Reproduzo
a seguir um trecho longo e importante de um artigo da organização
política Transição Socialista. Em que pese divergências com
algumas conclusões do referido artigo em trechos que não estão
aqui expostos é de grande mérito retomar os fatos e as provas nas
quais se embasa uma possível condenação de Lula, ainda mais em um
momento em que novamente o lulopetismo exerce pressão sobre a
esquerda brasileira e a maior parte dela vacila.
Transição
Socialista
17.07.2017
Tão
logo saiu a condenação de Lula por Moro na Lava-Jato no último dia
12, o PT lançou uma nota oficial, afirmando que não havia provas
suficientes para a condenação, que se tratava de um ataque às
liberdades democráticas e de perseguição política a um grande e
popular “líder”. Logo em seguida, praticamente toda a esquerda
brasileira (do PSOL ao PCB, passando por diversas correntes) produziu
notas contra a condenação de Lula, defendendo em linhas gerais os
mesmos argumentos da nota do PT (todavia, fazendo críticas à
política de “conciliação de classe” de Lula).
Rapidamente,
criou-se um senso comum da “esquerda” em torno da nota do PT e da
linha de defesa dos advogados de Lula. O quão esse senso comum é
frágil, evidencia-se pelo fato de que grande parte dessa “esquerda”
nem se deu ao trabalho de ler a peça condenatória de Moro. Algumas
notas, inclusive, atacam o juiz de Curitiba valendo-se de argumentos
que o próprio juiz expressamente descartou em seu texto (como o
“power-point” dos procuradores da Lava-Jato).
Além
do senso-comum da chamada “esquerda”, cabe analisar os
documentos. Diferentemente do que falam os advogados de Lula, a
condenação não se baseou apenas na delação de Léo Pinheiro, mas
em fartas provas.
Aos
fatos e às provas
Marisa
Letícia, falecida ex-primeira dama, assinou no dia 12 de abril de
2005 um documento chamado “Proposta de adesão sujeita à
aprovação”. Trata-se de uma proposta para entrada na sociedade de
construção do prédio do Guarujá pela Bancoop (Cooperativa
Habitacional dos Bancários, então presidida por João Vaccari Neto,
depois tesoureiro do PT). O termo estava inicialmente preenchido como
referente ao apartamento 174 (o triplex), mas foi rasurado,
colocando-se acima deste o número 141. Este termo era uma cópia
carbono do documento original depois encontrado na sede da Bancoop. O
original estava igualmente rasurado (a rasura fora produzida quando o
original e a cópia carbono estavam vinculados). Também na casa de
Lula e Marisa foram encontrados outros documentos: um do dia primeiro
de abril de 2005, assinado, de compra do apartamento 141, e outro do
mesmo dia, de compra do apartamento 174, não assinado.
Todos
esses documentos, por si só, destroem o argumento de Lula e seus
advogados (conforme expresso pelo ex-Presidente em audiência diante
de Moro), de que nunca houve intenção de compra do triplex, e de
que possuíam apenas uma cota-parte indeterminada do empreendimento,
sem qualquer referência a um dos apartamentos específicos. Todavia,
aqui, apesar da grande incongruência, ainda não há prova da
ocultação de patrimônio.
Deve-se
agora levar em consideração o processo de transferência do
empreendimento da Bancoop para a OAS em 2009 (ano em que a primeira
entrou em graves problemas financeiros). De acordo com o documento de
transferência dos direitos e obrigações da Bancoop para a OAS
(documento de 08/10/2009, aprovado depois por todos os cooperados em
assembleia, sem nenhum voto contrário), os cooperados teriam apenas
duas opções:
1)
demitir-se dos quadros de associados em até 10 dias e requerer a
restituição do dinheiro já investido junto à Bancoop; ou
2)
assinar um contrato de compra do imóvel com a OAS em até 30 dias,
dando prosseguimento ao pagamento dos carnês de financiamento.
Lula
e Marisa foram os únicos associados que, a rigor, não fizeram nem
uma coisa nem outra e não foram cobrados por nada. Marisa
simplesmente deixou de pagar os carnês de compra do imóvel nesse
período de transferência da Bancoop para a OAS, ficando em situação
irregular diante do acordo legal de todos os cooperados.
Curiosamente, há uma carta da Bancoop à OAS de 15/02/2011 que trata
justamente dos poucos cooperados que não regularizaram sua situação,
e entre eles não constam nem Marisa Letícia nem Lula. Seis meses
depois dessa carta, em petição oficial apresentada pela OAS ao
Ministério Público em 29/08/2011, tratando do conjunto da massa
falida da Bancoop adquirida pela OAS, esta afirma que, no que tange
ao residencial de Guarujá, todos os 112 apartamentos foram vendidos,
ou seja, não havia desistência.
