O governador Sartori
(PMDB) convocou os deputados estaduais para sessão extraordinária
no dia 28 de dezembro para apreciação de 31 projetos dos quais 27
foram aprovados - entre eles a extinção da Fundação de Esporte e
Lazer do Rio Grande do Sul (Fundergs), extinção ou privatização
da Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa) sem realização de
plebiscito como previa a Constituição Estadual e uma Lei de
“Responsabilidade” Fiscal Estadual que considera apenas os gastos
com os serviços públicos que atendem a população excluindo os
gastos com a dívida pública e as isenções fiscais. [1] Os outros
4 projetos restantes serão apreciados em 2016.
A sessão extraordinária
durou das 15h30 até às 04h06 [ibidem] garantindo um dinheirinho
extra nada modesto para os deputados enquanto os servidores têm seus
salários parcelados e precisam fazer empréstimo do próprio 13º
salário [2] se não quiserem esperar até o segundo semestre de 2016
para começar a receber o mesmo em 6 parcelas!
Não bastasse a covardia
de enviar uma série de projetos no final do ano, apostando na
distração popular, o governo Sartori mostrou todo o seu
autoritarismo ao sitiar mais uma vez a Assembleia Legislativa com
pelo menos 7 batalhões da Brigada Militar (incluindo o Batalhão de
Operações Especiais), em um total de 160 homens [3], e ainda
restringiu com parcas senhas a entrada no parlamento deixando as
galerias vazias.
O fato, que lembra
períodos obscuros da história política brasileira, evidencia a
essência das instituições do regime da democracia burguesa que não
vacila em adotar medidas repressivas para garantir a aprovação
daquilo que desejam as classes dominantes, reais representadas no
parlamento burguês. Nada é mais falso do que chamar esse antro de
“casa do povo”.
Aliás, nada mais
previsível do que o fechamento cada vez maior do regime político em
um momento em que as classes dominantes necessitam atacar, através
de suas instituições “democráticas”, os direitos da maioria do
povo. Tem sido assim na maioria dos países que aplicam o chamado
ajuste fiscal, por que seria diferente por aqui?
Parte integrante das
classes dominantes locais, o jornal Zero Hora de Porto Alegre, do
Grupo RBS (afiliada da Globo), celebrou os ataques do governo
Sartori:
“a maioria da
Assembleia Legislativa deu uma demonstração firme de compromisso
com a sociedade gaúcha como um todo ao aprovar as propostas do
governo Sartori (...)” [4]
Como sempre a burguesia
apresenta seus interesses de classe como universais de toda a
sociedade. Mas a farsa é insustentável, afinal como conciliar a
atuação comprometida de um parlamento com a “sociedade como um
todo” e esse mesmo parlamento ter que ser sitiado para se proteger
dessa mesma sociedade? A contradição não tarda a se revelar:
“Faz tempo que o Rio
Grande agoniza na UTI da negligência histórica, do corporativismo
egoísta e do desgoverno. Só sairá dessa crise com tratamento de
choque e remédios amargos, como a Lei de Responsabilidade Fiscal
Estadual, aprovada na madrugada desta terça-feira.” [ibidem]
Para o problema
estrutural do Estado “tratamento de choque” e “remédios
amargos” que obviamente não serão provados pela RBS mas pelos
servidores e pelas classes populares, ou seja, a maioria da
“sociedade como um todo” será penalizada para garantir os
privilégios da minoria de sempre. Depois um veículo de mídia
desses, que já celebrou a “liquidação” da dívida estadual no
governo Britto [5], reclama quando hostilizada pelo povo nas ruas
como nas jornadas de junho de 2013.
O papel das
burocracias sindicais
Em seus discursos a
burocracia sindical denunciava que Sartori havia escolhido o final do
ano para a sequência de ataques pelo fato da data favorecer a
distração popular e, principalmente, a desmobilização da
categoria, já que muitos estariam se preparando para as férias e
festas de final de ano.
É verdade que muitos
governantes aproveitam as datas festivas e de final de ano para
aprovar suas maldades. A própria Dilma fez isso no dia 29 de
dezembro de 2014 quando anunciou, em Medidas Provisórias (MP),
ataques ao seguro desemprego, abono salarial, auxílio doença,
pensão por morte e seguro defeso. [6]
Mas no caso do Rio Grande
do Sul, e tendo saído da boca dos burocratas, tal explicação é
não apenas incompleta mas na verdade trata-se de uma desculpa
esfarrapada que visa encobrir o papel nefasto desempenhado por esses
burocratas que não mobilizaram as categorias de servidores para o
dia 28 de dezembro – tendo por exemplo a direção do CPERS se
limitado a gravar um vídeo para o site e o Facebook – e ainda
destruíram o poderoso levante dos servidores quando, em agosto e
setembro, estes estavam mobilizados e evitando a aprovação das
medidas de ajustes do governo Sartori.
