domingo, 8 de novembro de 2015

"Jogo da direita" e "linha auxiliar": duas faces do mesmo discurso

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Babá, membro da Corrente Socialista dos Trabalhadores (CST) e vereador pelo PSOL-RJ
 

04/11/2015


Vou começar tratando o tema da impopularidade recorde do governo do PT e de algumas figuras tais como Bolsonaro, Danilo Gentili, Rachel Sheherazade, Silas Malafaia, Marcos Feliciano, Alexandre Frota, Wanderlei Silva e outras figuras deploráveis que tentam ganhar audiência em cima disso.

É fato que o povo brasileiro não aguenta mais o governo do PT. Contudo, a indignação popular nada tem a ver com o que propagam estas "personalidades". A população está insatisfeita com o governo porque os salários estão defasados diante da inflação; estão mais caros os alimentos, as contas de luz e as tarifas de transporte; as verbas da saúde e educação sofrem cortes brutais; direitos trabalhistas históricos foram retirados e restringidos; as empreiteiras faturam com a corrupção e os bancos faturam ainda mais com ajuste fiscal.

O desgaste do governo da Dilma não tem qualquer relação com implantação do comunismo, da revolução bolivariana, com haitianos vivendo no país, com Cuba ou Bolívia. Isso tudo é bobagem desqualificada de quinta categoria para tentar ludibriar a população, como tentam fazer crer estas "celebridades" efêmeras, algumas delas decadentes tentando reaparecer a todo custo.

O governo da Dilma tem um ministro da Economia ultra-liberal, agente direto do sistema financeiro, uma ministra da Agricultura representante do agronegócio (não gente, não é um sem-terra que é ministro), velhos corruptos e filhotes da ditadura, como Maluf e Collor, na base aliada.

As pesquisas mostram que a impopularidade do governo é bastante uniforme, independente de faixa de renda, idade, região e escolaridade. Ou seja, a insatisfação com o governo não é algo restrito a setores ditos abastados, como sugerem os petistas. As mesmas pesquisas mostram que as pessoas de baixa renda, mais jovens e da classe trabalhadora não se identificam com as manifestações pelo impeachment convocadas pela velha direita. E certamente, não é porque elas gostem do governo. Simplesmente, essas pessoas não veem suas pautas representadas nessas manifestações e desconfiam das alternativas de poder propostas nestes atos.

Não por acaso, as pesquisas também mostram que milhões de pessoas não votariam em Lula para presidente, assim como não votariam em Aécio, Marina e José Serra, por exemplo. Os que defendem a volta do regime militar (a tal da intervenção militar constitucional, prevista em lugar nenhum), promovem atos que reúnem meia dúzia de gatos pingados, em geral lunáticos raivosos, histéricos e desinformados que compartilham diariamente toneladas de informações falsas sem qualquer credibilidade. As pesquisas dizem que mesmo nas manifestações convocadas pela direita por impeachment, a esmagadora maioria não defende retorno ao regime militar e quer serviços públicos, gratuitos e de qualidade (nada de "Estado Mínimo", antes que os liberais se animem).

Essa gente, que fala em volta dos militares ao poder, faz o jogo do governo inclusive. Eles facilitam a vida para o governismo se dizer perseguido pelas "elites", falar em ameaça de "golpe" e tentar posar de esquerda, mesmo governando com medidas reacionárias, umas após outras, e não havendo qualquer setor importante das elites tentando derrubar o governo. A política econômica ultra-conservadora de Dilma e Levy tem apoio da Globo, da FIESP, da FIRJAN, do sistema financeiro e do agronegócio, com todos estes agentes já havendo se manifestado pela governabilidade.

Trata-se aqui de um caso de "inimigos" que se ajudam, que complementam o falso discurso um do outro. Os caricatos representantes do extremo conservadorismo, ao levantar, por exemplo, a bandeira da "intervenção militar" e outras consignas ultra-reacionárias, ajudam o governismo a propagar o medo de uma suposta "onda conservadora" e da instalação de um regime ditatorial fascista de direita. Por outro lado, o apoio ao governo das velhas burocracias da UNE, da CUT e de outros movimentos sociais, adotando de forma oportunista esse discurso do medo, da defesa da democracia e da legalidade (burguesas e que não estão sob qualquer ameaça real), cria o ambiente simbólico (o chamado "verniz de esquerda") para os reacionários propagarem que se trata de um governo "comunista", com velhos chavões do tipo "vai pra Cuba".

