01/06/2013
Felipe Oiticica – militante do PCB (RJ)
Privada de suas bandeiras econômicas tradicionais – agora que um
governo que se suporia de esquerda as utiliza sem o menor pudor –, os
setores da direita brasileira que não aderiram à “base de sustentação”
do governo Dilma estão num beco sem saída. Procuram então,
desesperadamente, algo para agitar, a seu favor, o marasmo político.
Aproveitando-se do aumento exponencial da violência criminosa em todo
o país e da sensação generalizada de insegurança, a direita levanta a
surrada bandeira da redução da maioridade penal, tema que conquista
apoios na mídia reacionária, rende matérias bombásticas e sensibiliza
vastas parcelas da população – desde os mais despolitizados até os
simplesmente equivocados ou desinformados, passando pelos abertamente
adeptos do fascismo social.
Sobre o assunto, há propostas e iniciativas de todos os tipos. O
governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, propõe mudanças no Estatuto da
Criança e do Adolescente, com foco exatamente na redução da maioridade
penal; um deputado do PTB inicia coleta de assinaturas para a realização
de plebiscito que permita alterar-se a Constituição, com o mesmo
objetivo; outro, este da ala direita do PDT, defende a redução da
maioridade penal conjugada a uma mal explicada “avaliação
biopsicológica” do menor infrator, para medir-lhe a “capacidade de
entendimento de seu ilícito”; o presidente da Câmara dos Deputados
anuncia a criação de uma comissão especial para analisar a proposta do
mesmo Alckmin de ampliar de três para até oito anos o prazo de
internação de menores infratores, e mais 12 projetos que tratam do mesmo
tema. Para relator da comissão, convenientemente, indicou o líder do
partido de Alckmin, o PSDB. E por aí vai. Está montado o novo circo da
direita raivosa e revanchista, com um velho mas sempre aliciante tema no
picadeiro.
No Executivo, no Legislativo e no Judiciário há alguma reação –
embora tímida, visto que aparentemente pedir redução da maioridade penal
dá votos. O ministro da Justiça corrobora a afirmação de juristas de
que qualquer tentativa neste sentido esbarraria em cláusula pétrea da
Constituição; o ministro da Secretaria Geral da Presidência também
reafirma a posição contrária do Governo Federal; alguns deputados
propõem amplo debate sobre o tema, com envolvimento de pedagogos,
psicólogos, especialistas em educação infantil e do adolescente, além de
profissionais da especialidade de menores infratores.
Mas não são suficientes as manifestações de lucidez de parlamentares,
de detentores de cargos no Executivo, de educadores e de juristas. É
fundamental a mobilização dos setores sociais que percebem com clareza o
que está por trás da nova/velha ofensiva da direita, o que a alimenta,
os pontos fracos de sua argumentação e o que deve ser feito para
enfrentar com efetividade e humanidade o problema do menor infrator.
O que motiva a direita está exposto acima: é mero oportunismo
político/eleitoral. Diante do crescimento incontrolado da criminalidade
infanto-juvenil, as soluções mais fáceis parecem ser a repressão e a
criminalização de faixas etárias cada vez mais baixas. E a
criminalização da pobreza, certamente, porque os menores infratores das
camadas médias e alta têm quase sempre à disposição os melhores
advogados e a velada simpatia dos que julgam.
Sem escrúpulos e nenhum compromisso com uma pedagogia de massas que
vise o aprofundamento dos valores da solidariedade, nem com a busca da
recuperação e da reintegração, a direita apela ao medo que se alastra
pelo tecido social. Suas ideias têm a profundidade de um rio na seca.
Propõe combater a violência filha da miséria, da desesperança, do vazio
existencial ou da desintegração das famílias com a violência
institucionalizada, sistematizada, racionalizada. E isso é tão antigo
quanto a existência de sociedades dividas em classes.
Para a direita, não importa que cada vez maior número de jovens – e
cada vez mais jovens – venham a ser atirados às nossas prisões desumanas
e cooptados pelas organizações criminosas. Não propõe medidas para
humanizar as prisões, mas enchê-las de adolescentes e condená-los
definitivamente à criminalidade.
À direita não parece lógico aumentar as penas de quem alicia jovens
para o crime – isto não dá votos. Lógico é “matricular” o jovem
delinquente na escola que o fará ascender na “carreira”. Isto sim, dá
manchetes agora e votos depois – mesmo que a longo prazo se volte também
contra os que clamam por medidas desse tipo.
Mas se o medo disseminado alimenta o discurso do ódio, o absurdo
desse discurso é evidente. Em nenhum lugar do mundo a redução da
maioridade penal diminui a violência social – ou os Estados Unidos já a
teriam eliminado, porque em suas leis mesmo crianças de 5 ou 6 anos
podem ser criminalizadas, e até com prisão perpétua.
Pelo contrário, a violência social só diminuiu onde se investiu
tempo, dinheiro e paciência na prevenção ao crime, sim, mas sobretudo na
educação integrada, nos valores da cultura e da solidariedade, na
atenção primordial e permanente à infância, na criação de perspectivas
de vida motivadoras para crianças e adolescentes, no engajamento dos
jovens nas atividades de construção de uma sociedade justa e
equilibrada, numa política de massas focada nas novas gerações e em
formas renovadas de convivência na sociedade.
Desnecessário dizer que o capitalismo não é ambiente propício a nada
disso. A mercantilização geral da vida e dos valores – inerente a ele –
assim como tende a corromper desde cedo, tende a turvar a visão do que é
essencial. E, para o capital, aquilo que não promete lucros visíveis
não tem valor.
Mas não é impossível começar, ainda no capitalismo, a virar o jogo. A
mobilização das organizações sociais, dos trabalhadores, dos envolvidos
com a educação, com a cultura e com a ciência tem que pressionar
governos e câmaras legislativas para que não se curvem ao discurso fácil
da barbárie; enfrentar o fascismo social da direita com as armas da
inteligência e da transformação.
O combate deve dar-se em quatro frentes, simultaneamente:
– exigir prioridade absoluta para investimentos maciços na qualidade de vida da infância e da juventude;
– exigir foco na prevenção do crime infanto-juvenil, tanto através de
cuidadoso acompanhamento social desde a infância até à adolescência,
quanto no rigor contra o aliciamento de menores;
– exigir uma renovação radical e urgente nas políticas de ressocialização do menor infrator;
– barrar os caminhos da intolerância e da violência repressiva, pela
derrota de qualquer proposta de diminuição da maioridade penal.
Que a direita, de que uma falsa esquerda tomou as bandeiras
privatistas, procure outro caminho que não o da revanche contra a
juventude, para tentar sair do seu beco sem saída.
Extraído de:
http://pcb.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=6074:a-reducao-da-maioridade-penal-e-o-beco-sem-saida-da-direita&catid=101:criminalizacao
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