domingo, 20 de novembro de 2011

Regulação: ao invés dos bancos, os Estados

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Quem não se lembra, após o estouro da crise econômica em 2008, dos discursos de alguns políticos, jornalistas e demais analistas sobre a necessidade de se criar leis para regulamentar o sistema financeiro? Essa quimera chegou a ser apresentada como panacéia para resolver a crise.

Os mais atentos, porém, não se deixaram enganar. Escrevi o seguinte, sobre isso, no final do ano passado:
"(...) é duvidoso acreditar que de fato ocorrerá um controle do sistema financeiro que beneficiará os consumidores conforme alardeado, pois assim como o Estado as suas agências reguladoras também estão de joelhos para o grande capital. E mesmo que haja um controle que venha a beneficiar de alguma forma os consumidores, é falacioso dizer que com tal medida se pode impedir futuras crises do capitalismo." [1]

Pois passados três anos do início da crise o discurso do controle do sistema financeiro não só se enfraqueceu, como os últimos eventos ocorridos na Europa mostram que ao invés dos bancos serem regulados pelos Estados está ocorrendo o contrário: os Estados é que estão cada vez mais sendo regulados pelos banqueiros.

Não que fosse diferente antes. A democracia representativa da burguesia foi concebida dela para ela mesma. [2] O que mudou foi que com a crise o que antes era velado para o grande público, iludido com um poder de decisão que nunca teve, aparece agora de forma explícita.

Primeiro foi a demonstração de mau humor dos mercados diante da possibilidade, que nunca foi séria, levantada pelo Primeiro-Ministro grego, George Papandreou, de realizar um referendo com o povo a respeito do acordo já firmado com a União Européia. E sequer se deram ao trabalho de tentar esconder que o mau humor se devia ao fato do povo ter a oportunidade de opinar sobre medidas econômicas. [3]

Agora, matéria do jornal francês Le Monde, mostra que os homens que estão a assumir os rumos econômicos da Europa têm íntimas ligações com a banca internacional. Mário Draghi (novo presidente do Banco Central Europeu), Mario Monti (novo primeiro-ministro de Itália) e Lucas Papademos (novo primeiro-ministro da Grécia) tiveram ligações com o banco estadunidense Goldman Sachs, tendo alguns deles trabalhado diretamente para o banco. [4]

"Mario Draghi foi vice-presidente do Goldman Sachs para a Europa, entre 2002 e 2005. O jornal assinala que ele tinha a responsabilidade das “empresas e países soberanos” e, por isso, tinha a seu cargo vender o produto financeiro 'swap', o que permitiu “dissimular uma parte da dívida soberana” e “maquilhar as contas gregas”. Monti tornou-se conselheiro internacional do banco em 2005. Quanto a Lucas Papademos, que foi governador do Banco Central da Grécia entre 1994 e 2002, o jornal refere que ele “participou”, como governador do banco central, na operação de maquilhagem das contas “perpetrada pelo Goldman Sachs”." [ibidem]

De acordo com o jornal, Petros Christodoulos (atual gestor da dívida grega) e Peter Sutherland (que ajudou a banca a intervir na Irlanda) também tiveram/tem ligações estreitas com o Goldman Sachs, tendo sido o primeiro corretor do banco e o segundo presidente - atualmente ainda é administrador do mesmo.

Mas o comprometimento desses - e outros dirigentes - vai além do Goldman Sachs. O Le Monde cita a Comissão Trilateral, organização criada por David Rockfeller em 1973, da qual fazem parte Mario Monti, Lucas Papademos, Paul Volcker, Henry Kissinger, Condoleeza Rice, Madeleine Albright, Timothy Geithner, Robert Zoellick, entre outros. [5]

Os banqueiros não apenas conseguiram colocar seus mais fiéis agentes na condução da economia européia como estão a exigir dos novos governantes, que serão eleitos pelo voto popular, que não ousem alterar os rumos ditados por eles. [6] Ou seja, o voto, anteriormente apontado pelas classes dominantes como a "arma" que o povo dispunha para promover mudanças, será inútil para gregos, italianos e espanhóis.

Três anos depois do início da crise ao invés do controle do sistema financeiro pelos Estados é o primeiro que cada vez mais controla os segundos, deixando explícito o que antes era dissimulado: que a democracia burguesa não passa de uma ditadura do capital disfarçada.


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[1] A expansão do neoliberalismo em meio a sua crise (20/12/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2010/12/expansao-do-neoliberalismo-em-meio-sua.html

[2] O desgaste da democracia representativa moderna (09/09/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2010/09/o-desgaste-da-democracia-representativa.html

[3] O referendo grego e os democratas ocidentais (02/11/2011):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2011/11/o-referendo-grego-e-os-democratas.html

[4] Banco Goldman Sachs: O traço comum de Mario Draghi, Mario Monti e Lucas Papademos (16/11/2011):
http://www.esquerda.net/artigo/banco-goldman-sachs-liga-mario-draghi-mario-monti-e-lucas-papademos

Goldman Sachs, le trait d'union entre Mario Draghi, Mario Monti et Lucas Papadémos (14/11/2011):
http://www.lemonde.fr/europe/article/2011/11/14/goldman-sachs-le-trait-d-union-entre-mario-draghi-mario-monti-et-lucas-papademos_1603675_3214.html#ens_id=1603680

[5] THE TRILATERAL COMMISSION - AUGUST 2011:
http://www.trilateral.org/download/file/TC%20list%208-11%20%285%29.pdf

[6] "A democracia está desaparecendo na Europa", diz líder da esquerda alemã
http://operamundi.uol.com.br/conteudo/entrevistas/17934/a+democracia+esta+desaparecendo+na+europa+diz+lider+da+esquerda+alema.shtml
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