quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Número crescente de concessões ao capital é a resposta do governo à crise

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OSVALDO COGGIOLA

QUARTA, 27 DE FEVEREIRO DE 2013


No início do ano pré-eleitoral (na verdade, já eleitoral) de 2013, todos os índices da economia brasileira apontam para a estagnação e o recuo. À queda, já anunciada, do PIB, veio somar-se agora o recuo industrial (o primeiro em uma década), o retrocesso do investimento por cinco trimestres consecutivos, o aumento do desemprego, que já afetava o setor industrial e agora se transmitiu para o setor comercial (sinalizando o fim do boom do consumo que foi a marca econômica e política do governo petista), o aumento da inflação (que teria superado 1% em dezembro passado, isto é, mais de 15% anual, se não mediasse a queda parcial das tarifas de energia - que irá reduzir em 28% o custo dos grandes consumidores e em 16% o dos pequenos e médios consumidores - e o adiamento dos reajustes de tarifa nos transportes), a queda do lucro bancário privado (- 5,3%) e o aumento (30% em média) das provisões contra calotes do setor financeiro, que lucrou R$ 27, 7 bilhões, com um total de... R$ 52 bilhões previstos para devedores duvidosos e inadimplentes. A Bolsa de Valores de São Paulo anunciou no início de 2012 que 45 companhias fariam ofertas públicas iniciais de cotização de ações (só três delas o fizeram). Em suma, um cenário de crise e recessão. O “remédio” do governo é a mesmice aumentada, ou mais e ainda mais do mesmo.

O setor de ponta da saúde pública brasileira, os hospitais universitários, por exemplo, estão sendo “assediados”, mediante “terrorismo social” (termos usados pelo procurador federal do Ministério Público do Trabalho) para ceder sua gestão ao setor privado mediante a Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares). O governo Dilma afrouxou todas as condições para a privatização (leilão) de 7500 quilômetros de rodovias, em nove lotes, aumentando de 6% para 14,6% a taxa de retorno garantido para as empresas participantes. Com esse presentão para o grande capital, pretende-se manter o programa de investimentos de R$ 250 bilhões em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Sem falar em que o governo está hipotecando todas as reservas do pré-sal, como já foi feito pelo governo Lula, que entregou uma grande parte do pré-sal para a empresa OGX (Eike Batista).

Com a renovação das concessões de geração, transmissão e distribuição de energia, o governo pretende hipotecar o patrimônio público para reduzir a tarifa média de energia. Uma vez vencidas as concessões, elas deveriam ser integradas ao patrimônio público. A MP (decreto) 579 é uma tentativa do governo para utilizar aproximadamente 22 mil megawatts de usinas hidrelétricas e 80 mil quilômetros de vias de transmissão para tentar fornecer essa energia só pelo custo de operação e manutenção e, com isso, tentar reduzir a média tarifária, que sempre beneficiou os maiores consumidores. O governo diminuiu a tarifa média, só que quem mais consome energia no Brasil é o grande capital (industrial, comercial, agrário, financeiro). Qualquer benefício linear beneficia só os mais ricos e deixa de fora 2,5 milhões de pessoas que ainda não têm acesso à energia. 1.500 consumidores consomem aproximadamente 28% de toda a eletricidade brasileira, e eles compram energia a um preço aviltado, porque pagam apenas 20% do custo da energia, de não menos de cem reais o megawatt-hora (MWh). Esses consumidores pagam cerca de R$ 20 por MWh. E os apagões são cada vez mais frequentes, pois, sem recursos, a manutenção é pífia.

O governo, além disso, criou uma fonte de recursos públicos para os bancos privados financiarem investimentos de médio e longo prazo, principalmente os destinados a bancar os programas de concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Os bancos privados deverão pagar ao governo pelo acesso aos recursos uma correção baseada na TJLP (taxa de juros de longo prazo), hoje de 5% ao ano, muito abaixo da taxa “de mercado”. O formato da medida “atende pedido dos bancos privados”, anunciou o governo. Na prática, ele está acabando com a intermediação do BNDES. O banco público recebia dinheiro do Tesouro e o repassava a bancos privados, cobrando uma taxa. Agora, os bancos terão acesso direto aos recursos. A nova fonte de água benta vai se somar aos R$ 15 bilhões de depósitos compulsórios que o BC já havia liberado para financiar investimentos. As instituições financeiras privadas poderão formar consórcios para ter acesso ao fundo de recursos públicos.

Os economistas “neoliberais” (tucanos ou não), escrachados durante uma década, celebram por isso aos brados a conversão do governo ao “credo (violento) do mercado”, na verdade o credo do subsídio público ao grande capital. “O governo saiu de seu labirinto”, anunciou o inefável economista tucano Mendonça de Barros, pois “passou a depender do capital privado para superar as limitações ao crescimento” (capital privado que, por sua vez, depende dos créditos públicos e do saque ao Estado mediante a especulação com títulos públicos). O governo federal já destinou dois terços dos recursos gastos em 2013 para juros e amortizações da dívida: apenas nos primeiros 35 dias de 2013 já foram gastos nada menos que R$ 145 bilhões com juros e amortizações da dívida, valor equivalente ao dobro dos recursos previstos para educação em todo o ano de 2013. Para 2013, estão previstos R$ 900 bilhões para a dívida pública, 20% a mais do que os R$ 753 bilhões gastos com a dívida no ano passado. Isto mostra que, apesar da propaganda oficial sobre a queda da taxa de juros, a dívida pública continua no centro da crise nacional. A parte do orçamento federal destinada para pagamento de juros e amortizações da dívida cresceu de 36,7% para 45,05%.

No Código Florestal, a expectativa do “veta tudo Dilma” não se concretizou, e o governo tem demonstrado que seu projeto não se restringe a uma ou outra área. Trata-se de um projeto global em favor do grande capital, adequando às formas de organização do Estado à crise. Aí se encaixa o projeto de Código Nacional de Ciência Tecnologia e Inovação, que teve a “contribuição” de fundações privadas de todo o país, há décadas empenhadas na privatização no interior das instituições públicas. Para pagar a dívida pública, houve nos dois últimos anos cortes no orçamento de 50 e 55 bilhões de reais, que, somente entre os anos 2010 e 2011, fizeram cair 16,2% o orçamento para ciência e tecnologia. Agora, para “remediar”, não só será permitida a transferência direta de recursos públicos para o setor privado, como se ampliará a possibilidade de as instituições públicas – as universidades, responsáveis por mais de 90% da produção científica do país – compartilharem seus laboratórios, equipamentos, materiais e instalações com empresas privadas, inclusive transnacionais. O Código permitirá ainda o acesso à biodiversidade pelos monopólios privados. Será permitido, sem autorização prévia, o acesso ao patrimônio genético e de conhecimento tradicional para fins de pesquisa. E também a extração do patrimônio para fins de produção e comercialização. Uma política de entrega nacional total.

A crise econômica não tem ainda reflexos políticos decisivos. Lula, finalmente, lançou a candidatura de Dilma Roussef à reeleição. As sondagens provisórias a situam em torno de 55% das intenções de voto, com pouco mais de 10% para o tucano Aécio Neves, e percentuais semelhantes para a oportunista Marina Silva (que está leiloando sua candidatura para alguma sigla ou coalizão; a ex-senadora e ministra foi recebida com gritos de “Brasil, urgente, Marina presidente” ao entrar em um teatro lotado na Vila Madalena) e para Eduardo Campos (PSB), até a data, no entanto, integrante da base aliada do governo. Ou seja, teríamos uma nova eleição plebiscitária, onde só estariam realmente em disputa alguns governos estaduais, São Paulo em primeiríssimo lugar (haveria cinco pré-candidaturas petistas, incluída a de Guido Mantega: a eleição de SP seria mais importante que a nacional...). As especulações eleitorais, a mais de um ano e meio de distância do pleito, vão com sede demais ao pote.

E não só por causa do cenário econômico de crise, nacional e internacional, mas também por causa da luta de classes, e da crise política. Uma plenária para organizar a luta pela negociação e contração coletiva no serviço público e em defesa do direito de greve no funcionalismo reuniu a 19 de fevereiro diversas entidades dos servidores públicos dos três entes federativos na Câmara dos Deputados. O evento contou com a presença de cerca de 600 participantes, das mais diversas categorias do serviço público. Teria sido melhor realizá-la num local sindical, num centro da luta de classes, mas algo foi feito. Os sindicatos portuários, vinculados à Força Sindical (que anunciou sua ruptura com o governo) e à Federação Portuária (CUT), por sua vez, anunciaram medidas de luta contra a privatização dos portos (que implicará em milhares de demissões). É claro que essas burocracias apenas ameaçam (para negociar alguma coisa), mas viram-se obrigados a abrir uma fresta por onde pode ser proposta e agitada uma política classista (não à privatização, garantia e estabilidade no emprego, reajustes salariais).