A burocracia sindical,
notadamente a CUT e a CTB, está mais preocupada com o compromisso de
defender Dilma do que representar a base de suas categorias. Se essas
centrais e seus dirigentes não mobilizaram os servidores estaduais
contra os últimos parcelamentos de salários e o calote no décimo
terceiro [7], por outro lado, foram para as ruas defender Dilma,
outro governo do ajuste fiscal, de um golpe imaginário. [8]
Enquanto isso o
verdadeiro golpe já havia sido pactuado, quando, no dia 30 de julho
de 2015 a Presidente Dilma se reuniu com todos os governadores,
inclusive Sartori, para acordar a defesa recíproca do ajuste fiscal:
“Conto
com vocês. Quero dizer, do fundo do coração, que vocês podem
contar comigo. Há muito que nós sabemos que o Brasil se passa nos
estados e nos municípios. Se nós não tivermos um projeto de
cooperação federativa, em que nos articulemos e façamos com que
ela dê frutos e resultados, não estaremos trilhando o bom caminho.
O bom caminho é aquele da cooperação.” [9]
As palavras que Dilma
dirigiu aos governadores deixou um recado claro: o meu ajuste depende
do de vocês, logo, precisamos nos ajudar.
A burocracia sindical
governista captou muito bem a mensagem. E, se já colaboravam
diretamente com medidas de ajustes (como a defesa da fórmula 85/95
para aposentadoria e flexibilização de direitos trabalhistas
mascarados de defesa dos empregos), passaram a atuar de forma mais
aberta para amortecer, estancar e derrotar as revoltas populares e
das bases das categorias de trabalhadores em greve. Por isso, a
direção do CPERS não teve o mínimo pudor de encerrar na marra a
greve dos trabalhadores em educação, apesar da maioria presente na
assembleia do dia 11 de setembro de 2015 optar pela continuidade da
greve.
O aprofundamento da crise
econômica aliado ao compromisso com a governabilidade do governo
federal escancara ainda mais o caráter governista e reacionário de
centrais como a CUT e a CTB que abandonam as suas bases para defender
o governo e tentam implodir as revoltas de suas categorias para não
prejudicar a aplicação do ajuste fiscal, seja de Dilma, seja de
governadores como Sartori.
2016 não será um ano
fácil. O governo Sartori já anunciou que não garante o pagamento
em dia dos salários [10] e ainda por cima vai buscar aplicar as
medidas aprovadas no final do ano e tentará aprovar novos projetos e
medidas de ajustes. Será necessário um novo levante da base dos
servidores estaduais e da população gaúcha que derrote a
burocracia sindical e os planos de Sartori. Ainda há tempo! Ainda é
possível!
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[1] Veja como ficou o
placar da votação dos projetos da sessão extraordinária da
Assembleia. 29/12/2015.
Confira
como os deputados votaram em projetos polêmicos aprovados na
Assembleia. 29/12/2015.
[2] Segundo Feltes, o
empréstimo e o juro são uma relação entre Banrisul e clientes.
16/12/2015.
[3] Mais de cem BMs
cercam Assembleia para impedir entrada de servidores durante a
sessão. 28/12/2015.
[4] Amargo, mas
necessário. 29/12/2015.
[5] “Rio Grande
liquida a dívida” era a manchete de capa do Jornal Zero Hora
em 21 de setembro de 1996. (Bloqueio de contas é regra do acordo da
dívida firmado pelo governo Britto. Marco Weissheimer. Publicado no
Portal Sul21 em 12/08/2015:
O
acordo da “liquidação” acabou por elevar em 122% a dívida
estadual como constatado ao final do governo Britto.
[6] Governo aperta o
cerco contra abusos na concessão de seguro-desemprego e outros
benefícios. 29/12/2014.
[7] A ação mais ousada
da direção do CPERS diante do calote do 13º salário foi a
publicação de uma “Moção de Repúdio” em 22 de dezembro de
2015.
[8] Direção do CPERS
participa do Dia Nacional de Luta. 16/12/2015.
[9] Dilma diz a
governadores que país passa por transição e o ‘bom caminho’ é
o da cooperação. 30/07/2015.
[10] Governo do Estado
não garante pagamento de salários em dia em 2016. 30/12/2015.
Leia também:
A crise do Rio Grande
do Sul e os seus responsáveis.
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