Por um lado, os governistas acusam qualquer pessoa que lhes critique de "fazer o jogo da direita". Por outro, a velha direita diz que quem não marcha com eles é "linha auxiliar" do PT. Basicamente, "jogo da direita" e "linha auxiliar" são dois mantras repetidos a exaustão para impedir que surja qualquer outra alternativa aos mesmos de sempre, ainda mais com tanta rejeição a todos os tradicionais atores da política brasileira.

Pois bem, existem inúmeros motivos para a Dilma cair. Há insatisfação popular generalizada e as medidas do governo são um estelionato eleitoral. Dilma aplica tudo aquilo que acusava Aécio e Marina de pretenderem fazer. Dilma dizia que Marina governaria para os banqueiros, que agora somam lucros recordes, em plena recessão. E acusava que Aécio iria privatizar e o governo petista anuncia pacotes e mais pacotes de privatizações.

Os motivos reais para a queda de Dilma não são pauta de qualquer destas manifestações pelo impeachment, seja nas ruas, seja nas redes sociais. É irônico ver estes setores reacionários manifestarem indignação, plausível, com a corrupção do governo petista, mas defenderem com unhas e dentes o corrupto Eduardo Cunha, por óbvia afinidade ideológica e na ilusão de que ele encaminhará o impeachment de Dilma. Na (in)coerência deles, para derrubar um governo corrupto vale se aliar a um corrupto que ganhou dinheiro nos mesmos esquemas de corrupção do governo que eles querem derrubar. Vai entender.

Há razões para Dilma cair, mas isso não tem serventia se em seu lugar retomarem o poder os tucanos e o PMDB, que quando governam praticam a mesma política econômica conservadora e a mesma corrupção (inclusive com as mesmas empreiteiras e os mesmos sistemas de compra de votos). Mais ridícula e anacrônica ainda é a ideia de volta da ditadura militar, mas essa não tem qualquer sustentação na realidade, a não ser na mente de lunáticos (e também de governistas que tentam se aproveitar da surreal situação para fingir que estão sob iminente ameaça do fascismo).

Qualquer saída para a crise está em mobilizar a classe trabalhadora, a juventude e o povo pobre contra o governo, para defender as demandas reais da população. Longe tanto do governismo, que tenta se apropriar da simbologia de esquerda para defender um governo de direita, quanto do velho conservadorismo, que tenta usurpar a insatisfação popular em prol de suas pautas mesquinhas, reacionárias e preconceituosas, incapazes de produzir qualquer melhoria na vida do povo (ao contrário, só servem ao retrocesso). A saída é pela esquerda, com a construção nas ruas, nas lutas e nas greves, de uma alternativa dos trabalhadores para governar o país.


Extraído do Facebook do referido vereador:
https://www.facebook.com/babapsol/posts/867020910034349

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domingo, 1 de novembro de 2015

Para quem o governismo apontará o dedo agora?

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O aprofundamento da crise econômica e política no país levou o PT a reunir o seu Diretório Nacional na última quinta-feira (29/10) para definir a atuação do partido que tem o poder central diante da conjuntura.

Evidentemente que a sua principal figura pública não poderia ficar de fora e o discurso de Lula foi revelador (para alguns), deu a linha para os petistas e aliados e como a dinâmica da crise acaba por expor as contradições tal linha acabou por aniquilar a principal argumentação distracionista dos governistas: a responsabilização de Eduardo Cunha e Joaquim Levy.

A seguir trechos importantes do discuro de Lula. Os grifos são meus.


Dilma mentiu na campanha eleitoral

“Nós tivemos um grande problema político, sobretudo com a nossa base, quando nós tomamos a atitude de fazer o ajuste, que era necessário fazer e estávamos discutindo com os trabalhadores quando foram anunciadas as mudanças dia 29 de dezembro, deixando muita gente nervosa e irritada.. Nós ganhamos as eleições com um discurso e, depois das eleições, nós tivemos que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer. Esse é um fato, esse é um fato conhecido de 204 milhões de habitantes e é um fato conhecido da nossa querida presidenta Dilma Rousseff” [1]

As crises econômicas do modo de produção capitalista sempre foram superadas aumentando o sofrimento e as privações das classes populares e trabalhadoras. Atualmente o ajuste fiscal é a fórmula utilizada pelas classes dominantes para tentar superar mais esta crise que, diferente das outras, é uma crise estrutural e não apenas cíclica.