A crise do mensalão ainda não acabou, e vai marcar as composições eleitorais. Como disse candidamente Wladimir Pomar (ideólogo da “esquerda” do PT), o STF “aceitou a tese do mensalão, sem qualquer consistência objetiva, pois, se houvesse, teria que ter julgado a maior parte da Câmara dos Deputados”. Tal e qual. Genoíno e Zé Dirceu, para ele, “cometem um erro crasso ao pretenderem estabelecer uma relação das ações de repúdio aos procedimentos e às decisões do STF com o apoio e sustentação do governo da presidente Dilma, e com a luta pelas reformas política e tributária. E praticam um erro maior ainda ao pretenderem fazer com que o PT assuma, neste momento, como sua tarefa mais importante, a luta pela anulação das condenações. Esquecem que isto incluiria absolver também o escroque [Marcos Valério] que praticou inúmeros delitos comprováveis e colocar o PT no banco dos réus... Os filiados atingidos pela ação penal 470 não podem transformar sua situação numa síndrome partidária”. Xadrez para eles, portanto, para salvar o restante da Câmara dos Deputados e o PT, ou seja, a quadrilha toda.

A esquerda classista está metida no meio das mesquinhas especulações eleitorais, nas quais é só marginal. Uma política eleitoral classista, no entanto, só pode ser o resultado final (e secundário) de uma vigorosa política de frente única de classe para organizar as lutas em curso, e também as lutas potenciais (pelo salário, pelo emprego, pelo direito à organização) suscitadas pela crise do capital. Só assim a crise política dos “de cima” poderia ser aproveitada politicamente pelos “de baixo”. A primeira condição é superar o sectarismo autorreferente e autoproclamado com uma política de luta, de unidade e de independência de classe.


[*] Osvaldo Coggiola, historiador e economista, é professor do departamento de História da USP.


Extraído de:
http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=8134:manchete270213&catid=34:manchete

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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Belo Monte: Movimento Xingu Vivo sofre espionagem

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Este é apenas mais um capítulo da perseguição e da repressão aos movimentos sociais e de trabalhadores que têm marcado as grandes obras no Brasil.



Funcionário de Belo Monte é flagrado espionando Xingu Vivo para informar ABIN

Publicado em 25 de fevereiro de 2013

Na manhã deste domingo, 24, quando finalizava seu planejamento anual em Altamira (PA), o Movimento Xingu Vivo para Sempre detectou que um dos participantes, Antonio, recém integrado ao movimento, estava gravando a reunião com uma caneta espiã.

Na caneta, o advogado do Xingu Vivo, Marco Apolo Santana Leão, encontrou arquivos de falas da reunião, bem como áudios de Antonio sendo instruído sobre o uso do equipamento. Confrontado, ele a principio negou qualquer má intenção, mas logo depois procurou o advogado para confessar sua atividade de espião contratado pelo Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM), responsável pelas obras da usina, para levantar informações sobre lideranças e atividades do Xingu vivo.

De livre e espontânea vontade,Antonio se dispôs a relatar os fatos em depoimento gravado em vídeo. Segundo ele, depois de ser demitido pelo CCBM em meados do segundo semestre de 2012, ele foi readmitido em outubro como vigilante, recebendo a proposta de trabalhar como agente infiltrado, primeiramente nos canteiros de obra para detectar lideranças operárias que poderiam organizar greves.

Em dezembro, segundo o depoente, ele passou a espionar o Xingu Vivo, onde se infiltrou em função da amizade de sua família com a coordenadora do movimento, Antonia Melo. Neste período, acompanhou reuniões e monitorou participantes do movimento, enviando fotos e relatos para o funcionário do CCBM, Peter Tavares.

Foi Tavares que, segundo Antonio, lhe deu a caneta para gravar as discussões do planejamento do movimento Xingu Vivo. O espião também relatou que este material seria analisado pela inteligência da CCBM, e que, para isso, contaria com a participação da ABIN (Agencia Brasileira de Inteligência), que estaria mandando um agente para Altamira esta semana.

Após gravar este depoimento, Antonio pediu para falar com todos os participantes do encontro do Xingu Vivo, onde voltou a relatar suas atividades de espião, pedindo desculpas e prometendo ir a público para denunciar o Consórcio Construtor Belo Monte.

Em seguida, solicitou ao advogado e à jornalista do movimento que o acompanhassem até sua casa, onde queria acertar os detalhes da delação com a esposa. No local, ele se ofereceu e apresentou seus crachás do CCBM, bem como a carteira profissional onde consta a contratação pela empresa, que foram fotografados.

Posteriormente, porém, a esposa comunicou ao advogado do movimento que Antonio tinha mudado de ideia e que não se apresentaria no Ministério Público Federal, como combinado. Mais tarde, ainda enviou um torpedo ameaçador a um membro do Xingu Vivo. No texto, ele disse que “vocês me ameaçaram, fizeram eu entrar no carro, invadiram minha casa sem ordem judicial. Isso é que é crime. Vou processar todos do Xingu vivo. Minha filha menor e minha mulher são minhas testemunhas. Sofri danos morais e violência física. E vocês vão se arrepender do que fizeram comigo”.

Em função de sua desistência de cooperar e assumir seu crime, e principalmente em função da ameaça ao movimento, o Xingu Vivo tomou a decisão de divulgar o depoimento gravado em vídeo, inclusive como forma de proteção de seus membros.

Apesar da atitude criminosa de Antonio ao se infiltrar no movimento, e apesar de não eximi-lo de sua responsabilidade, o Movimento Xingu Vivo para Sempre entende que o maior criminoso neste caso é o Consórcio Construtor Belo Monte, que usou de seu poder coercitivo e financeiro para transformar um de seus funcionários em alcaguete.

Também denunciamos que este esquema é responsabilidade direta do governo federal, maior acionista de Belo Monte. Mais execrável, porém, é a colaboração de agentes da ABIN no ato de espionagem.

O Movimento Xingu Vivo para Sempre, violado em seus direitos constitucionais e em sua privacidade, acusa diretamente o governo e o Consórcio de Construção de Belo Monte (integrado pelas empresas: Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa, OAS, Queiroz Galvão, Contern, Galvão Engenharia, Cetenco, J. Malucelli e Serveng) por estes crimes, e exige do poder público que sejam tomadas as medidas cabíveis. É inadmissível que estas práticas ocorram em um estado democrático de direito. Exigimos justiça, já!

Veja aqui o depoimento de Antonio


Extraído de:

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domingo, 17 de fevereiro de 2013

Em 2013, a dívida já consumiu 67% de todos os gastos

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Auditoria Cidadã


Notícias diárias comentadas sobre a dívida – 7/2/2013 
O privilégio na destinação de recursos para a dívida pública em 2013 atinge cifras impressionantes. Enquanto os jornais noticiam a não votação do Orçamento para 2013, o governo federal já destinou dois terços dos recursos gastos em 2013 para juros e amortizações da dívida. Conforme mostra o Dividômetro da Auditoria Cidadã, apenas nos primeiros 35 dias de 2013 já foram gastos nada menos que R$ 145 bilhões com juros e amortizações da dívida, valor este equivalente ao dobro dos recursos federais previstos para educação em todo o ano de 2013.
Esse privilégio é amparado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias 2013, cujo artigo 50 (inciso I) prevê que “Se o Projeto de Lei Orçamentária de 2013 não for sancionado pelo Presidente da República até 31 de dezembro de 2012, a programação dele constante poderá ser executada para o atendimento de despesas com obrigações constitucionais ou legais da União relacionadas no Anexo V”. Neste Anexo V, na página 9, item 29, se encontra o “serviço da dívida”.
Para 2013, estão previstos R$ 900 bilhões para esta finalidade, ou seja, 20% a mais do que os R$ 753 bilhões gastos com a dívida no ano passado. Isto mostra que apesar das propagandas oficiais acerca da queda da taxa de juros, o privilégio da dívida continua, e esta continua consumindo parcela cada vez mais relevante dos recursos públicos, consolidando-se como o centro dos problemas nacionais.
Extraído de:
http://www.auditoriacidada.org.br/em-2013-a-divida-ja-consumiu-67-de-todos-os-gastos/
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sábado, 16 de fevereiro de 2013

Aldeia Maracanã pega fogo: para índios o incêndio foi criminoso

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Por Anonymous Brasil


Depois da polêmica envolvendo o governo Estadual, indígenas e representantes da sociedade civil, soa no mínimo estranho o incêndio que atingiu uma oca na Aldeia Maracanã em pleno Carnaval – exatamente quando todas as atenções estão ligadas na folia. Para o observador da OAB, Rafael Gonçalves, há indícios de que o fogo foi criminoso.
Incêndio atingiu uma oca que fica no terreno da Aldeia Maracanã, na Avenida Radial Oeste, na madrugada desta sexta-feira. Ninguém se feriu. Segundo Rafael Gonçalves, observador social da OAB-RJ, que esteve na aldeia conversando com os índios, há indícios de ato criminoso. Peritos estiveram no local, e o laudo deve ficar pronto em até 15 dias.
“Alguém entrou aqui de madrugada e colocou fogo. A sorte é que, no momento, não havia ninguém dormindo na oca, nem crianças circulando. Orientamos o grupo a procurar a polícia e fazer um registro, para que o caso seja investigado”, afirmou Gonçalves.
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Quando as chamas começaram a se propagar, um grupo estava concentrado dentro do prédio — que chegou a ser alvo de disputa com o governo do Estado — cantando e dançando. Funcionários que trabalham na obra do Estádio do Maracanã ajudaram a apagar as chamas até a chegada do Corpo de Bombeiros.
Briga judicial
Os índios têm a favor deles seis liminares garantindo o direito de posse no museu. O governo do estado, que tentou por diversas vezes demolir o prédio, voltou atrás na decisão. No entanto, quer que o grupo deixe o local.
Nesta semana, o deputado estadual Luiz Paulo (PSDB) apresentou projeto de lei para transformar a a Aldeia Maracanã em Patrimônio Histórico e Cultural do Estado do Rio. O parlamentar alega que tomou essa decisão por entender que a aldeia reúne várias etnias indígenas.

