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A pesquisa Datafolha, que apontou o maior índice de aprovação do governo Bolsonaro desde o início do mandato, tem suscitado debates e avaliações. Entre boa parte dos ativistas de esquerda o sentimento é de angústia e perplexidade pois muitos esperavam o derretimento natural do governo com a pandemia.
Como não se faz política com impressionismo elencamos os principais pontos que vem sendo abordados nas análises e colocaremos a nossa visão para tentar contribuir com a compreensão desse paradoxo.
Moderação no discurso
Apontado nas análises de articulistas burgueses, como Reinaldo Azevedo. Após as prisões dos bolsonaristas em junho Bolsonaro moderou o discurso, realizou viagens pelo país e inaugurou obras.
Com os trajes do político tradicional proferiu menos discursos reacionários gerando menos polêmicas e assim dando menos munição para a oposição. Mas é evidente que tal comportamento é insuficiente para a elevação da aprovação popular no nível em que se deu.
Milícias digitais
A atuação nas redes sociais, como os disparos no WhatsApp, constituem um fenômeno novo e que merece estudo e atenção. Alguns, principalmente na esquerda, tem dado um peso significativo a esse aspecto nas suas análises já há algum tempo.
É verdade que a esquerda não tem explorado devidamente as plataformas digitais ao passo que o bolsonarismo chegou a contratar serviços profissionais. No entanto, isso não evitou a queda recorde de aprovação do governo em junho, tendência revertida nos meses seguintes quando o chamado “gabinete do ódio” já estava debilitado pelo inquérito do STF e pelas prisões de bolsonaristas.
Auxílio emergencial
É consenso em todas as análises que os R$ 600,00 do auxílio emergencial é o principal responsável pela reversão da reprovação do governo. Nisso os dados da pesquisa são contundentes: o aumento significativo da aprovação se deu entre os pobres, desempregados e informais – exatamente os setores mais beneficiados.
Bolsonaro terminou colhendo o que não plantou. Como queria sabotar a quarentena propos um auxílio de apenas R$ 200,00 em três parcelas. Quem elevou para R$ 600,00 foi o Congresso Nacional. A precária comunicação da oposição ajudou a maioria da população a creditar a Bolsonaro o feito até porque o dinheiro era sacado na Caixa Econômica , estatal do governo federal.
O fato é que Bolsonaro gostou da colheita e agora pretende avançar em uma espécie de “Síndrome de Estocolmo Econômica” onde destrói as conquistas estruturais da classe trabalhadora retirando direitos, jogando-a no desemprego e na informalidade, aprofundando a regressividade dos impostos e privatizando os serviços públicos ao mesmo tempo em que surge como o “amigo do povo” que socorre os necessitados através de programas como o pretendido Renda Brasil.
Trata-se de um populismo perverso e mesquinho mas que pode emplacar dada a enorme disparidade social e de renda no país fruto de uma política econômica que coloca a maioria da população em situação de vulnerabilidade e desespero. E, principalmente, pelo elemento que analisaremos a seguir.
A oposição
Vimos esse ponto em algumas poucas análises na esquerda. Consideramos que não é um elemento pequeno mas o mais importante pois em política os fatores objetivos precisam ser complementados pela atuação decisiva dos fatores sujetivos. Em suma, a objetividade da crise de qualquer governo só pode resultar em sua queda se a subjetividade das organizações políticas estiver preparada e direcionada para esse fim.
A direita política que se diz oposição ao governo já deixou claro nas palavras de Rodrigo Maia, do PSDB e até da Rede Globo que não deseja abrir um processo de impeachment e que está disposta a manter Bolsonaro até 2022. Apesar de vários crimes de responsabilidade não querem interromper a pauta de ajuste fiscal do Congresso Nacional com um impeachment que levaria meses.
As forças populares têm tido como prioridade a política de “frente ampla” eleitoral com Maia, PSDB, etc, e assim também ajudam a manter Bolsonaro no poder. Flávio Dino, do PCdoB, defende aliança até com o tucano Eduardo Leite, cujo governo no Rio Grande do Sul demite professor doente em plena licença de saúde.
Essas lideranças não apostam nas mobilizações sociais. Quando as torcidas antifascistas foram às ruas em junho, Ciro Gomes (PDT) criticou os atos e defendeu que em agosto ou setembro seria o momento de ir para as ruas. Já estamos em agosto e não se tem notícia de Ciro convocando protestos contra o governo. Lula está calado. CUT e CTB não mobilizam e atuam para desmontar greves nas categorias que dirigem, como recentemente ocorreu nos metroviários de São Paulo.
Não bastasse tudo isso há um movimento de “atravessar o Rubicão”. Na cidade de Belford Roxo/RJ o PT está fechando uma aliança com o prefeito bolsonarista. Em Viamão, cidade da região metropolitana de Porto Alegre/RS, PT e PDT fecharam um acordão com partidos de direita na eleição indireta da Câmara Municipal que alçou um bolsonarista ao poder em substituição do prefeito titular que morreu de Covid-19. Mas não só: o PT ainda indicou o Secretário da Educação. Assim, temos o primeiro governo formado pela aliança entre o PT e o bolsonarismo.
O que fazer?
A instabilidade social, econômica e política deverá seguir. O Brasil está entrando em recessão e a burguesia vai seguir querendo descarregar a conta da crise capitalista nas costas dos de baixo.
Como demonstrou a pandemia não dá para apostar no derretimento natural do governo até porque mesmo que isso ocorra não é suficiente para a queda do mesmo, vide Temer. É preciso organização e mobilização política para derrubá-lo.
Todos e todas que sabem que não é possível esperar 2022, que não aceitam conciliação nem com a velha direita e tampouco com o bolsonarismo, devem pressionar as lideranças populares no sentido de romper o imobilismo, o corpo mole e a colaboração com o inimigo. Caso sigam vacilando que se organize e se mobilize de forma independente como fizeram as torcidas e os entregadores.
A situação é grave e o reacionarismo bolsonarista e a radicalidade neoliberal não serão derrotados com “frente ampla” eleitoral mas com os métodos históricos de luta da classe trabalhadora: greves, atos e protestos. Mais do que nunca a rua precisa ser o nosso palanque.
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