domingo, 19 de fevereiro de 2017

Brasil: cai a máscara da falsa polarização

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Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem Pra Rua, organizações que lideraram os atos pelo impeachment de Dilma, chamaram ato em defesa da Lava Jato mas não querem saber de “Fora Temer”.

Rogério Chequer, coordenador do Vem Pra Rua, não tergiversou sobre o caráter do ato: “queremos deixar bem claro que este não é um ato ‘fora, Temer’” [1]. Isso poucos dias após Eduardo Cunha ter delatado Michel Temer, de forma comprometedora, ao juíz Sérgio Moro [2] – fato que, aliás, passou batido por MBL e Vem Pra Rua, que guardaram um silêncio conveniente e cúmplice.

De forma descarada e vergonhosa blindam um dos principais articuladores do fim da Lava Jato, uma prática que tem sido corriqueira. No episódio em que Temer criou um ministério para conferir foro privilegiado a Moreira Franco, investigado pela Lava Jato, o MBL lamentou a criação do ministério, não a blindagem de Franco. Posteriormente foram além, repetindo o discurso dos integrantes do governo de que o caso de Moreira Franco era diferente do de Lula [3]. No final de 2016, MBL e Vem Pra Rua já haviam convocado outro ato “contra a corrupção” mas pelo “Fica Temer” [4].

Assim, mostram que nunca foram contra a corrupção mas apenas contra os desvios dos concorrentes. Não foi por acaso que vários dos seus integrantes se filiaram nos partidos que estão atolados até os fios de cabelo na corrupção e que são investigados pela Lava Jato – isso depois de proclamarem-se orgulhosamente “apartidários” [5].

Um apartidarismo que era apenas da boca para fora. As relações dessas organizações com partidos como PSDB, DEM, PMDB, Solidariedade, entre outros, já havia sido divulgada na grande imprensa como em matéria publicada no UOL em 27 de maio do ano passado [6]. Na ocasião, o MBL negava qualquer financiamento, embora reconhecesse a utilização do aparato fornecido pelos partidos, e ainda declarava que “Nos assombra perceber que ainda temos gente que recusa a ação política coordenada entre partidos e movimentos, numa clara demonstração de fascismo e autoritarismo.” [7]

Não haveria o mínimo “assombro” se os dirigentes do MBL não tivessem se declarado “apartidários”. Também não ocorreria “assombro” caso os partidos que coordenaram a luta política com seu movimento não tivessem implicados em escândalos de corrupção, incluindo o mesmo esquema o qual eles tanto denunciavam seus concorrentes.

Como nem todos são cegos e incoerentes e como a base que ia nos atos chamados pelo MBL e Vem Pra Rua era heterogênea, no dia 13 de março de 2016, os tucanos Aécio Neves e Geraldo Alckmin foram vaiados e expulsos da Avenida Paulista, tendo frustrado o seu desejo de subir no palanque com seus aliados de movimento para consagrar “a ação política coordenada” [8].

Se o fim formal do apartidarismo foi selado com a filiação partidária ela aprofundou-se com o apoio explícito a governos, dentro e fora do país. O presidente Maurício Macri da Argentina foi muito “mitado” pelo MBL até a sua política aprofundar o caos social e assim o movimento jogou-o na invisibilidade tendo caído no “esquecimento”, sem nenhuma mea culpa ou autocrítica. Atualmente apoiam os tucanos João Dória Jr e Nelson Marchezan Jr. Com Temer o apoio se dá de forma um pouco mascarada, principalmente através de blindagens, exigências e defesa de suas medidas de ajuste fiscal.

Mas não foi apenas o seu apartidarismo que mostrou-se farsante, aquela conversa de que “primeiro se tira uns e depois o resto” também não passou de discurso engana bobo. Para completar apoiam o ajuste fiscal que tem massacrado o nível de vida do povo brasileiro, assim como os governos que o aplicam.

Enquanto isso, Lula e o PT trocam afagos [9], fazem acordos, alianças eleitorais [10] e até votam nos ditos “golpistas” para presidir os parlamentos, incluindo os candidatos de Temer no Congresso Nacional [11].