Extraído de:
http://www.anonymousbrasil.com/aldeia-maracana-pega-fogo-para-indios-o-incendio-foi-criminoso/
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terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Liberdade para os operários do PAC presos no Amapá!

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Por resistir à brutal exploração, que tem sido a regra nas grandes obras do PAC, dezesseis trabalhadores foram presos no Amapá. 

Mais uma vez a legítima e necessária luta dos trabalhadores é criminalizada! [*]

Todo o apoio e solidariedade aos trabalhadores presos!

Lutar não é crime!


Dezesseis operários são presos em obras do PAC, no Amapá

11/02/2013

Fonte: Almir Brito, Amapá

Más condições de trabalho provocaram revolta nos operários da hidrelétrica Ferreira Gomes, no Amapá. A hidrelétrica iniciou sua construção com investimentos de R$ 1,32 bilhões, além da promessa de gerar 252 MW/h de potência.O praz de entrega é em dezembro de 2015.

As obras que mudam o curso do rio Araguari no município de Ferreira Gomes fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento 2 (PAC 2) e já foi palco de intensas lutas dos operários. No dia 3 de fevereiro, após a agressão de trabalhadores por seguranças na hora do jantar, os trabalhadores atearam fogo em pelo menos 12 alojamentos no canteiro da usina. Logo em seguida, o aparato do estado entrou em ação, prendendo cerca de 20 pessoas. A polícia ainda mantém 16 operários detidos. No dia 4 de fevereiro, parte dos trabalhadores foi transferida para uma penitenciária da capital amapaense.

A necessidade de se conter revoltas como estas e “corrigir” os revoltosos já levaram à prisão de operários em outros canteiros de obras, mas desta vez o cenário de horrores se aprofundam pela ofensiva da imprensa burguesa em criminalizar uma luta legítima.

O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil no Amapá (STICC), filiado à CUT, disputa a representação dos mais de 2 mil trabalhadores com um sindicato ligado à Força sindical. Enquanto isso, a situação de penúria e humilhação permanece nos canteiros de obra de Ferreira Gomes.

A CSP-Conlutas, vários sindicatos, ativistas do PSTU, PSOL e alguns parlamentares organizaram uma comissão em defesa da liberdade dos operários e contra a criminalização das lutas. Essa comissão visitará os trabalhadores, realizará atos pela imediata libertação deles e exigirá das autoridades que atendam as reivindicações trabalhistas pelas quais esses companheiros estão lutando.

Extraído de:
http://cspconlutas.org.br/2013/02/dezesseis-operarios-sao-presos-em-obras-do-pac-no-amapa/

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[*] Para saber sobre outras prisões de operários e as condições de trabalho nas grandes obras pelo país ler os seguintes artigos:

Operário torturado em Jirau, de novo preso e sujeito a julgamento (25/01/2013):
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2013/01/515895.shtml

Libertados os cinco operários presos ilegalmente (28/01/2013):
http://xingu-vivo.blogspot.com.br/2013/01/libertados-os-cinco-operarios-presos.html

Como no regime militar: PAC tem mortos, torturados, desaparecidos e presos políticos
http://anovademocracia.com.br/no-101/4435-como-no-regime-militar-pac-tem-mortos-torturados-desaparecidos-e-presos-politicos

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sábado, 9 de fevereiro de 2013

Eletricidade: um negócio rentável no Brasil

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A entrevista a seguir é elucidativa do que vem ocorrendo no setor elétrico brasileiro e tem o grande mérito de ultrapassar os discursos dominantes sobre o tema, colocando a nú o real caráter da redução das tarifas de energia recentemente anunciadas pelo Governo Dilma e os reais interesses que atende.


Eletricidade: um negócio rentável no Brasil

"Durante a campanha eleitoral, o PT assumiu o compromisso de promover mudanças com vistas a assegurar a 'atratividade' dos investimentos em toda a cadeia, no caso da indústria de eletricidade, sem abrir mão dos fundamentos executados pelo governo do PSDB", lamenta o engenheiro,
Dorival Gonçalves Júnior.

"As hidrelétricas no Brasil tornaram-se fábricas de produção de eletricidade, de risco de realização da receita nulo e elevada lucratividade". É a partir dessa crítica que o engenheiro Dorival Gonçalves Júnior aponta as medidas políticas dos últimos anos, que têm transformado o setor elétrico brasileiro em uma fonte rentável para investidores nacionais e internacionais, e "a eletricidade em mercadoria internacional". "Vender eletricidade produzida em base hidráulica, ao preço da produção térmica, transformou esta cadeia produtiva em fonte de elevada lucratividade e de intensa disputa de muitos setores capitalistas", diz à IHU On-Line, em entrevista concedida por e-mail. E esclarece: "Desde 2004, com a lei 10.848, os novos empreendimentos hidrelétricos são licitados pelo Estado Brasileiro em leilões. Ganham o direito de construir e explorar economicamente o recurso hidráulico o consórcio de empreendedores que se dispõe a construir e vender no mínimo 70% da energia produzida, ao menor preço em reais por cada 1.000 KWh (R$/MWh) para as empresas distribuidoras. Estas últimas são as empresas que vendem eletricidade para a quase totalidade da população brasileira (consumidores residenciais, comerciais, médias e pequenas indústrias, correspondem por volta de 75% do consumo nacional)".

Para ele, a aprovação da lei 12.783, consequência da MP 579, "é a continuidade de uma política que busca dar competitividade aos capitalistas que optarem por instalar seus negócios no Brasil". Gonçalves Júnior também questiona a redução de 18% da conta de luz, porque não atende à proposta das classes trabalhadoras. Para ele, o anúncio de diminuição das tarifas tem "um forte apelo ideológico para as massas trabalhadoras de que o governo está trabalhando pelas causas populares ao diminuir o custo da tarifa das residências dos trabalhadores e na manutenção/criação de empregos. Por outro lado, todos os capitalistas sabem que a diminuição das tarifas para os trabalhadores – se ocorrer – significa a diminuição do custo de reprodução da força de trabalho, logo está se criando mais um espaço para a expansão do lucro".

Dorival Gonçalves Júnior é Engenheiro Eletricista, especialista em Sistemas de Potência, pela Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT, e em Pequenas Centrais Hidrelétricas – PCHs, pela Unifei-MG, mestre e doutor em Engenharia pela Universidade de São Paulo – USP. Atualmente leciona na UFMT.

IHU On-Line - Como avalia a Lei 12.783, oriunda da MP 579, sobre a renovação das concessões do setor elétrico?

Dorival Gonçalves Júnior - Antes de lhe responder preciso deixar claro que a minha avaliação é feita segundo a perspectiva da classe trabalhadora. Assim, a MP 579, agora Lei 12.783, é uma iniciativa do governo para tentar superar uma das contradições engendradas no interior da recente reforma industrial que aconteceu na cadeia produtiva de eletricidade. Estou falando dos elevados preços da eletricidade que atinge diretamente a classe trabalhadora, parcelas significativas da burguesia industrial e comercial brasileira. O processo de mudança patrimonial e política iniciado em meados de 1990, com a finalidade de resgatar o controle da exploração do trabalho através do processo de privatização e, consequentemente, o aumento da exploração dos trabalhadores através da demissão e intensificação do trabalho, concomitante à institucionalização da eletricidade como mercadoria com o seu preço internacionalizado, entre outras medidas tomadas, não tinham assegurado até o início dos anos 2000 a "atratividade" para os investimentos na geração. Isto acabou colaborando para o racionamento entre junho de 2001 e fevereiro de 2002. O governo do PSDB, que capitaneava este processo, apesar de ter estabelecido uma série de encaminhamentos, que mesmo sob o racionamento, garantiu a continuidade dos lucros, acabou perdendo credibilidade. Este evento associado a outros, permitiram ao PT credenciar-se para substituir o governo do PSDB.

Compra de eletricidade

Durante a campanha eleitoral, o PT assumiu o compromisso de promover mudanças com vistas a assegurar a "atratividade" dos investimentos em toda a cadeia, no caso da indústria de eletricidade, sem abrir mão dos fundamentos executados pelo governo do PSDB. Isto é, manter a indústria de eletricidade organizada pelos "sinais de preços". O PT eleito, após mais de um ano em discussão com todos os setores da burguesia industrial, comercial, e financeira interessada na cadeia produtiva de eletricidade, institucionalizou, em março de 2004, as leis 10.847 (criação da EPE) e 10.848 (comercialização da energia elétrica). Estas leis consolidaram um conjunto de medidas que solidificaram a elevada lucratividade da indústria em toda a cadeia e, além disso, reduziram os riscos dos investidores na geração, ao ancorar os novos empreendimentos com contratos de longo prazo, na conta de eletricidade dos consumidores do "mercado regulado". A partir de então, a venda da eletricidade é feita em dois ambientes. O primeiro é o ambiente de contratação regulada, onde a eletricidade tem a tarifa definida pela ANEEL através de uma metodologia que assegura o preço internacional para a eletricidade. É neste ambiente que os consumidores residenciais, comerciais, e médias/pequenas indústrias compram por volta de 70% da eletricidade vendida no país. O outro, é o ambiente livre, onde grandes consumidores compram sua energia diretamente dos geradores, e dependendo da maneira que estão ligados no sistema de transporte de eletricidade do país, pagam "pedágio" pela transmissão e/ou "pedágio" pela distribuição. Esta foi a forma que arquitetaram para garantir aos setores capitalistas uma forma de poder comprar sua eletricidade abaixo do preço internacional, especialmente, pela possibilidade de poder tirar partido da produção no período de chuvas.