Entretanto,
não há qualquer documento de compra do imóvel 141 por parte de
Marisa e Lula junto à OAS. Já a quebra do sigilo fiscal do
ex-presidente Lula, no início de 2016, revelou que o imóvel 141 foi
declarado em seu imposto de renda até 2015 (referente ao
ano-calendário de 2014).
Apesar
da petição da OAS junto ao Ministério Público em 2011 e apesar do
imposto de renda de Lula, a defesa tentou argumentar algumas vezes
que o casal havia desistido do imóvel anteriormente. Todavia, seus
argumentos são muito contraditórios. Há dois documentos de
desistência do imóvel, assinados por Marisa Letícia, apreendidos
na sede da Bancoop, que supõe-se falsos. Um é de 2009
(estranhamente sem a data mais determinada) e o outro é de 2/12/2013
(ou seja, de quatro anos após o prazo legal de desistência,
acordado na assembleia dos cooperados). Apesar desses documentos
assinados de 2009 e 2013 (que contrariam a própria declaração de
imposto de renda de Lula), a defesa deste afirmou em juízo que a
desistência fora feita apenas em 2014. Já Marisa Letícia, em ação
civil contra a OAS em 2016, afirmou que o pedido de desistência fora
assinado apenas em novembro de 2015! Note-se que, apesar de tantos
supostos pedidos de desistência acordados com a Bancoop, nenhum
valor jamais foi restituído e o imóvel, como falamos, constava no
IR de Lula. Somente no IR de 2016 (após o início das investigações)
o imóvel não constou mais, especificando-se, inclusive, que não
constava por conta do acordo de desistência.
No
finalzinho de 2013, o prédio terminou de ser construído. Logo no
começo de 2014, Lula e Marisa Letícia, acompanhados de gerente da
OAS, foram ao imóvel 174 (agora renomeado como 164-A), o triplex.
Menos de um mês depois, o imóvel entrou num grande processo de
reforma personalizada. Note-se que o apartamento 141 (agora renomeado
como 131) foi vendido diretamente pela OAS em 2014 a um terceiro
(apesar de aparecer no IR de Lula como propriedade sua, e não da
OAS). Note-se que o imóvel 164-A (o triplex) jamais foi colocado à
venda, estando documentado como “reservado” em documentos de 2011
apreendidos na Bancoop.
Já
começa a ficar claro aqui que o imóvel 141 (depois 131), declarado
como de cerca de 200 mil reais, seria para ocultar o processo de
aquisição do imóvel 174 (depois 164-A), o triplex. A intenção de
ocultamento estava dada desde o início, desde 2005, quando o
empreendimento era apenas da Bancoop. Não se deve esquecer que a
Bancoop (Cooperativa dos Bancários) era presidida por João Vaccari
Neto, bancário e sindicalista ligado a Lula. Vaccari, como se sabe,
será em seguida tesoureiro do PT e peça-chave em praticamente todos
os escândalos de corrupção desse partido. Quando à frente da
Bancoop, Vaccari usou essa cooperativa dos bancários para desviar
fundos para o PT. Os apartamentos 141 e 174 não são os únicos
investigados nesse prédio por terem feito parte do esquema de
Vaccari, mas também os outros três triplex desse prédio e mais
três apartamentos menores, possivelmente vinculados diretamente a
Vaccari, a seus familiares e a demais dirigentes petistas. Quando a
Bancoop faliu, o esquema corrupto de Vaccari com o PT envolvendo o
apartamento triplex foi transferido para o esquema corrupto da OAS
com o PT, envolvendo a propina multimilionária do partido com as
refinarias de Abreu e Lima e Getúlio Vargas. O dinheiro do
apartamento foi abatido da conta de propina multimilionária que o PT
tinha com a OAS.
Retornemos
às reformas no triplex, que comprovam ainda mais a acusação do
Ministério Público. São fartos os documentos que comprovam que a
OAS contratou empresas para fazer reforma personalizada (serviço
que, diga-se de passagem, a empreiteira nunca realizava). As reformas
eram bastante grandes e caras, no valor de mais de um milhão de
reais. Nos muitos documentos de mensagem de celular ou de e-mails
apreendidos, refere-se sempre à “Madame” (ou “Dama”) e ao
“Chefe”. A empresa Kitchens, contratada para a reforma da cozinha
do triplex, foi contratada no mesmo período para a reforma da
cozinha do sítio de Atibaia — para o qual, diga-se de passagem, há
provas ainda mais robustas de ocultamento de propriedade pelo casal
Lula e Marisa (todavia, o caso de Atibaia ainda não foi julgado por
Moro). Os executivos da OAS tratam, em suas conversas, das cozinhas
do Guarujá e de Atibaia ao mesmo tempo, como um só e mesmo assunto.
