domingo, 28 de agosto de 2011

Dilma estaria preparando privatização de empresas elétricas

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De acordo com reportagem do jornal Valor Econômico do último dia 22 de agosto, seis distribuidoras federalizadas de energia elétrica, hoje vinculadas à Eletrobrobras e localizadas em Estados do Norte e do Nordeste, estariam na mira da privatização preparada pelo Governo Dilma.

Amazonas Energia, Boa Vista Energia, Ceal (Alagoas), Cepisa (Piauí), Ceron (Rondônia) e Eletroacre seriam as empresas a serem entregues a iniciativa privada.

O empresariado está assanhado com essa possibilidade como afirma a própria reportagem do Valor:
"Comprar empresas como a Cepisa, que atua no Piauí, sempre foi um desejo declarado, por exemplo, da Equatorial Energia, que hoje é dona da Cemar (Maranhão), vizinha à Cepisa, e que ainda não conseguiu expandir sua atuação no setor elétrico." [1]

Ainda de acordo com o jornal, a privatização das federalizadas poderia reabrir as porteiras nos Estados:
"Se a decisão for levada adiante e, principalmente, aceita politicamente, a expectativa do setor privado é de que a privatização comece a ser aceita também dentro de governos estaduais (...)" [idem 1]

Velhos argumentos para velhas medidas

O argumento descrito na matéria para a privatização das distribuidoras federalizadas é de que elas seriam deficitárias e seus serviços ineficientes. O laudo e a saída é dado por auditores privados conforme consta na matéria do Valor:
"Situação que levou os auditores privados da empresa a descreverem, pela primeira vez em suas notas de balanço, que há dúvidas sobre a continuidade operacional dessas companhias." [idem 1]

Mas se o estado dessas empresas é de tamanha gravidade, por que, mesmo assim, os empresários possuem um "desejo declarado" de assumi-lás? A pista pode ser encontrada na História das privatizações em nosso país.

Muitas empresas foram privatizadas com dinheiro público e uma vez privatizadas as companhias privadas continuaram recebendo dinheiro público para investimentos. Isso aconteceu no Governo FHC mas também no Governo Lula.

No setor elétrico, por exemplo, é notório o caso da privatização da Eletropaulo, onde a empresa estadunidense, AES, comprou a estatal com dinheiro do BNDES e nunca pagou o empréstimo. Na própria reportagem do Valor é citada a privatização, quase sem ágio, da Gerasul, arrematada pela Tractebel por U$$ 800 milhões.

E por falar na Tractebel, em 2007, o grupo Suez Energy South América Participações, braço brasileiro do grupo franco-belga Suez Tractecel, recebeu R$ 570,2 milhões do BNDES para a construção da hidrelétrica São Salvador, no rio Tocantins. O financiamento público correspondia a 67,25% do investimento total do projeto, que era de R$ 847,7 milhões. [2] Somente entre 2008 e metade de 2010 as empresas de energia do grupo GDF-Suez receberam mais de R$ 8,4 bilhões do BNDES. [3]

Em 2005 o BNDES liberou R$ 727 milhões para a Light. [4] Também entre 2008 e metade de 2010 a empresa recebeu mais de R$ 589 milhões do banco público. [idem 3] Apesar de todo este aporte de dinheiro público pode-se ver a "eficiência" dos serviços da Light com as vergonhosas explosões de bueiros ocorridas recentemente no Rio de Janeiro. Isso sem falar nos valores das tarifas cobradas pelas empresas privadas, um achaque que leva 1 bilhão a mais por ano dos consumidores. [5]

Dilma versus Lula: uma falsa contradição

A reportagem do Valor Econômico joga lenha na fogueira de uma confusão que já se faz presente no imaginário de muitos lutadores sociais honestos e pessoas com ideal de esquerda: a de que o Governo Dilma seria mais conservador em relação ao Governo Lula. Nessa linha a matéria diz:
"A pecha de 'privatização' é o maior obstáculo - por ser político - a ser superado e por isso ainda nenhum estudo formal foi solicitado. Mas se no governo de Luiz Inácio Lula da Silva qualquer discussão sobre o assunto era terminantemente proibida, desde que a presidente Dilma Rousseff apoiou e determinou o programa de concessão de aeroportos a postura entre os colaboradores da presidente no setor elétrico mudou." [idem 1]

É falso dizer que na gestão de Lula as privatizações eram "discussão proibida". Ainda no seu primeiro mandato foram privatizados os bancos federalizados do Maranhão e do Ceará, além de terem sido aprovadas medidas privatizantes como as Parcerias-Público-Privadas (PPPs) e a Lei de Gestão das Florestas Públicas (que permite a privatização de terras na Amazônia), isso sem falar da Reforma da Previdência de 2003 que privatizou parte da previdência pública. [6]

No segundo mandato Lula jogou peso na privatização da infra-estrutura do país: estradas (3260 quilômetros de rodovias federais, quase o quadruplo do que privatizou Fernando Henrique), hidrelétricas, ferrovias e portos além de ter deixado engatilhado a privatização dos aeroportos. E apesar do discurso governista na última eleição a verdade é que nem o petróleo escapou: dos dez leilões de bacias petrolíferas realizados pelo governo brasileiro nos últimos 16 anos, seis foram feitos pelo Governo Lula. [idem 6]

Iguais aos tucanos

Nesta semana o deputado estadual gaúcho, Nelson Marchezan Júnior, do PSDB, disse, em um encontro municipal do seu partido no interior do Rio Grande do Sul, que o "PT roubou o programa" dos tucanos. A possível privatização de empresas de energia elétrica, assim como outras privatizações realizadas pelos governos petistas, confirma esta assertiva finalmente reconhecida pelos tucanos, que posam de "oposição" ao governo federal.

Mas não apenas a privatização em si seria igual a dos tucanos. Os métodos são similares. As empresas, alvo da privatização, estão a mais de 10 anos sob controle da Eletrobras, sendo 8 de administração petista. Privatizar agora alegando ineficiência dos serviços e déficits é atestar que o governo sucateou as empresas para entregá-las. Isso, porém, não seria novidade: com os aeroportos ocorreu a mesma coisa. E como na época dos tucanos, após a "inevitável" privatização surgem rios de dinheiro do BNDES para os consórcios privados investir e lucrar.

Como se percebe, não só não há uma contradição entre as gestões de Dilma e Lula, como temos uma convergência de suas gestões com a de Fernando Henrique Cardoso. PT e PSDB são, como reconheceu o próprio Marchezan Júnior, farinhas do mesmo saco!


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[1] Governo discute privatização de federalizadas. Valor Econômico, 22/08/2011, p. B8.

[2] BNDES libera R$ 570,2 milhões para hidrelétrica do grupo Suez Tractebel (21/03/2007):
http://oglobo.globo.com/economia/mat/2007/03/21/295025168.asp

[3] Veja quanto receberam os grupos mais favorecidos pelo BNDES (08/08/2010):
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/779517-veja-quanto-receberam-os-grupos-mais-favorecidos-pelo-bndes.shtml

[4] BNDES libera R$ 727 milhões para a Light (29/06/2005):
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u97750.shtml

[5] Brasileiro paga a mais por luz há 7 anos; consumidores perdem R$ 1 bi por ano (18/10/2009):
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u639643.shtml

[6] Lula: ruptura ou continuidade de FHC? (27/11/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2010/11/lula-ruptura-ou-continuidade-de-fhc.html
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