Assim, neste quadro institucional, a segurança econômica dos projetos estava garantida para todos os agentes industriais, comerciais e financeiros participantes da cadeia. Fato que pode ser evidenciado no crescimento das instalações de produção. Entre 2004 e 2012 a potencia instalada no país saltou de 90 GW para 120 GW. Acrescenta-se ainda, as estes 120 GW, a existência 26,6 GW em construção. Em termos da expansão da indústria, destaca-se que os números da geração repercutem diretamente sobre a transmissão e a distribuição. Os inúmeros negócios na geração, na transmissão e na distribuição concomitante à venda da mercadoria eletricidade ao preço internacional, garantem a todos os participantes da cadeia, uma lucratividade inigualável no ramo, mundialmente.

Mas, a partir da crise econômica instaurada em 2009, começa a surgir do lado da demanda, um movimento dos consumidores industriais e comerciais que compram eletricidade no mercado regulado questionando os preços praticados no país. Estes, com o objetivo de resgatar a competitividade em seus negócios, articulados nas federações de comércio e indústria, passam a questionar os reajustes anuais e as revisões tarifárias concedidas pela ANEEL às empresas distribuidoras. No ano de 2011, estes setores ganham apoio dos consumidores eletrointensivos, tais como os setores de: alumínio, papel celulose, petroquímico e siderúrgico. Grupos como a Alcoa, a Gerdau, entre outros, em audiências com o executivo, passaram a ameaçar o fechamento de plantas de produção no Brasil. A permanência do quadro de crise econômica, associado ao peso da eletricidade, na bolsa dos trabalhadores, nos custos das atividades industriais, comerciais e serviços, em síntese, a densidade política destes interesses, obrigou o governo a encaminhar politicamente estas reivindicações.

Modelo mercantil

Contudo, como em 2004, o problema para o governo era como exercer uma ação política de controle - neste caso no preço - e simultaneamente afirmar que mantinha o modelo mercantil como forma de organizar a cadeia de eletricidade. No contexto do debate sobre a redução das tarifas, havia consenso entre todos os setores capitalista nas questões relacionadas à redução dos impostos e dos encargos setoriais. Todos os setores capitalistas e os trabalhadores organizados (MAB, sindicatos de eletricitários etc) tinham clareza do vencimento de concessões de empreendimentos – maioria de propriedade de empresas estatais – na geração e transmissão, já amortizados. Sobre esta questão, os setores capitalistas interessados na redução das tarifas advogavam a privatização através de licitação e com suas tarifas reduzidas por se tratar de empreendimentos amortizados. Já os setores capitalistas da indústria de eletricidade (geração, transmissão, distribuição), a questão não estava em renovar ou licitar as concessões. Para estes, a definição pelo estado dos preços da eletricidade dos empreendimentos amortizados, sinaliza uma intervenção direta na definição dos preços em toda cadeia produtiva da eletricidade.

Neste tema, os trabalhadores defendiam a renovação das concessões dos empreendimentos sob o comando das estatais e propunham que a venda da eletricidade dos empreendimentos amortizados, fosse destinada exclusivamente aos consumidores residenciais, como forma de reduzir acentuadamente as tarifas para este segmento de consumo. Além disso, os trabalhadores tinham pauta específica, em relação às condições de trabalho nas estatais. Então qual foi a saída arquitetada? Para compreender o encaminhamento dado, compete analisar o modus operandi do PT. O governo do PT tem, entre suas estratégias de poder, uma atuação política no Estado, no sentido de encaminhar medidas institucionais e econômicas com o objetivo de criar as condições para que interesses capitalistas nacionais/internacionais, tais como, os das cadeias produtivas ligadas: à mineração, energia, agronegócio, entre outras, sejam atraídas para instalar suas plantas de bens de produção, bens de consumo e bens de serviços no território nacional. Neste sentido, tirando partido da natureza privilegiada brasileira, que na ótica capitalista, esta natureza - combinada a tecnologias e à força de trabalho eficiente - é base de elevada produtividade do trabalho. Portanto, esta atuação política objetiva demonstrar às forças capitalistas que, ao realizarem os seus investimentos aqui, terão acesso a lucros superiores aos que obteriam em qualquer lugar do mundo. Esta política do governo do PT - de atração e expansão capitalista no Brasil - pode ser constatada:

1. Na busca incessante de reorganizar o Estado em novas bases institucionais onde o planejamento (criação das: Empresa de Planejamento Energético e Empresa de Planejamento e Logística) a regulamentação/fiscalização (fortalecimento das agências reguladoras: ANEEL; ANP; ANA etc) do Estado se realiza com princípios de mercado;

2. Na criação de políticas de controle do custo do crédito (redução de juros) e financiamento da produção e consumo ancoradas nos bancos estatais (Caixa; BB e BNDES);

3. No emprego das estatais como empresas que alavancam o desenvolvimento de cadeias produtivas (caso do papel da Petrobras para o desenvolvimento de polos petroquímicos, do agronegócio na produção de etanol e biodiesel e da ELETROBRAS nos consórcios de construção das grandes hidrelétricas e linhas de transmissão, são alguns exemplos deste apoio.) assegurando às empresas capitalistas os estágios de negócios mais lucrativos na cadeia de produção; e

4. Na expansão da oferta, através do Estado e da iniciativa privada, de uma rede de cursos de formação e especialização da força de trabalho (aumento massivo do número de vagas para a classe trabalhadora em escolas técnicas, universidades públicas e privadas) com vistas a aumentar a produtividade do trabalho dos trabalhadores brasileiros.

Projeto político do PT

Assim, o governo do PT, orientado por seu projeto político, supõe que, por um lado, atende a maioria dos segmentos capitalistas (nacional e internacional) que, atraídos por este cenário de oportunidades aos lucros extraordinários, veem no PT o partido político da ordem e defendem sua permanência no poder e, por outro lado, também tem apoio dos trabalhadores, pois mantido as políticas de aperfeiçoamento da produtividade da força de trabalho concomitante ao ambiente de crescimento econômico, independente das taxas de exploração do trabalho, grandes contingentes de trabalhadores são incorporados em processos produtivos. Isto aparenta aos trabalhadores a existência de melhores condições de trabalho, quando cotejadas as que existiam no passado recente.

Competitividade

Então, recuperando a entrevista da Dilma no final de 2012, para o governo, este ano é "o ano da competitividade ...". Portanto, a MP 579 (lei 12.783) é a continuidade de uma política que busca dar competitividade aos capitalistas que optarem por instalar seus negócios no Brasil. Esta norma atende a expressivos setores capitalistas. Isto pode ser verificado nas medidas políticas contidas na MP. A extinção da Reserva Global de Reversão - RGR e a redução da Cota de Consumo de Combustíveis - CCC Cota de Consumo de Combustíveis e da Cota de Desenvolvimento Energético - CDE atende sem distinção a todos os setores capitalistas, sejam os da cadeia produtiva de eletricidade, sejam os que têm a eletricidade como um insumo em seus negócios. A renovação das concessões dos empreendimentos amortizados permite a diminuição das tarifas que varia entre 16% (para os consumidores residenciais) e 28% (consumidores industriais) no ambiente de contratação regulada.

Assim, apesar de não atender a parcela organizada dos trabalhadores (MAB e sindicatos de eletricitários, entre outros), tem no anúncio de diminuição das tarifas um forte apelo ideológico para as massas trabalhadoras de que o governo está trabalhando pelas causas populares ao diminuir o custo da tarifa das residências dos trabalhadores e na manutenção/criação de empregos. Por outro lado, todos os capitalistas sabem que a diminuição das tarifas para os trabalhadores – se ocorrer – significa a diminuição do custo de reprodução da força de trabalho, logo está se criando mais um espaço para a expansão do lucro.

Interesses capitalistas

Embora, o governo tenha feito um enorme esforço para não desagradar aos interesses capitalistas da cadeia produtiva de eletricidade, bancando os custos econômicos decorrentes da diminuição das tarifas nas empresas estatais, isto não impediu o descontentamento do setor que viu nesta MP, uma ação intervencionista de Estado e limitadora do mercado.