O ajuste fiscal tem devastado a vida da base da pirâmide onde tem sido aplicado e era criticado há poucos anos atrás por Lula e Dilma, que gabavam-se de enfrentar a crise de forma diferente (o que nem era verdade).

O que teria mudado então? Em primeiro lugar, as crises capitalistas não resultam de uma má gestão do sistema mas do seu próprio funcionamento. Em segundo lugar, como o PT se limitou a administrar o modo de produção capitalista e, a fórmula anterior do consumo via crédito esgotou-se (como reconheceu a própria Dilma), restou aplicar o ajuste fiscal para manter o sistema funcionando. O ajuste fiscal só é “necessário” porque o PT se propôs a gerir o sistema em sua crise estrutural e não porque não exista outra alternativa.


A direita e os conservadores estão no governo

“Então, o ideal seria que a gente disputasse uma eleição e fizesse maioria, senão, o segundo ponto ideal seria ganhar as eleições só com os partidos de esquerda, só com os companheiros que pensam igual a gente. Mas não é possível também. Então, nós temos que ganhar as eleições com quem participa da coalizão conosco. E nós construímos uma coalizão muito ampla. É uma coalizão que tem vários partidos políticos, que o espectro ideológico escrito por qualquer cientista político seria considerado partido conservador ou partido de direita, mas se comportaram porque assumiram compromissos programáticos conosco e nos apoiaram e é com essa gente que nós temos que governar. São com esses companheiros que têm que participar do governo, para a gente construir não apenas a nossa governança, mas para a gente construir a maioria dentro do Congresso Nacional.” [ibidem]

Faltou informar que os partidos de esquerda não têm como compor com um governo que abraçou o programa das classes dominantes e os seus métodos políticos e corruptos. A primeira contra-reforma do governo Lula foi a privatização de parte da previdência pública, em 2003. Na ocasião os que cobraram um programa de esquerda e coerência do governo e do partido terminaram sendo expulsos.


O ajuste fiscal é anterior à nomeação de Joaquim Levy

“Não podemos jogar em cima do Levy os efeitos da crise, temos que jogar em cima de nós mesmos. Tem companheiro que fala ‘Fora Levy’ com a mesma facilidade com que falávamos ‘Fora FMI’. Não é a mesma coisa. O programa de ajuste estava feito antes de Levy chegar ao governo

A própria Dilma já havia deixado claro que o ajuste fiscal era do governo petista e não apenas do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Mas como Lula tem mais autoridade política a sua fala derruba definitivamente um dos pilares do distracionismo governista.


Fica Cunha!

“Nós não podemos ficar mais seis meses esperando discutir CPMF. Nós temos que começar a votar amanhã, se fosse o caso, porque tudo o que interessa à oposição é que a gente arrume 500 pretextos para discutir qualquer assunto e depois a gente não discutir o que interessa de verdade que é aprovar as coisas que a Dilma mandou para o Congresso Nacional. Primeiro vamos tentar derrubar o Eduardo Cunha, depois derrubar o impeachment e depois, se as coisas darem certo, a gente vota as coisas que a Dilma quer. Acho que é importante a gente medir, porque o tempo do governo é um tempo que urge. Vocês sabem que nossa situação é uma situação que precisamos urgentemente começar a recuperar o potencial que a presidenta já teve, ou será que vocês não acompanham pesquisa de opinião pública?” [ibidem]

O que inicialmente foi desdenhado pelos governistas como fofoca da grande mídia terminou por se confirmar: o PT está empenhado na defesa de Eduardo Cunha e costura um acordão junto com o PSDB para livrar o presidente da Câmara dos Deputados de qualquer tentativa de cassação após a descoberta de contas na Suíça e outras atitudes suspeitas.