Além
disso, em um momento fica claro que “Madame” é Marisa Letícia.
É quando Fábio Gordilho, arquiteto e executivo da OAS, manda
mensagem de celular a Léo Pinheiro, em fevereiro de 2014, afirmando
que “o projeto da cozinha do chefe tá pronto, se marcar com a
Madame pode ser a hora que quiser”. A isso, pouco depois, Léo
Pinheiro responde: “O Fábio ligou desmarcando”. Isso foi na
época da visita de Lula e Marisa ao triplex. Além disso, mensagem
de Marcos Ramalho, executivo da OAS, a Léo Pinheiro, em 21/08/2014,
afirma: “Dr. Leo. Alterado para 10:30. Falei com Cláudia e agora
falei com Fábio (filho)”. Ora, quem poderia ser esse Fábio,
especificado diretamente como “filho” da “Madame”, tratado
tanto em fevereiro de 2014 quanto em agosto, senão Fábio Luis Lula
da Silva?
Além
disso, há reportagem do jornal O Globo de março de 2010, assinada
pela jornalista Tatiana Farah, intitulada “Caso Bancoop: triplex do
casal Lula está atrasado”. Essa reportagem é anterior a qualquer
investigação e trata apenas das pessoas prejudicadas pela falência
da Bancoop (entre elas o próprio Lula, então presidente).
Curiosamente, consta no texto o seguinte: “Procurada, a Presidência
confirmou que Lula continua proprietário do imóvel” (triplex). A
presidência da república jamais desmentiu essa reportagem.
Como
se vê até aqui, a peça acusatória e a sentença são amplamente
baseadas em provas documentais, e não apenas na delação de Leo
Pinheiro. Curiosamente, todos os depoimentos de Lula criaram
contradições com os documentos apreendidos, ao passo que todos os
depoimentos dos executivos da OAS (Léo Pinheiro incluso) confirmaram
todos os documentos apreendidos.
O
único depoimento realmente arrebatador
Ainda
que não interesse dar destaque a depoimentos (e sim às provas
documentais), deve-se chamar a atenção para um depoimento
específico, por seu alto grau de significação política. É o
depoimento do zelador do prédio do Guarujá. José Afonso, homem
bastante simples, antigo eleitor de Lula e apoiador do PT, disse que
esteve com Marisa Letícia na apresentação do prédio, depois de
pronto, e na apresentação do próprio apartamento; disse que ela
era tratada sempre como proprietária do imóvel (e não como
potencial adquirente); disse que todos no condomínio sabiam que o
apartamento era de Lula e que, inclusive, os corretores usavam isso
na propaganda, para atrair compradores para o empreendimento; disse
também que foi repreendido energicamente (quase ameaçado) por
executivos da OAS, após iniciadas as investigações em 2015, para
nunca falar que o triplex era de Lula, mas apenas da OAS.
José
Afonso, por ter dado depoimento confirmando tudo o que viu e
vivenciou, pagou alto preço: perdeu seu emprego e sua moradia,
caindo em situação de quase indigência. Prestando depoimento em
Curitiba, o zelador José Afonso, quando contrariado por Cristiano
Zanin Martins (advogado de Lula), perdeu o equilíbrio e se exaltou.
Em tom de quase choro e desespero, disse que “fui envolvido numa
situação que não tenho culpa nenhuma”. Em seguida, ainda mais
exaltado, falou para o advogado de Lula:
“Eu
perdi meu emprego, perdi a minha moradia, e aí você vem querer me
acusar, falar alguma coisa contra mim? Como é que você sustentaria
a sua família? Você nunca passou por isso! Quem é você para falar
alguma coisa contra mim? Vocês são um bando de lixo! Isso que vocês
são! O que vocês estão fazendo, fizeram com nosso país, isso é
coisa de lixo! E vocês defendendo esse lixo!”
O
drama do humilde José Afonso, desesperado diante da pressão dos
almofadinhas da defesa de Lula, é o símbolo máximo não apenas de
todo esse processo, mas de tudo o que significa historicamente o PT e
a pequena-burguesia que hoje “defende esse lixo”. Lembremos
apenas que não é a primeira vez que algo assim acontece: trata-se
da reedição, maior e mais grave, do caso do caseiro Francenildo, de
Brasília, que denunciou pagamentos de propina na mansão do petista
Antonio Palocci, em meio a festas com prostitutas. O caseiro teve o
sigilo bancário quebrado ilegalmente, graças à influência do PT
dentro da presidência da Caixa Econômica Federal. Nem uma prova
sequer, ou indício, puderam ser levantados contra Francenildo, que
teve a vida devassada. Todas as suas denúncias, pelo contrário,
comprovaram-se. Quantos não são os José Afonsos e Francenildos
traídos pelo PT?
O
artigo na íntegra:
Que
Lula mofe na prisão
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