Este cenário oportunizou ao PSDB, que vem de sucessivas derrotas políticas, a tentar se credenciar de novo como o partido político que melhor representa os interesses capitalistas. Por isso tomou a decisão política de não aceitar a renovação das concessões dos empreendimentos das empresas estatais (CEMIG, COPEL e CESP) nos estados (Minas Gerais, Paraná, São Paulo) em que este partido detém o poder. Então, a MP 579 (lei 12.783) expressa o resultado momentâneo desta disputa política e econômica intercapitalista. A forma como a mídia tem "criado" um estado de elevado risco de operação e desabastecimento da eletricidade no país é prova de que a disputa continua. E esta reação contrária à lei 12.783 tende a aumentar à medida que for se aproximando o período de renovação das concessões dos empreendimentos amortizados, que estão sob controle das empresas privadas. No capitalismo, não existe empresa que reduz o preço de suas mercadorias porque os seus meios de produção já estão amortizados. Pois, o trabalho dos trabalhadores em instalações, máquinas e equipamentos amortizados são fontes de lucros extraordinários que os capitalistas não abrem mão.

IHU On-Line - Qual a implicação de construir hidrelétricas nos rios do Pantanal?

Dorival Gonçalves Júnior - Para falar em hidrelétricas no Pantanal, antecede caracterizá-lo em termos de suas principais peculiaridades físicas e bióticas. Limitando-se ao Pantanal no território brasileiro, o Pantanal mato-grossense localiza-se nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, numa extensa planície banhada pela bacia do Alto Paraguai. Nas bordas da planície se estende uma estreita região de Planalto, divisora de águas das principais bacias brasileiras. No noroeste e norte de Mato Grosso, próximo ao divisor de águas do Pantanal com a bacia Amazônica, região que nasce o rio Paraguai, destacam-se os rios: Jauru, Cabaçal e Sepotuba. Na região norte, nordeste e leste de Mato Grosso, próximo ao divisor de águas do Pantanal com a bacia Amazônica e bacia do Tocantins está situada a bacia do rio Cuiabá, principal afluente do rio Paraguai na bacia do Pantanal. O rio Cuiabá se destaca pela dimensão de sua bacia de drenagem bem como pelos seus afluentes, como: o rio Manso; o São Lourenço e o rio Correntes. Outro rio afluente do rio Paraguai que se destaca é o rio Taquari, com sua bacia localizada no leste de Mato Grosso do Sul.

Na região do Pantanal, a pluviometria média anual está em torno de 1.250 milímetros. O modo como ocorre o período seco e de chuvas acaba determinando o regime das águas na região que marcam as estações do Pantanal. Por isso, os habitantes nativos costumam dividir as estações no Pantanal em: "enchente" de outubro a setembro; a "cheia" de janeiro a março; a "vazante" de abril a maio; e a "seca" de junho a setembro. Os rios na região de planície são dotados de muitos meandros e canais que interligamos rios e as lagoas, constituindo grandes áreas de inundação nos períodos de cheias. É esta característica particular, como diz a pesquisadora da Embrapa Débora Calheiros, o "pulso das águas do Pantanal", durante o período de cheias que faz os rios atingirem cotas suficientes para alimentar lagoas e as extensas áreas de alagamento, as quais determinam habitat especial responsável por uma rica e particular fauna e flora no pantanal mato-grossense.

Impactos das hidrelétricas

Com estas considerações iniciais sobre o Pantanal é possível avaliar os impactos da construção de hidrelétricas nos rios do Pantanal. As hidrelétricas construídas estão localizadas na região de planalto da bacia de drenagem do Pantanal. A quase totalidade dos empreendimentos são usinas hidrelétricas a fio d'água e apenas uma delas é de reservatório de acumulação. Cabe destacar que as hidrelétricas a fio d'água são aquelas que a vazão afluente é igual à vazão de fluente. Isto é, a água que chega a montante das instalações da hidrelétrica, independente do volume, é lançada à jusante da instalação. Daí decorre o argumento de que este tipo de empreendimento causa baixo impacto, pois, segundo os que assim argumentam, este tipo de instalação não altera o regime hidrológico do rio.

Esta argumentação, em geral se mostra falsa na realidade, especialmente, quando se trata das hidrelétricas construídas na bacia de drenagem do Pantanal. Um exemplo típico é o caso do rio Jauru, em Mato Grosso, afluente do rio Paraguai. Neste rio foram construídos seis empreendimentos sucessivos em uma extensão aproximadamente de 60 Km. De modo que, considerando as hidrelétricas instaladas da nascente para a foz, a água a jusante da primeira hidrelétrica está praticamente na cota da barragem da segunda hidrelétrica e assim sucessivamente até a sexta hidrelétrica. Constituindo uma cascata de seis barramentos sucessivos, que mesmo sendo todos empreendimentos a fio d'água,estes, proporcionaram um grande impacto direto ambiental e social no rio Jauru. Cerca de 60 km do curso do rio Jauru que eram - sem a construção das hidrelétricas -, dotados de pequenas cachoeiras combinadas às corredeiras foram transformados num conjunto de seis reservatórios sucessivos. Limitando a análise sobre o que ocorreu no curso original do rio Jauru, verifica-se que, por um lado, pôs fim a declividade natural do rio na extensão em que foram construídas as hidrelétricas atingindo diretamente as espécies de peixes migratórias e, por outro lado, os reservatórios individualmente - apesar de terem reduzida capacidade de armazenamento - por estarem dispostos de maneira sucessiva, possibilita ao conjunto de hidrelétricas uma capacidade de armazenamento na cascata que determina um novo regime hidrológico a jusante do complexo. O que mostra a fragilidade do argumento de que as hidrelétricas a fio d'água não alteram a vazão natural dos rios.

Efeitos

A dimensão dos impactos sociais e ambientais pode ser contatada na extinção do pescado e o desaparecimento da atividade dos pescadores do município de Porto Esperidião, em Mato Grosso, proporcionada pelas hidrelétricas construídas nestes últimos dez anos no rio Jauru. Situação muito semelhante a do rio Jauru -hidrelétricas construídas sucessivamente - já está parcialmente materializada nos rios: Juba - afluente do Sepotuba -; São Lourenço e afluentes; Correntes e afluentes; e o rio Itiquira, todos pertencentes à bacia do Pantanal. Mas, a condição de maior impacto ambiental e social, produzido diretamente por um empreendimento hidrelétrico localizado no Pantanal, é o caso da hidrelétrica Manso. Esta Hidrelétrica está localizada na foz do rio Casca com o rio Manso a cerca de 80 km da foz do Manso no rio Cuiabá. A hidrelétrica Manso é de reservatório de acumulação, cuja área de inundação se estende por mais de 43.000 hectares, seu reservatório tem uma capacidade de acumulação de volume útil de aproximadamente três bilhões de metros cúbicos. Os impactos diretos determinados por esta hidrelétrica são muitos.

Segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB, por volta de 1000 famílias foram diretamente impactadas pelo empreendimento. Outro grande impacto verificado pela construção de Manso está no novo regime hidrológico imposto ao longo do curso do rio Cuiabá, principalmente, no trecho compreendido entre a foz do rio Manso no rio Cuiabá até a foz do rio São Lourenço no Cuiabá. Pois, como o rio Manso é o maior contribuinte nesta extensão – extensão do rio Cuiabá contida na região denominada baixada Cuiabana – com a construção da hidrelétrica a vazão do rio Manso, e por sua vez a do rio Cuiabá, ficou praticamente regularizada. Explicando a regularização. Com a construção da hidrelétrica o rio Manso não apresenta mais o seu regime natural, pois no período de "cheia" a maior parte da água afluente a barragem fica armazenada no reservatório para ser utilizada no período de seca. O rio Manso, a jusante do local onde está a hidrelétrica, tinha vazões de mais de 1.200 metros cúbicos por segundo, hoje as vazões neste período não ultrapassam 350 metros cúbicos por segundo, e, no período de seca, as vazões chegavam a menos de 20 metros cúbicos por segundo estando agora – após a construção da hidrelétrica - em torno de 150 metros cúbicos por segundo.

Assim, com a regularização, o rio Manso que a jusante da barragem tinha durante o período de cheias vazões máximas superiores a 1.200 metros cúbicos por segundo e que durante a seca tinha vazões mínimas menores que 20 metros cúbicos por segundo passou, com a construção da hidrelétrica de Manso, a ter uma vazão que oscila entre o valor máximo e mínimo respectivamente de 350 e 150 metros cúbicos por segundo. Aqui, está a razão do grande impacto ambiental e social produzido pela hidrelétrica de Manso na região da baixada cuiabana. A construção da hidrelétrica alterou profundamente o regime hidrológico do rio Manso e do rio Cuiabá, especialmente, no trecho entre a localização da foz do rio Manso no rio Cuiabá e na foz do rio São Lourenço no rio Cuiabá. Ou seja, neste extenso curso do rio Cuiabá desapareceu o "pulso das águas", com gravíssimas consequências, principalmente, para as áreas de planícies. Pois, o rio Cuiabá sofre significativa influência da regularização do rio Manso proporcionado pela Hidrelétrica Manso, de modo que, as águas em seu leito já não atingem as cotas capazes de através dos canais que ligam o rio às lagoas alimentá-las nos períodos de cheias. Assim, nesta área – baixada Cuiabana – as estações: "enchente", "cheias", "vazante" e "seca" foram intensamente modificadas. Para registrar é suficiente constatar o fim da atividade pesqueira em inúmeras comunidades ribeirinhas que se estendiam desde a cidade de Nobres até a cidade de Barão de Melgaço em Mato Grosso. As secas registradas nas Lagoas Siá Mariana e Chacororé, após a construção da hidrelétrica de Manso, são o testemunho inequívoco dos impactos ambientais produzidos no meio físico, biótico e social na região.