A prioridade no ajuste fiscal e não em “derrubar Eduardo Cunha” pode ter parecido, em um primeiro momento, uma forma oculta de defesa do deputado que foi confirmada em um segundo momento quando o Diretório Nacional do PT aprovou por não representar contra Cunha no Conselho de Ética. Ruía, assim, outro pilar do distracionismo governista.


Velhinha de Taubaté? Chupa Cabra? ET de Varginha? Quem será o novo culpado?

Se em anos anteriores os governistas defendiam os governos petistas por seus “programas sociais” (sic) sem deixar de apelar para o medo do fantasmagórico “golpe das elites”, desde o ano passado este último tem sido inflado com o adendo da “onda conservadora”. Esta estaria comprovada pela composição do Congresso Nacional cujo presidente, deputado Eduardo Cunha, seria a expressão máxima do reacionarismo dominante.

Não é o ponto aqui fazer a análise histórica e social das instituições políticas da democracia burguesa e do Congresso brasileiro, tampouco dissertar sobre os limites da chamada tática da governabilidade. Quem quiser ler as minhas considerações a respeito desses dois assuntos clique aqui [2] e aqui [3]. A questão é como se comportarão os governistas agora que suas manobras distracionistas foram derrubadas pelo próprio Lula?

A Resolução Política sobre Conjuntura [4] do Diretório Nacional do PT emitida no dia 29 chega a falar das “forças mais reacionárias”, de “conservadorismo” e de “expedientes golpistas”. É um discurso que perde fôlego uma vez que o partido e o seu governo estão empenhados em manter Eduardo Cunha.

Os próprios governistas nos movimentos sociais já estão modificando a sua linha e abandonando o “Fora Cunha”. A presidente da UNE, Carina Vitral, declarou: “Fazemos oposição política ao Cunha mas não vamos entrar nessa de ‘fora’ porque senão é fora muita gente. Não queremos causar instabilidade política no país”. Já na UEE-SP, a UJS/PCdoB votou contra uma resolução política pelo “Fora Cunha” com o argumento de “defesa da legalidade e da democracia”. [5]

Se o ajuste é “necessário”, se Cunha e o Congresso conservador não devem ser importunados de quem se queixarão agora os governistas? Quem irão culpar? A Velhinha de Taubaté? O Chupa Cabra? O ET de Varginha?

Não se sabe ainda qual será a próxima distração governista para tentar desviar o foco e blindar o governo Dilma mas uma coisa é certa: o seu empenho será mantido e o próprio Lula não deixou de agradecer os pelegos pelo seu esforço:

“É importante o PT não esquecer que a base de sustentação do nosso partido nesse momento difícil está na lealdade, no compromisso e no comportamento do movimento social. Vários movimentos. (…) E o movimento tem defendido o governo na rua, defendendo o governo no trabalho e isso tem sido uma base extraordinária de sustentação que dá oxigênio e motivação para a nossa presidenta.
(...)
Fico imaginando que se o movimento social estivesse carrancudo e falando mal do governo como é que a gente estaria nisso.” [idem 1]

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[1] Lula na reunião do diretório nacional do PT — assista na íntegra

[2] Congresso conservador e reforma política. 16/11/2014.

[3] O fracasso da governabilidade. 20/04/2015.

[4] Resolução Política sobre Conjuntura. Reunião do Diretório Nacional do PT. Brasília, 29 de outubro de 2015.

Conheça as novas resoluções do Diretório Nacional do PT. 29/10/2015.

[5] Acordão para salvar corrupto, machista e LGBTfóbico? Tô #FORACunha



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domingo, 18 de outubro de 2015

Mises previu o colapso da União Soviética?

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É comum ler e ouvir de anticomunistas que o economista liberal, Ludwig von Mises (1881-1973), previu o colapso da União Soviética. Como aporte é citada a obra O Cálculo Econômico sob o Socialismo [1], escrita em 1920 pelo autor austríaco, na qual ele defende que o socialismo é inviável por não comportar um “cálculo econômico racional” devido à ausência de um livre mercado que possa estabelecer um sistema de preços.