Em São Paulo, cidade que acusam de ser o ninho da reação nacional, votaram no candidato do DEM, partido do Fernando Holiday do MBL, para a presidência da Câmara Municipal [12]. O rapaz, que está se adaptando rapidinho à política institucional mesquinha, não tardou a devolver a gentileza votando no petista Senival Moura para a Comissão de Transportes da Câmara em um acordo avalizado pelo prefeito tucano João Doria Jr [13].

No que tange ao ajuste fiscal nos movimentos sociais e na oposição parlamentar o PT não tem sido consequente na luta pela sua derrota e onde governa aplica medidas que não deixam a desejar ao ajuste de Temer, que na realidade nada mais é do que a continuidade do ajuste de Dilma e do PT [14].

A história está comprovando que os dois grupos políticos que há pouco tempo atrás tentaram polarizar a política brasileira só desejam chegar e manter-se no poder. Para este objetivo exploraram (e exploram quando possível) a boa intenção e a justa indignação de milhares de pessoas. Como atesta o caso de São Paulo citado, nos bastidores eles se entendem e se arranjam na distribuição de cargos. Ambos desejam o fim da Lava Jato e o ajuste fiscal para manter seus podres privilégios.

O desafio segue sendo a formação de um terceiro campo político independente, classista, anti ajuste fiscal, sem o rabo preso, que tenha como atuação política prioritária a mobilização social para de fato mudar o país e não apenas promover alguma dança nas cadeiras institucionais.

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[1] MBL e Vem Pra Rua convocam manifestações a favor da Lava Jato. 14/02/2017.

[2] Depoimento Eduardo Cunha a Sérgio Moro (completo). 07/02/2017.

[3] Em maio de 2016 a então presidente Dilma Rousseff nomeou Lula Ministro da Casa Civil o que ia lhe conferir foro privilegiado.

[4] Vem Pra Rua e MBL mantêm convocação de ato sobre pacote anticorrupção. 30/11/2016.

[5] Movimentos pró-impeachment mudam discurso e vão às urnas. 17/01/2016.

[6] Áudios mostram que partidos financiaram MBL em atos pró-impeachment. 27/05/2016.

[7] NOTA OFICIAL DO MBL SOBRE MATÉRIA CALUNIOSA DO UOL. 30/05/2016.

[8] Alckmin e Aécio são hostilizados na chegada à manifestação na Paulista. 13/03/2016.

[9] Lula dá conselhos a Temer e diz estar à disposição para diálogo: ‘Me chama’. Josias de Souza, 03/02/2017.

[10] PT e PCdoB se coligam com golpistas em metade das cidades brasileiras. Cleber Lourenço, 22/08/2016.

[11] PT decide apoiar candidatos da base de Temer para o comando do Congresso. 20/01/2017.

[12] No item 11 da nota da bancada municipal do PT paulistano de 26/12/2016 consta a explicação do apoio a Milton Leite do DEM para a presidência da Câmara:

[13] Coordenador do MBL vota em petista em comissão da Câmara de SP. 10/02/2017.

[14] Esta afirmação por vezes gera polêmica. Por isso algumas lembranças são necessárias:
- A PEC dos gastos de Temer tem a sua origem no “Novo Regime Fiscal” do governo Dilma, tanto que o governo do PT no Piauí aprovou uma versão estadual da PEC de Temer com o nome “dilmista”.
- O teor do plano de acordo da dívida com os Estados de Temer, que é uma verdadeira chantagem, é o mesmo do PLP 257/16 de Dilma.
- A contra-reforma do Ensino Médio de Temer tem a sua base na proposta do governo Dilma.
- Dilma já havia se comprometido com uma nova contra-reforma na previdência e atacado direitos trabalhistas.
- Tanto Dilma quanto Temer vetaram proposta de auditar a dívida pública brasileira.
- A entrega do restante do pré-sal já havia sido apoiada por Dilma em votação no Senado Federal em 25/02/2016.


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