IHU On-Line - De acordo com os pesquisadores que estudam o Pantanal, as hidrelétricas e PCHs instaladas ao longo do bioma utilizam 70% do potencial hidrelétrico da Bacia do Alto Paraguai. O que esse valor significa e representa considerando a peculiaridade do bioma?

Dorival Gonçalves Júnior - Atualmente, a potência instalada pelo conjunto das 37 hidrelétricas (Usinas Hidrelétricas - UHE's - são as instalações com potência instalada acima de 30 MW – e as PCH's– são as denominadas Pequenas Centrais Hidrelétricas cujas instalações tem potência instalada compreendida entre 1 MW e 30 MW –) existentes na bacia do Pantanal está em torno de 1.140 MW, que corresponde exatamente à potencia instalada na UHE de Machadinho, localizada no rio Pelotas na divisa de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Este valor equivale – hoje – acerca de 1,2% da potência instalada em PCH's e UHE's no Brasil. Mas, cabe destacar, que o parâmetro geralmente utilizado - potência instalada em usina hidrelétrica - não é uma noção que mostra a produtividade da hidrelétrica. Este indicador diz respeito apenas à quantidade que a instalação poderá produzir. O parâmetro que indica a produtividade de uma usina é a sua energia firme. De maneira simplificada, energia firme - de uma usina de produção de eletricidade - equivale à quantidade de potência elétrica média que a usina assegura durante o período de um ano.

Para exemplificar considere duas situações concretas. A primeira, a usina hidrelétrica de Manso, localizada no rio Manso na bacia do pantanal mato-grossense, que tem 210 MW de potência instalada e sua energia firme é de 92 MWmédios. A segunda, a usina hidrelétrica Serra do Facão, localizada no rio são Marcos – em Goiás – afluente do rio Paranaíba, com potência instalada de 210 MW, mas a sua energia firme é de 182 MWmédios. O que se procura mostrar aqui? Procura-se evidenciar que para compreender se uma usina hidrelétrica é produtiva é necessário saber a sua energia firme e não a sua potência instalada, como em geral, as propagandas para a viabilização de empreendimentos hidrelétricos fazem. Assim, pelo exemplo, as hidrelétricas de Manso e Serra do Facão, apesar de terem a mesma potência instalada – 210 MW –, Serra do Facão produz duas vezes mais eletricidade, em média por ano, do que a hidrelétrica de Manso. Então, utilizando a noção de energia firme verificamos a baixa produtividade média das hidrelétricas instaladas na bacia do pantanal, uma vez que, a produção na bacia não ultrapassa a 600 MWmédios. Este valor corresponde apenas a cerca de 1,1% da produção nacional, quando referenciado na produção hidrelétrica no Sistema Interligado Nacional em 2011.

Contudo, a irrelevância da produção das hidrelétricas do Pantanal não está materializada apenas no reduzido percentual de sua contribuição ao sistema interligado nacional, mas sim, no período que a sua produção é considerada significativa. As hidrelétricas localizadas na bacia do Pantanal operam todas interligadas ao Sistema Elétrico Nacional, e o período em que elas conseguem produzir maisé no período de maior pluviosidade na região Sudeste. E este período é exatamente quando existe excedente de eletricidade no sistema, pois as hidrelétricas do Sudeste, especialmente as da bacia do Paraná, estão "vertendo energia". Para esclarecer, energia vertida é a operação – na hidrelétrica – no período em que a vazão afluente possibilitaria a produção da potência instalada. Mas como as cargas (residenciais, industriais, comerciais etc) não demandam esta capacidade de energia que a usina pode produzir e como o seu reservatório não tem capacidade de armazenamento para reservá-la para o período de baixa afluência, os operadores da hidrelétrica se veem obrigados a descartar parte da vazão afluente através dos vertedouros e não a direcionando aos grupos turbo-geradores, que produzem eletricidade. Esta operação – vazão lançada aos vertedouros - é denominada na usina hidrelétrica de energia vertida.

Para ter a dimensão do quanto de energia é vertida nas hidrelétricas localizadas no Sudeste brasileiro, basta utilizar apenas os dados da hidrelétrica de Itaipu. Nesta, a média anual de energia vertida nos últimos seis anos (2006 a 2011), é maior que toda a energia que pode ser gerada pelo potencial hidráulico (construídas e levantadas) da bacia do pantanal. Assim, se nos referenciarmos: nas características de baixa produtividade das hidrelétricas do Pantanal; na insignificante contribuição que as hidrelétricas do Pantanal podem dar ao sistema interligado nacional; e, principalmente, nos impactos que estes empreendimentos estão provocando na bacia do Pantanal, não existem argumentos para dar continuidade à implantação de empreendimentos hidrelétricos no pantanal mato-grossense.

IHU On-Line - Quais são os interesses econômicos e políticos que tentam viabilizar a construção de novas hidrelétricas e PCHs no Pantanal?

Dorival Gonçalves Júnior - Para responder esta pergunta, exige recuperar alguns aspectos marcantes, relacionados ao processo de reforma na indústria de eletricidade brasileira. A crise de reprodução do capital na indústria de infraestrutura estatal nos anos 1980/90 – aqui, falo especialmente da indústria de eletricidade brasileira – resultante das políticas de utilização das empresas estatais pelas forças econômicas acabaram esgotando o modelo de estatal de produção de eletricidade. Isto impôs aos setores capitalistas ligados à cadeia de produção da eletricidade uma atuação política no sentido reorganizá-la em novas bases, com vistas a recuperar a acumulação de capital.

Neste sentido, controlar diretamente todo o processo produtivo com vistas a resgatar a lucratividade, requeria a transferência do patrimônio estatal para o controle direto do capital. Por isso, o encaminhamento do processo de privatização das empresas elétricas e a organização das empresas estatais em bases de gestão privada. Outra medida política fundamental neste contexto foi a transformação da eletricidade em mercadoria internacional. Isto é, a eletricidade no Brasil, por ser predominantemente produzida a partir de recursos hidráulicos, tinha no período estatal – em acordo com os mais diversos interesses capitalistas – os seus preços vinculados aos custos da cadeia produtiva hidráulica. Isto fazia da tarifa de eletricidade brasileira, na época da produção sob a gestão do Estado, uma das mais baratas mundialmente. Então, outra medida central para resolver a crise de reprodução do capital era à institucionalização da mercadoria eletricidade ao preço de mercado, isto é, ao preço internacional. E, em 1994, o governo da época institucionalizou o preço da eletricidade brasileira, vinculando-a ao custo da cadeia produtiva térmica. Isto elevou as tarifas de eletricidade no Brasil ao dobro do que se pagava no período estatal. Vale lembrar que isto foi feito no exato momento em que se implantava no país um plano econômico – Plano Real – que reduziu praticamente à zero a inflação, fato que, permitiu obscurecer a manobra de exploração realizada.

Venda de energia

Vender eletricidade produzida em base hidráulica, ao preço da produção térmica, transformou esta cadeia produtiva em fonte de elevada lucratividade e de intensa disputa de muitos setores capitalistas. Desde então, os segmentos capitalistas ligados à indústria de eletricidade, organizados segundo os seus interesses específicos e gerais, atuam em várias frentes, sobretudo, no interior do estado brasileiro, procurando institucionalizar e regulamentar uma cadeia industrial para a eletricidade, aglutinada em negócios de baixo risco e fonte de lucros inigualáveis neste ramo da produção no mundo.

Na atualidade, são quatro os segmentos de negócio: geração, transmissão, distribuição e comercialização. Desde 2004, com a lei 10.848, os novos empreendimentos hidrelétricos são licitados pelo Estado Brasileiro em leilões. Ganham o direito de construir e explorar economicamente o recurso hidráulico o consórcio de empreendedores que se dispõe a construir e vender no mínimo 70% da energia produzida, ao menor preço em reais por cada 1.000 KWh (R$/MWh) para as empresas distribuidoras. Estas últimas são as empresas que vendem eletricidade para a quase totalidade da população brasileira (consumidores residenciais, comerciais, médias e pequenas indústrias, correspondem por volta de 75% do consumo nacional). Aqui, é importante destacar que, quem ganha o leilão, conquista o direito de explorar economicamente o recurso hidráulico licitado por trinta e cinco anos. Em geral, cinco anos para construir o empreendimento e trinta para explorar economicamente sem riscos, pois, no leilão o grupo empreendedor conquista um contrato de venda de pelo menos 70% de sua produção para as empresas distribuidoras por trinta anos. Por isso, as hidrelétricas no Brasil tornaram-se fábricas de produção de eletricidade, de risco de realização da receita nulo e elevada lucratividade. Risco de realização de receita nulo, porque o grupo que ganha o leilão, já tem assegurado antes de construí-la, a venda de sua produção durante 30 anos com os contratos assinados e endossados pelo estado brasileiro com as empresas distribuidoras, que são obrigadas a comprar a sua energia nestes leilões. Elevada lucratividade, pois de um modo geral, estes empreendimentos tem sido conquistados, referenciados no custo de produção térmica.