No entanto, em 1958, Mises foi convidado para uma série de conferências na Argentina, às quais se tranformaram em um famoso livro, chamado As Seis Lições [2]. Na oportunidade o economista austríaco discorreu sobre o socialismo e a questão do cálculo econômico e afirmou o seguinte sobre a então União Soviética:


Provavelmente me perguntarão: "E a Rússia? Como enfrentam os russos esse problema?" Nesse caso, a questão muda de figura. Os russos gerem seu sistema socialista no âmbito de um mundo em que existem preços para todos os fatores de produção, para todas as matérias-primas, para tudo. Por conseguinte, podem utilizar, em seu planejamento, os preços do mercado mundial. E, visto que há certas diferenças entre as condições reinantes na Rússia e as reinantes nos Estados Unidos, frequentemente o resultado é que, para os russos, parece justificável e aconselhável - de seu ponto de vista econômico - algo que, para os americanos, absolutamente não se justificaria economicamente.

A "experiência soviética" - ou "experimento", como foi chamada - não prova coisa alguma. Nada revela sobre o problema fundamental do socialismo, o problema do cálculo. [3] (grifo nosso)


Como se vê a afirmação de que “Mises previu o colapso da União Soviética” é um mito que não corresponde às posições manifestadas pelo próprio autor.


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[1] O Cálculo Econômico sob o Socialismo.

[2] As Seis Lições.

[3] As seis lições. 2. Segunda Lição - O Socialismo.


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domingo, 13 de setembro de 2015

RS: burocracia sindical desmonta greve em momento decisivo

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Apesar da manutenção do parcelamento dos salários e há poucos dias da Assembleia Legislativa apreciar uma série de projetos do governo Sartori (PMDB) que atacam os serviços públicos, os servidores estaduais e o conjunto da população, a burocracia sindical encerrou, na última sexta-feira (11/08), a greve das 44 categorias de servidores que já durava duas semanas – e que só levou esse tempo por pressão da base, em especial dos trabalhadores em educação.

A reunião do chamado “Movimento Unificado dos Servidores Estaduais” que decidiu pelo fim da greve contou apenas com as burocracias sindicais, como atesta a foto abaixo, extraída do site da Federação Sindical dos Servidores Públicos no Estado do RS (Fessergs) [1]:




Para mascarar a desmobilização convocaram paralisações para as próximas duas terças-feiras (15 e 22), dias de possíveis votações no parlamento gaúcho, e mais alguns dias de paralisações em mesmo número de parcelas de salários anunciadas pelo governo, caso sigam ocorrendo. Assim se Sartori anunciar pagar em duas parcelas, serão dois dias de paralisações, se for três parcelas, três dias de paralisações, e assim sucessivamente. Simplesmente ridículo!

O ponto alto, da baixeza das direções burocráticas, se deu na assembleia do sindicato dos trabalhadores em educação (CPERS), na sexta-feira (11). Nela, a direção petista do sindicato - que já havia declarado na imprensa a disposição de acabar com a greve dias antes da assembleia – roubou o resultado da votação no ponto da continuidade ou não da greve, se recusou a fazer a contagem dos votos e diante da revolta da oposição e da base encerrou a assembleia declarando as suas demais propostas aprovadas.

Ao desmontar a greve dos servidores a burocracia sindical deu o sinal verde que o governo Sartori necessitava para implementar o seu duro ajuste. A declaração na imprensa do Secretário da Educação, Vieira da Cunha, falando do final da greve dos trabalhadores em educação e da recuperação dos dias parados antes do resultado da assembleia da categoria e a reunião do governador com deputados do PT para tratar do ajuste reforçam a desconfiança de jogada ensaiada entre o governo estadual e dirigentes sindicais burocráticos. [2]


O ajuste de Dilma passa pelo ajuste dos governadores

Muitos têm se perguntado como é possível que dirigentes sindicais ligados ao PT atuem de forma pelega diante de um governo do PMDB (concorrente histórico dos petistas no Estado) e mais ainda: de um governo muito similar ao de Antônio Britto. Para compreender essa aparente anomalia é preciso verificar quais são os compromissos políticos que norteiam esses dirigentes.

Como petistas eles estão comprometidos com o governo Dilma. A estabilidade, pelo menos do ponto de vista do andar de cima, da gestão da presidente passa por sua capacidade em implementar o ajuste fiscal. E o sucesso dessa empreitada passa pelo sucesso do ajuste fiscal aplicado pelos governadores nos Estados, uma vez que boa parte dos recursos que cortam da população em nível local são drenados para o pagamento da dívida pública com a União que, por sua vez, os repassa para os banqueiros e especuladores.

