quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Prezad@ amig@ governista:

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Aqui estamos em mais um processo eleitoral e após passar quatro anos me ignorando, achincalhando minhas ideias e táticas, censurando e defendendo repressão para minhas greves e protestos, eis que você aparece pedindo desesperadamente o meu voto para derrotar o seu concorrente. Para isso apela para o medo já que coragem de enfrentar os poderosos já não tens mais há muito tempo - aliás, muitos deles até se tornaram teus novos companheiros.

Você fala que deseja continuar com as mudanças. Mas a maior parte dos impostos que pagamos continuam indo parar religiosamente nos bolsos dos banqueiros e dos grandes empresários, garantidos com superávits primários e cortes de verbas na saúde e na educação. Até os recursos do pré-sal, que vendeste como panaceia para a nossa educação (o que nunca acreditei), já foram parar nos bolsos dos rentistas.

As privatizações nunca foram interrompidas. Desde o primeiro dos teus governos que bancos públicos, previdência, rodovias, aeroportos, portos, ferrovias e petróleo foram privatizados. Grandes hidrelétricas controladas por empresas privadas - estrangeiras inclusive - estão sendo construídas com fartos recursos públicos e passando por cima dos direitos indígenas, ambientais e trabalhistas. E, quando, de forma justa, índios e operários reclamam das condições degradantes que tais obras lhes impõem e exigem seus direitos são recebidos pela Polícia, pelo Exército e pela Força Nacional para “dialogar”.

Lembro que no ano passado quando a juventude e os trabalhadores foram às ruas teu governo federal atuou junto com os governos locais do partido que agora você apresenta como o “bicho papão” a ser derrotado de qualquer maneira, colocando à disposição dos mesmos o Exército e a Força Nacional para junto com as polícias locais reprimir o povo.

Quando te lembro de tudo isso você, não conseguindo negar, me fala que pelo menos teus governos representam um mal menor em comparação com o teu adversário. Não sou muito partidário da ideia do mal menor mas devo alertá-l@ que esse exercício pode encontrar o resultado inverso do pretendido. Procure vasculhar quem fechou mais rádios comunitárias, quem demarcou menos terras indígenas, quem privatizou mais a infraestrutura, quem promoveu a maior privatização no setor petrolífero, quem concedeu mais lucros aos bancos e às grandes empresas, quem está dando mais dinheiro do BNDES para as grandes corporações, quem aprovou mais leis repressivas contra os movimentos sociais, quem os reprimiu e os espionou mais e quem elevou em escala recorde a privatização das ações preferenciais do Banco do Brasil.

Mas e a política externa soberana e progressista? - você me pergunta. Ora que política externa soberana é essa que vai ocupar um país irmão e pobre como o Haiti a pedido do imperialismo? Que progressismo há nisso? O que teve de soberano na crise do Irã onde o Brasil apresentou como alternativa o que o próprio Obama havia recomendado? O que há de progressista em financiar, com dinheiro público, os negócios da burguesia brasileira nos países da América Latina e da África?

E o desenvolvimento nacional? Aqui não posso conter as risadas afinal que desenvolvimento é este onde a desnacionalização da economia e as exportações de matérias primas se aprofundam cada vez mais?

Ah, mas e a distribuição de renda? Por acaso pensa que sou ingênuo e desinformado? Pensa que não sei que desses dados estatísticos foram excluídos os burgueses constando apenas os assalariados?

Então você me fala dos programas que chama de sociais. Vamos analisá-los mais de perto.

O Bolsa Família, anteriormente rejeitado pelo seu próprio partido mas que agora você chama de “revolucionário”, tem respaldo teórico nos liberais Friedrich Hayek e Milton Friedman, como admitiram os próprios liberais do Instituto Mises Brasil. Ele é indicado pelo Banco Mundial e aqui no Brasil teve seus créditos atribuídos ao tucano Marconi Perillo pelo próprio ex-presidente Lula. Qual a função desse tipo de programa? Por um lado inserir como consumidores setores excluídos pelo próprio capital, por outro permitir que as reformas sociais (tímidas no caso do nosso país) sejam desmontadas mais facilmente. Ou seja, com uma mão distribui-se um programa assistencial enquanto que com a outra tascam-se recursos da saúde, educação e previdência, às vezes privatizando-as. Não é por acaso que os mesmos organismos internacionais que pregam austeridade fiscal e cortes nas reformas sociais indiquem e celebrem programas como o Bolsa Família, como orgulhosamente você gosta de apontar os mimos do Bando Mundial.