Hidrelétricas no Pantanal

No caso das hidrelétricas construídas na bacia do Pantanal, estas têm contratos de venda a preços que se constituem um verdadeiro assalto ao bolso dos trabalhadores brasileiros. Pois, a maioria dos empreendimentos foi construída tirando partido de formas contratuais carregadas de benesses proporcionadas pelo Estado, a exemplo do PROINFA. Este programa instituído em 2004, no bojo do clima do pós-racionamento 2001-02, em nome de aumentar a produção de eletricidade através de fontes alternativas (pequenas centrais hidrelétricas, biomassa e eólica) o Ministério de Minas Energia elaborou um programa definindo o valor econômico de cada fonte de eletricidade e incumbiu a ELETROBRAS de celebrar contratos de compra de eletricidade por 20 anos, com os candidatos à produção, com preços por MWhanálogos ao custo das térmicas. Oito PCH's construídas na bacia do pantanal durante os anos 2000 têm contratos com o PROINFA. Este é caso das PCH's José Gelasio (26,6 MW) e Rondonópolis (23,7 MW), localizadas no município de Rondonópolis, em Mato Grosso, no ribeirão Ponte de Pedra, pertencente à bacia do rio São Lourenço. São empreendimentos que somam receita anual em torno 30 milhões de reais (para comprovar esta informação basta recorrer ao site da ANEEL no seguinte endereço eletrônico: http://www.aneel.gov.br/cedoc/areh20121385_2.pdf). Como os investimentos realizados não ultrapassaram a 100 milhões nos dois empreendimentos, estas PCH's - com contratos de 20 anos de venda de sua produção – tiveram os investimentos recuperados em pouco mais de três anos com a receita assegurada pelo PROINFA. Aqui, cabe a pergunta: Quem paga esta conta? Cabe destacar que os custos do PROINFA são rateados entre todas as classes de consumidores do Sistema Interligado Nacional e, evidentemente, quem paga é a classe trabalhadora, pois só com muita luta esta consegue transferir os custos de sua reprodução para a sua mercadoria - força de trabalho.

Até meados de 2010, todos os locais com potenciais para instalação de PCH's foram muito disputados como negócios de lucros garantidos. Atualmente, com a crise capitalista acentuada a partir de 2008, a indústria eólica mundial, com a suspensão de muitos contratos de venda de seus equipamentos, passou a disputar todos os mercados. O Brasil, considerada a organização institucional da indústria de eletricidade com a garantia do retorno ao capital investido, atraiu, em curto espaço de tempo, um grande número de montadoras de equipamentos eólicos. Estas, ao final de 2012, totalizavam no território nacional oito montadoras com uma capacidade de produção anual em torno de 3,9 GW. Estas empresas, associadas a outros grupos de interesse, passaram a participar dos leilões de novos empreendimentos, colocando os seus preços bem abaixo das Pequenas centrais hidrelétricas e das térmicas de biomassa. No último leilão de compra de eletricidade, ao final de 2012, as eólicas venderem eletricidade a menos de R$ 89,00/MWh, fato que, inviabilizou 22 projetos de PCH's e 10 projetos de térmicas a biomassa que participaram do leilão. Assim, momentaneamente, a concorrência intercapitalista está detendo a expansão de empreendimentos hidrelétricos na bacia do Pantanal.


Extraído de:
http://www.diarioliberdade.org/brasil/consumo-e-meio-natural/35264-eletricidade-um-neg%C3%B3cio-rent%C3%A1vel-no-brasil.html 

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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

A produção social da tragédia em Santa Maria

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A tragédia na boate Kiss, na cidade de Santa Maria, na madrugada de domingo (27/01), vitimizando mais de 230 pessoas (a esmagadora maioria jovens), repercutiu fortemente em todo o Brasil e até no mundo.

Como não poderia deixar de ser, as pessoas tem se perguntado, chocadas, sobre as causas e os responsáveis, mas só chegam nas consequências e as confundem com as causas.

No entanto, se não chegarmos nas causas reais, qualquer lei ou proposta será ineficaz, até porque, como veremos, há outras tragédias ocorrendo à nossa volta.


Uma tragédia social

É importante observar que a tragédia ocorrida na boate Kiss não pode ser nivelada a uma tragédia causada por um fenômeno da natureza como um tsunami, um terremoto, etc. Esses têm causas naturais e não sociais. Nesses casos só pode haver punição humana se sua ocorrência já era prevista por técnicos e de conhecimento das autoridades e nada foi feito para salvar as vidas das pessoas.

No caso da boate Kiss é notório os pedidos por punições, revisões legais, fortalecimento da fiscalização, etc. A ação ou omissão evidencia a mão humana na tragédia. Isso, por si só, já demonstra a diferença entre um tipo de tragédia e outro mas é insuficiente para a visualização das verdadeiras causas da tragédia - que são sociais.

Para identificarmos as causas sociais devemos começar olhando para o tipo de sociedade em que vivemos: a sociedade capitalista.

Nessa formação social o objetivo central é o lucro. Na internet alguns comentários do senso comum apontavam para essa característica mas obviamente a tratavam de forma moral. As relações sociais que fazem a roda girar nessa direção não podem ser percebidas pelo senso comum por estarem naturalizadas na prática social. Isso é trabalho para os cientistas sociais, mas infelizmente muitos deles têm vacilado em suas análises, esclarecendo pouco ou nada, ou até mesmo capitulando às teses do senso comum, conforme veremos mais adiante.

Na sociedade capitalista a forma mercadoria necessita se ampliar cada vez mais para acumulação e reprodução do sistema e para isso não poupa nem o lazer. O capital não se apropria apenas do tempo de trabalho mas busca o lucro também com o momento de ócio da juventude e dos trabalhadores.

Nesse contexto as regras sócio-econômicas que subordinam as empresas comuns também se aplicam às boates. Os custos de operação devem ser reduzidos e os lucros ampliados, caso contrário a falência será inevitável. Por isso a Kiss utilizava como isolante acústico um material altamente inflamável como a espuma, que de acordo com a perícia policial foi decisiva para a tragédia. [1] Há outros materiais isolantes mas são mais caros. A mesma lógica teria sido utilizada para a aquisição dos extintores de incêndio, que suspeita-se serem falsos. [2]

A atitude da boate não é um fato isolado. Em 2010, Vitor Noer, então presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre, declarou no programa de debates Conversas Cruzadas da TVCOM (emissora da RBS TV - filial da Rede Globo no Rio Grande do Sul) que era comum a utilização de produtos e materiais de baixa qualidade para reduzir os custos de produção e operação. [3]

A sociedade capitalista também reduz o espaço para se pensar humanamente no outro. Ou ele aparece como um concorrente a ser batido ou só é valorizado caso sua atuação seja funcional ao sistema. A psicóloga Valeska Rodrigues justifica a discriminação e exclusão de pessoas obesas do mercado de trabalho pelo fato delas apresentarem doenças:

"Os empresários não estão totalmente errados em deixar de contratar os obesos. Um obeso tem hipertensão, problemas de coluna e várias outras coisas. O empresário vai querer contratar um funcionário para viver faltando?" [4]

A lógica do lucro na sociedade capitalista é sagrada para a própria sobrevivência do sistema e tudo e todos que se coloquem como obstáculo a ela devem ser evitados, removidos e abolidos. Foi ela que prevaleceu na superlotação e principalmente quando os seguranças da boate Kiss, a pedido de seus patrões, bloquearam a saída da casa noturna para evitar que os frequentadores saíssem sem pagar.

Foram ainda encontrados problemas estruturais e legais na boate como alvará vencido e ausência de saídas de emergência. Essas questões nos remetem diretamente ao poder público, ou seja, ao Estado e a política.

O Estado é, conforme demonstraram Marx e Engels, um instrumento de dominação do setor dominante da sociedade sobre os setores dominados. Os regimes políticos, podem variar de forma, mas têm como essência trabalhar para garantir a manutenção e a reprodução do sistema - no nosso caso em particular, do sistema capitalista.

Nos marcos do capitalismo mesmo os regimes políticos que se dizem democráticos representam na prática as classes dominantes, ou seja, os capitalistas. A crescente percepção de que a maioria não é representada nos executivos e nos parlamentos tem contribuído decisivamente para o descrédito cada vez maior, em escala global, das democracias burguesas e suas instituições políticas.

Quando não estão diretamente atuando na política do Estado aplicando seus planos as classes dominantes compram os políticos, seja de forma legal (financiamento de campanha) ou ilegal (pagamento de propina) para assegurar os seus interesses seja com leis, empréstimos e até mesmo no relaxamento de fiscalizações e vistorias. Ou seja, além de transferir recursos públicos para os bancos e as grandes empresas - sucateando os serviços públicos e produzindo a sua "incompetência" - a "negligência" do Estado ainda pode ser comprada!

No caso particular de Santa Maria não é possível afirmar ainda se havia uma relação dos proprietários da boate com o poder público. Mas os fatos intrigam: como a boate tinha permissão para funcionar com os problemas estruturais que possuía? Como foi permitido o seu funcionamento com alvará vencido? E por que, a mesma prefeitura que fechou a boate do DCE, manteve a Kiss aberta? [5]

Atualmente, o prefeito de Santa Maria, Cézar Schirmer (PMDB), é investigado pelo Ministério Público por improbidade administrativa por ter prorrogado, em 2010, os contratos das empresas de transporte público da cidade em vez de abrir um processo licitatório. [6]


Antagonismo de classes e interesses

Procurei pela internet e encontrei pouquíssimos artigos de cientistas sociais sobre a tragédia em Santa Maria. E dos poucos que encontrei nenhum buscou consequentemente as raízes sociais para esclarecer o trágico evento, conforme eu já havia mencionado.