No dia 30 de julho a presidente Dilma reuniu-se com os 26 governadores para pactuar o ajuste fiscal, no que ficou acordado uma “ajuda mútua” entre as partes. A sintonia dessa ajuda evidencia a similaridade daqueles que no plano eleitoral e de discursos tentam se apresentar como distintos. Governador de Goiás, o tucano Marconi Perillo não vacilou em declarar-se favorável ao que firmaram os governadores presentes: “apoio ao Estado democrático de direito, à estabilidade política e econômica e o apoio ao ajuste fiscal”. [3]

Não é casual a falta de empenho do governador Sartori e de sua base de deputados, seja no Rio Grande do Sul, seja em Brasília, quando a União tranca as contas do Estado pelo atraso do pagamento da dívida estadual. Se durante o governo Britto Sartori apoiou o acordo da dívida que permite trancar as contas dos estados, nem Lula e nem Dilma reviram esse acordo que prejudica as populações locais para garantir os lucros dos banqueiros e especuladores.

Mas como garantir o cenário acordado no andar de cima se o ajuste fiscal ataca o nível de vida da população aumentando os conflitos sociais? É aí que entram os dirigentes sociais e sindicais burocráticos e comprometidos com o governo Dilma: a sua tarefa é amortecer, estancar e derrotar as revoltas populares e das bases das categorias de trabalhadores em greve.

No Paraná a rejeição popular ao governo do tucano Beto Richa ganhou as ruas, estádio, teatro, praça de alimentação de shopping, evento esportivo juvenil, ou seja, se alastrou de tal modo que se dirigida corretamente teria ocasionado a queda do governador odiado. Mas a burocracia sindical comprometida com o “Fica Dilma” e o seu ajuste fiscal não poderia ir até as últimas consequências, e não o foi.

É óbvio que se seus compromissos políticos não o permitem ir até o fim contra um concorrente direto do PT em nível nacional tampouco irão contra um aliado nacional, cuja harmonia foi selada no Congresso do próprio PT. Logo, Sartori não será devidamente enfrentado por essas direções.

Será a manutenção do levante da base organizada e mobilizada que romperá o dique de contenção das lutas construído por essas direções que atuam como agentes dos governos nos movimentos sociais e sindicais. Foi por pressão da base que tivemos dias de greves no Estado. Foi a insatisfação da base que desfiliou o CPERS da CUT em plena gestão de uma direção cutista.

Aquecem as chamas de junho de 2013, no terreno sindical, e estas começam a fazer arder os pés pelegos das burocracias sindicais. Assustadas e olhando para os seus compromissos políticos estranhos aos interesses das categorias de trabalhadores que deveriam representar, as burocracias tentam apagar essas chamas de qualquer jeito e já começam a se queimar gravemente. A direção do CPERS, com a sua atuação vil na última assembleia, que o diga.

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[1] Movimento Unificado permanece em "Estado de Greve". 10/09/2015.

[2] Sartori chama deputados do PT para discutir projetos enviados à Assembleia. 11/09/2015.

[3] Após reunião com Dilma, governadores prometem combater ameaças ao ajuste. 30/07/2015.


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segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Sartori financeiriza recursos da saúde e abre as escolas para as empresas privadas

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Sem grande alarde o governo Sartori aprovou, na última semana, medidas nefastas para duas áreas essenciais do Estado: saúde e educação.

Na segunda-feira, 24 de agosto, o governador reuniu-se com representantes dos hospitais filantrópicos e fechou um acordo que prevê a financeirização dos recursos da saúde – recursos da ordem de R$ 210 milhões que ele deveria ter repassado e não repassou devido aos cortes de ajuste fiscal.

Ficou acertado, na referida reunião, que os hospitais buscarão financiamentos e o Estado pagará a conta. Assim os recursos da saúde se transformam em lucros para os banqueiros, que depois serão pagos com novos ajustes fiscais - onde se cortará novamente das áreas essenciais, como a própria saúde. [1]

No dia seguinte, terça-feira, 25, a Assembleia Legislativa aprovou o PL 103/15 [2], de autoria do próprio Executivo, e que o próprio governador havia solicitado regime de urgência.