O Prouni, que aprofunda a privatização da educação superior, é um típico programa defendido por setores da direita política pois trata-se de bolsas nas universidades privadas que assim têm garantidos os seus lucros. Não é por acaso que tucanos como Fernando Schuler elogiem tal programa e já defendam um Prouni para o ensino básico. O FIES, endivida os estudantes para manter essa lógica privatista. E o Pronatec é uma espécie de Prouni do ensino técnico que transfere recursos públicos para o Sistema S. Assim, em vez de priorizar um sistema público de ensino que garanta acesso e qualidade a todos, utilizam-se recursos públicos para aprofundar o caráter mercantil da educação no país, tudo para garantir os lucros dos tubarões, mas de forma oportunista tinge-se tal programa de “social” e “progressista” aproveitando-se dos problemas históricos de acesso das nossas classes populares, cujo benefício em tal programa não passa de efeito colateral, afinal um governo que realmente está preocupado com a sorte das mesmas não corta verbas da educação e da saúde públicas para entregar aos especuladores.

Já o Minha Casa Minha Vida é parte integrante das medidas “anticrise” adotadas pelo vosso governo após a eclosão da crise de 2008. Tal programa, longe de observar a necessidade social de moradia no país integra e aprofunda a especulação imobiliária, fazendo com que os pobres sejam muitas vezes despejados e empurrados para a periferia da periferia quando suas precárias moradias localizam-se em áreas de interesse do capital imobiliário.

Como se percebe tais programas são indicados, tolerados e atendem aos interesses do próprio capital. Dificilmente seriam extintos pelo seu concorrente. Despidos da sua aparência e revelada a sua essência, esses programas, que você chama de reformas, na verdade evidenciam que vosso governo não realizou uma única reforma social em doze anos! Devo lembrar-te de que o debate histórico na esquerda sempre foi reforma ou revolução. E, assim como o seu concorrente, vosso governo não se localiza em nenhum desses campos.

É um direito de vocês administrarem o capitalismo e acreditar que é possível atenuar seus males, embora essa opção não seja apenas ideológica já que muitos companheiros se tornaram empresários, consultores de empresas, gestores de fundos de pensão, sócios dos negócios das grandes corporações e assim ganhem muito com o sistema. Mas também estou no meu direito de rejeitar esse caminho e seguir levantando bem alto as bandeiras do materialismo histórico e dialético, ou seja, do socialismo.

Os pais do socialismo científico em jornadas duríssimas rejeitaram a ideia do mal menor, o rebaixamento do programa, as alianças com setores burgueses e defenderam a organização independente dos trabalhadores. Não se abstiveram, não ficaram em cima do muro, tiveram um lado claro.

E é baseado nos ensinamentos deles que me posicionarei neste segundo turno. Vossa candidata, assim como seu concorrente, se comprometeu com uma série de ajustes em favor do capital tão logo se encerrem as eleições, o que resultará em mais cortes de recursos das áreas sociais, mais ataques aos diretos dos trabalhadores, demissões, aumento de preços e mais privatizações.

Para mim o inimigo principal continua sendo o capitalismo e a oposição ao mesmo não pode ser abstrata, deve ser real e isso passa por rejeitar aqueles que trabalham para a sua manutenção e perpetuação. Em um processo eleitoral passa por rejeitar as candidaturas que estão comprometidas com ajustes em favor do mesmo. E, se as duas candidaturas já estão comprometidas com o sistema, é inútil, do ponto de vista de quem defende outro modelo de sociedade, votar em qualquer uma delas. Logo, se o voto útil é inútil o único voto útil para quem rejeita as candidaturas do sistema é o voto nulo!

Peço que me respeite e que não fique inconformado vociferando impropérios contra a minha posição. E não ouse tentar me responsabilizar por uma eventual derrota da tua candidatura, afinal não era você que vivia zombando do meu peso irrelevante no processo eleitoral?

Sem mais, passe bem!



Atenciosamente,


Um amigo socialista!


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