O artigo "Lições da tragédia de Santa Maria", de Valmor Bolan, doutor em Sociologia e presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento e Controle Social do Programa Universidade para Todos-Prouni (Conap/MEC), foi o único que encontrei que ia de certa forma nessa direção.

Bolan responsabiliza a "cultura da permissividade" e "do improviso":

"O que acontece é a cultura da permissividade que grassa hoje por toda a sociedade. Muitas vezes faz-se vista grossa, aqui e ali, e depois vem as consequências, com danos irreparáveis para a população. Pagam-se impostos e não há retorno devido dos serviços públicos. As empresas deveriam cumprir os pré-requisitos necessários para seus funcionamentos, mas muitos preferem fazer a lógica da esperteza. E logo vêm os resultados: acidentes fatais. Esta foi a mesma lógica que ocasionou o desabamento de um prédio, ano passado, no Rio de Janeiro, perto do Teatro Municipal. Um dos sobreviventes foi salvo porque entrou no elevador. Estas situações são diferentes dos casos de calamidades provocadas por desastres naturais, como no caso do tsunami no Japão. Os japoneses mesmo assim mostram que é possível estar prevenidos para minimizar os danos de tais ocorrências. Mas nós, que não temos problemas de terremotos, maremotos ou furacões, penalizamos a nossa população por descaso do cumprimento do mínimo das regras exigidas para o bom funcionamento dos empreendimentos e serviços. Mais uma vez fica comprovado que se nem em situações como estas, que requerem providências técnicas preventivas, imagine só se teríamos preparo para enfrentar - como os japoneses enfrentam - os furores da natureza.

Temos muito que aprender e mudar nossa forma de enfrentar os desafios do cotidiano. Chega de cultura do improviso. O Brasil está na hora de banir a mentalidade permissiva, pois com tal amadorismo, até quando continuaremos vitimando a nossa população? Que a tragédia de Santa Maria sirva de lição para que prevaleça o que Capistrano de Abreu pediu a todo brasileiro, ainda no século XIX, que tivéssemos uma única coisa: vergonha na cara." [7]

E quais seriam as causas da "permissividade" e do "improviso"? Fica o mistério para os menos informados. O mesmo mistério que o sociólogo lança em relação ao não retorno em serviços públicos dos impostos pagos pelos brasileiros. No segundo caso basta olhar para os orçamentos da União para desvendar o mistério, no primeiro para as relações sociais de forma mais ampla.

É verdade que há diferenças culturais entre os países e que estas influenciam nas relações sociais. Mas abordar as relações sociais apenas pelo prisma da cultura é vê-las de forma limitada e incompleta, ainda mais em uma formação social como a nossa, dominada pela forma mercadoria e dividida em classes.

A tese da cultura, utilizada de forma simplificadora, tem sido a preferida de um certo senso comum que se pensa esclarecido, e termina por produzir uma visão estigmatizada de determinados povos, indivíduos, grupos, etc e divinizadora de outros.

Se olhasse para as relações sociais de forma ampla, Bolan veria que o cenário japonês não é tão luminoso quanto ele acredita. Por lá foram desviados bilhões de dólares destinados a reconstrução após a tragédia por ele referida.

Recentemente o Ministro das Finanças do país venerado por Bolan declarou que os idosos doentes deveriam se apressar em morrer para aliviar as contas do Estado. Esse mesmo Ministro despejou trilhões de ienes para as grandes empresas não quebrar quando ocupou o posto de Primeiro Ministro no período de 2008-2009. [8]

Embora o tipo de declaração como a proferida pelo Ministro japonês não seja comum, ela foi sinistramente sincera e jamais pode ser atribuída a uma mente perturbada, maluca ou insana. A lógica de sacrificar os extratos inferiores da sociedade para salvar o andar de cima tem sido a regra praticada em todos os países capitalistas, independente das diferenças culturais. Muda apenas a forma como os governos a anunciam aos seus povos.

Em uma sociedade dividida em classes como a nossa, cada classe social possui interesses próprios e antagônicos aos de outras classes, como já havia constatado o próprio homem da mão invisível do mercado:

"Quais são os salários comuns ou normais do trabalho? Isso depende do contrato normalmente feito entre as duas partes, cujos interesses, aliás, de forma alguma são os mesmos. Os trabalhadores desejam ganhar o máximo possível, os patrões pagar o mínimo possível. Os primeiros procuram associar-se entre si para levantar os salários do trabalho, os patrões fazem o mesmo para baixá-los." (Adam Smith. A Riqueza das Nações, Vol. 1, CAP. VIII - Os Salários do Trabalho)

Atualmente, com a crise financeira, as classes dominantes estão associadas para salvar-se e para isso necessitam sacrificar as classes populares mesmo que isso tenha representado instabilidade política, econômica e social. A vida humana acaba relegada para manter a lógica do lucro do andar de cima. Para isso até mesmo a novas guerras coloniais as classes dominantes têm apelado.


Mais do que punir o individual é preciso atacar o social

Os ajustes fiscais e as novas guerras coloniais têm arruinado e liquidado a vida de milhões de pessoas. São tragédias sociais do dia a dia, muitas vezes aceitas e justificadas "técnica", "científica" e até "humanitariamente".

Para nós que vivemos no Brasil são coisas que parecem distantes. Até nos esquecemos da lamentável ocupação do Haiti que o nosso país lidera (com fins e atuação nada humanitária) e dos cortes no orçamento praticados pelos nossos governos que retiram dinheiro da saúde e da educação para entregar aos especuladores.

A tragédia social originada de uma lógica que coloca o lucro acima da integridade humana está mais próxima de nós do que imaginamos. Vejam-se as remoções forçadas e por vezes brutais de comunidades inteiras como a do Pinheirinho no ano passado, onde milhares de pessoas foram jogadas na rua e viram o pouco que adquiriram na vida ser destruído impiedosamente. Vejam-se os sucessivos incêndios em favelas de interesse da especulação imobiliária [9]. Vejam-se as condições degradantes de trabalho que imperam nas grandes obras do país onde os operários sofrem repressão, perseguição, tortura e até prisão quando resolvem reagir à exploração absurda. Uma exploração que não raramente resulta em cadáveres.

As relações sociais que produzem todas essas tragédias são as mesmas que produziram a tragédia em Santa Maria.

Mas o sistema capitalista não pode abolir suas próprias contradições. Quando as consequências de algumas delas extrapolam os limites mínimos do aceitável e a pressão popular ganha envergadura, alguns indivíduos podem ser sacrificados para que a sua reprodução seja mantida.

Só que a reprodução de uma lógica que coloca o lucro acima da vida humana seguirá criando novas tragédias sociais se não for contida. As relações sociais não podem ser encarceradas mas podem ser mudadas. Ou as mudamos o quanto antes ou ainda derramaremos muitas lágrimas. Isso se as próximas vítimas não for nós mesmos.


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[1] Espuma do teto da boate foi a causa da morte das 236 pessoas, diz delegado (31/01/2013):
http://oglobo.globo.com/pais/espuma-do-teto-da-boate-foi-causa-da-morte-das-236-pessoas-diz-delegado-7457973

[2] Polícia vê indício de que boate Kiss usou extintores falsos (29/01/2013):
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/01/130129_extintores_boate_kiss_cq_cc.shtml

[3] O cliente tem sempre razão? (10/02/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com.br/2010/02/o-cliente-tem-sempre-razao.html
-->

Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre. RELATÓRIO DE ATIVIDADES E COBERTURA DE IMPRENSA FEVEREIRO 2010. Uffizi Consultoria em Comunicação.
http://www.uffizi.com.br/Documentos/documento571.pdf

[4] Políticos e sociedade (29/09/2012):
http://blogdomonjn.blogspot.com.br/2012/09/politicos-e-sociedade.html

[5] Prefeitura fechou Boate do DCE em Santa Maria dias antes de incêndio na Kiss (01/02/2013):
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-02-01/prefeitura-fechou-boate-do-dce-em-santa-maria-dias-antes-de-incendio-na-kiss

[6] ENTREVISTA COM O PROMOTOR ADEDE Y CASTRO (15/01/2011):
http://www.revistaovies.com/entrevistas/2011/01/entrevista-com-o-promotor-adede-y-castro/

[7] Lições da tragédia de Santa Maria (31/01/2013):
http://www.diariopopular.com.br/index.php?n_sistema=3051&id_noticia=MzIxMg==&id_area=NA==

[8] Ministro japonês defende a morte para idosos doentes (26/01/2013):
http://blogdomonjn.blogspot.com.br/2013/01/ministro-japones-defende-morte-para.html

[9] Mapa relaciona incêndios em favelas e especulação imobiliária (12/09/2012):
http://olhardigital.uol.com.br/jovem/digital_news/noticias/mapa-colaborativo-relaciona-incendios-em-favelas-e-especulacao-imobiliaria

Setor imobiliário financiou todos os vereadores da CPI dos Incêndios, em São Paulo; total chega a R$ 700 mil (05/10/2012):
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/10/05/vereadores-da-cpi-dos-incendios-em-favelas-de-sp-receberam-doacoes-de-construtoras-em-2008.htm

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