Chamado de programa “Escola Melhor: Sociedade Melhor”, o PL abre as portas das escolas para as empresas privadas fazerem “doações” e outras “caridades”, às quais poderão ser propagandeadas livremente por aqueles que aderirem ao programa, com direito a certificado emitido pelo próprio Governador e o Secretário da Educação parabenizando os “filantropos” pelos “relevantes serviços prestados à educação” (tsc)!

O discurso dos deputados que apoiaram o projeto, alegando que apenas legalizariam uma prática já existente, não poderia ser mais cínico. Afinal se as empresas já realizam doações qual o motivo de legalizar tal prática?

A verdade é que o projeto amplia a ação das empresas nas escolas e, uma vez que estejam dentro do espaço escolar, vão pressionar a comunidade escolar para que a mesma ceda e atue em pró de seus interesses privados. Ainda mais que estarão amparadas e devidamente certificadas pelo governo estadual.

O programa “Escola Melhor: Sociedade Melhor” é uma parceria-público-privada, forma de gestão demandada pela Agenda 2020, que é o programa dos empresários para o Estado do Rio Grande do Sul, conforme pode-se constatar na página 32 do seu “Caderno de Propostas” [3] (ver item 3 abaixo).





Burocracia sindical facilita ajuste de Sartori

Se a aprovação das medidas acima evidenciam para quem Sartori governa, por outro lado a tática de “greve inteligente” da burocracia sindical, que dirige os principais sindicatos de servidores públicos do Estado, facilitou a implementação de tais medidas.

Alegando a necessidade de uma greve de novo tipo a burocracia sindical tenta conter a revolta gigantesca na base dos servidores com paralisações de idas e vindas, o que tem chamado de “greve inteligente”.

Uma “greve inteligente” do ponto de vista do governo que aguarda os servidores voltarem ao trabalho para aprovar seus projetos - como ocorreu na última semana - e parcelar novamente os salários, agora com um ponto de corte ainda mais baixo (R$ 600,00). Uma “greve burra” do ponto de vista dos trabalhadores que, mandados trabalhar normalmente pelas burocracias sindicais, não conseguem evitar os ataques. Para se ter uma ideia as galerias da Assembleia Legislativa, que deveriam estar lotadas de professores e funcionários de escola, estavam vazias no dia da aprovação do PL 103/15. Nem mesmo a presidente e o vice-presidente do CPERS se fizeram presentes [4].

A burocracia sindical parece mais comprometida com o acordão PT-PMDB do que com as categorias que representam. Por isso tem buscado amortecer as lutas.

Mas a prática pode mostrar aos servidores que quando estão mobilizados conseguem conter os ataques do governo, como a retirada do PL 169/15, da deputada Regina Becker (PDT), que ataca a gestão democrática das escolas, e que foi retirado da pauta de votação da Assembleia Legislativa em meio aos dias de paralisação anterior (18 a 21 de agosto). Se isso for assimilado a rebelião da base dos servidores pode fugir do controle das burocracias e irromper em um movimento de desfecho imprevisível.

O certo é que somente uma greve geral de servidores públicos por tempo indeterminado terá a capacidade de derrotar o ajuste fiscal de Sartori. E isso só poderá ocorrer com a base atropelando as direções sindicais burocráticas.

As chamas de junho de 2013, no terreno sindical, começam a aquecer no Rio Grande do Sul. A pressão já está pegando: a paralisação que era para iniciar apenas na terça-feira, 01/09, teve de ser antecipada para a segunda-feira, 31/08; e o que eram inicialmente 3 dias de greve geral, se tornaram 4. Não será surpreendente se até o final da semana alguma categoria apontar para o prolongamento da greve.


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[1] Estado propõe financiamento para pagar repasses atrasados aos hospitais filantrópicos. 24/08/2015.

[2] Projeto de Lei 103/2015. Proponente: Poder Executivo. AL/RS. Acessado em 30/08/2015.

[3] Agenda 2020. Caderno de Propostas. Rio Grande do Sul. Agosto de 2014.

[4] Assembleia aprova projeto para que empresas façam obras e doem equipamentos e livros às escolas. 25/08/2015.


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