sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Depoimento de um licenciando sobre o ensino gaúcho

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Estudei todo o ensino médio e metade do ensino fundamental (da 5ª à 8ª série) em escola pública. Em 1995 quando estava concluindo o fundamental a direção da escola estadual em que estudava passou nas salas de aula nos orientando na procura de escolas de ensino médio.

Na época se preenchia, de próprio punho, uma ficha onde se indicava o nome de quatro escolas em que desejávamos estudar por ordem de preferência. A direção da escola, provavelmente por orientação da Secretaria da Educação, nos indicava a colocar no topo da lista os nomes de escolas técnicas mesmo que não as quiséssemos.

Muito jovem, desconhecia o que significava a maioria dos cursos que as escolas técnicas ofereciam. Apesar de não desejar uma escola técnica, segui a orientação da direção da escola, escolhi uma instituição de ensino técnico, assim como o curso (optei por Contabilidade sem saber direito do que se tratava), tive que prestar prova - na qual consegui aprovação e classificação - e dessa maneira acabei cursando o ensino médio técnico.

Nessa modalidade de ensino eram priorizadas as disciplinas "técnicas" e devido a isso tínhamos apenas um ano de matérias exigidas no vestibular como Química, Física, História, Geografia, Literatura e Biologia.

Devido aos problemas que há décadas assolam o ensino estadual, e que por serem de amplo conhecimento da sociedade gaúcha dispensam serem citados, mesmo a formação técnica (supostamente priorizada) foi precária. É verdade que no meu caso nunca procurei nada na área por ter entrado contrariado já que o meu objetivo era prestar vestibular, mas a maioria dos meus colegas, mesmo os conscientes do que o curso representava, não conseguiu nada!

É de suma importância fazer essa observação tendo em vista que o Governo Tarso está defendendo, como panacéia, uma proposta de reformulação do ensino médio onde os cursos técnicos preterirão, mais uma vez, outras disciplinas. (Obs: hoje o ensino técnico está separado do médio)

Diferentemente da época em que cursei o ensino técnico o projeto do governo estadual torna obrigatória a realização do estágio para a conclusão dessa modalidade de ensino. Estágios exigidos para a conclusão de curso não são remunerados. A Lei 11.788/08 (Lei do Estágio) afirma em seu artigo 12:
"O estagiário poderá receber bolsa ou outra forma de contraprestação que venha a ser acordada, sendo compulsória a sua concessão, bem como a do auxílio-transporte, na hipótese de estágio não obrigatório." [1]

Entregar, gratuitamente, ao empresariado, a força de trabalho daqueles que mais necessitam de recursos para sobreviver se assemelha à escravidão e não à emancipação das classes exploradas como tenta fazer crer o governo no texto do seu projeto disponível no site da Secretaria da Educação. Um texto que tem o desplante de tentar justificar tamanho absurdo com citações de autores progressistas e até revolucionários. [2]

De volta a minha experiência, hoje estou quase me formando em Licenciatura de Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Fiz uma, das duas cadeiras obrigatórias de estágio docente, o que me deu a certeza de que lecionar me satisfaz.

É uma certeza que a maioria dos meus colegas não têm. São raros os que querem ser professor. A maioria faz licenciatura para ter uma "carta na manga", ou seja, uma possibilidade a mais de emprego, já que o mercado de trabalho dos cientistas sociais não é muito amplo. Assim que conseguem outra "carta" a que estava na manga logo é descartada.

Há aqueles também que têm a sua certeza derrotada pelo quadro precário do ensino público do nosso Estado. Estes costumam desistir da docência durante o estágio.

De minha parte admito que a minha certeza esbarra, principalmente, nos baixos salários pagos aos professores. Esse quesito me impediria de abandonar meu atual emprego para ir para o magistério gaúcho.

Os planos do Governo Tarso teriam condições de enfrentar os problemas que acabei de relatar? Se observarmos atentamente a sua proposta de Avaliação que responsabiliza os professores pela evasão [3] e a sua fuga de pagar o piso nacional dos professores não há como responder afirmativamente a tal questionamento.

A atual greve dos professores do Estado do Rio Grande do Sul é contra todo esse estado de coisas. Não é apenas em defesa do piso, o que por si só já seria justificável. É uma greve em defesa do ensino estadual ameaçado com mais golpes de sucateamento. Por isso deve ser apoiada por toda a sociedade gaúcha!

Como diz uma velha canção "esperar não é saber"! Se os ataques do governo ocorrem nesse momento a resposta dos professores não pode ser dada em outro momento que não agora! Os que se deixam pautar pela grande mídia e pelo imediatismo podem ver seus filhos trabalhar como escravos em um futuro próximo.

Avante, professores!



- Jorge Nogueira, servidor público federal e licenciando em Ciências Sociais pela UFRGS.


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[1] Lei 11.788 de 25 de setembro de 2008:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11788.htm

[2] Proposta do Ensino Médio - Secretaria da Educação do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.seduc.rs.gov.br/

[3] Sistema Estadual Articulado de Avaliação Participativa - Secretaria da Educação do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.seduc.rs.gov.br/
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