir os rumos do governo. Como já escrevi em outra oportunidade quando analisava a postura da esquerda diante dos governos petistas: “Saber se posicionar desde já é fundamental. Até porque na luta de classes a História atesta que o preço pago pelos vacilos políticos é alto e as suas consequências trágicas.” [15]


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[1] Um manifesto em defesa do governo. 18/11/2012.

[2] Frente de Esquerda pressionará governo e Congresso contra retrocessos nos direitos trabalhistas. 01/04/2015.

[3] CUT cobra ‘inversão’ na política econômica e MST reage a ‘golpe’. 01/04/2015.

[4] Ajuste fiscal é feito para garantir a continuidade no consumo e no crescimento, diz Dilma. Coletiva de imprensa concedida em 20/03/2015, em Eldorado do Sul/RS.

[5] O Governo Federal frente os protestos do dia 13 e 15! Jones Manoel. 17/03/2015.

[6] Leilão de Libra: entreguismo, mentiras, repressão e contradições. 29/10/2013.

[7] A política externa de Lula foi progressista? 02/11/2010.

[8] Governo do PT inspira direitista venezuelano. 14/04/2012.

[9] Lula é referência para golpista paraguaio. 24/06/2012.

[10] O mensalão e a amnésia do governismo. 23/12/2013.

[11] A adaga dos covardes, ou, O limite da imbecilidade direitista. Mauro Iasi. 17/03/2015.

[12] Obama pede Lula como Secretário Geral da ONU. 30/03/2015.

[13] Wikileaks: Serra disputou bajulação do imperialismo com Lula. 10/03/2011.

[14] Dilma e Aécio ficam fora dos pedidos de investigação. 06/03/2015.

[15] Por uma luta consequente! 02/12/2012.




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sexta-feira, 3 de abril de 2015

“Um espectro ronda a Europa”: Disparam as vendas de “Manifesto Comunista” no Reino Unido

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Revista Fórum - março 5, 2015


Em edição comemorativa de aniversário, a editora Penguin republicou clássicos e o livro de Marx e Engels, até agora, é o mais vendido 

Por Redação* 

Estaria, como escreveu Marx em 1848, um espectro rondando a Europa novamente? Se não está, ao menos milhares de leitores do Reino Unido estão entrando em contato, neste momento, com essa e outras ideias contidas no “Manifesto Comunista”. A obra do século XIX foi republicada recentemente pela Penguin e se tornou, em pouco mais de uma semana, o livro mais vendido da editora. 

A 80 pence (cerca de R$3,60), a obra integra uma coleção comemorativa da Penguin, que lançou na semana passada reedições de clássicos da literatura para marcar os 80 anos da editora. Entre obras de Jane Austen, Edgar Allan Poe, Emily Brontë e Nietzsche, ao todo 70,5 mil exemplares já foram vendidos. “Manifesto Comunista”, de Karl Marx e Friedrich Engels, lidera a lista, com 1.500 cópias adquiridas em apenas uma semana. 

Por conta do sucesso da edição, a Penguin anunciou que já prepara uma reimpressão de 100 mil cópias, mesmo com uma tiragem inicial de 1 milhão. “Eu acredito que todo mundo ama a ideia de um clássico redescoberto – a ideia de que a escrita perdura tão fortemente que não pode ser ignorada mesmo 100 anos depois. Parece uma garantia de que não será um desperdício de tempo”, afirmou ao The Guardian Joseph Knobbs, vendedor da livraria britânica Waterstones, uma das que mais vendeu a obra.

*Com informações do The Guardian 


Extraído de:
http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/03/um-espectro-ronda-europa-disparam-vendas-de-manifesto-comunista-reino-unido/


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