fev 03, 2018 by CST-PSOL
Adolfo Santos & Diego Vitello – Dirigentes nacionais da
CST-PSOL
O julgamento do ex-presidente Lula tem enfiado amplos setores da
esquerda num verdadeiro labirinto. Prisioneiros da propaganda do
lulopetismo e seus aliados, estes grupos políticos se perdem em
justificativas, explicações, acusações e propostas estapafúrdias.
Nenhuma delas conduz ao caminho para superar uma direção que traiu
os interesses da classe trabalhadora, quando é imperioso construir
uma saída frente a uma das maiores crises política, econômica e
social da história recente do Brasil. Escrevemos este texto para
aportar ao debate apresentado pelo PT e pela maioria das correntes do
PSOL em defesa de Lula e contra sua condenação por fatos
relacionados com a corrupção.
Nestes dias assistimos fatos concretos que ajudam a compreender
melhor esta discussão. As mobilizações convocadas em apoio de Lula
demonstraram mais indiferença que interesse por parte da população
trabalhadora em relação ao processo do julgamento. Os atos do dia
23/01 em Porto Alegre e 24/01 em São Paulo, onde o PT, a CUT, a CTB
e o MTST jogaram toda a força de seus aparatos, não moveram nenhuma
parcela expressiva da classe trabalhadora, que não compactua com a
corrupção desenfreada deste regime em decomposição. No ato não
estiveram presentes os batalhões pesados do operariado com fortes
colunas de metalúrgicos, bancários, carteiros, petroleiros ou
trabalhadores do transporte. Pelo contrário, a maioria dos atos era
composta de militantes de organizações que se alinharam ao campo
lulista.
Felizmente, algumas organizações da esquerda, dirigentes políticos
e sindicais e principalmente importantes setores da base da classe
trabalhadora e também do próprio PSOL, de diferentes categorias e
da juventude, resistem à lógica do “mal menor” e às mais
diversas acusações, por não nos alinharmos com a defesa de Lula e
seu projeto. São muitas as opiniões que circulam em documentos,
jornais e nas redes que manifestam a rejeição a defender a
principal figura do PT das acusações de corrupção. Como parte
desses setores, que não aceitam livrar a cara dos que se integraram
a este regime podre, a CST publicou vários artigos, colocando
claramente que os crimes de corrupção devem ser investigados, os
culpados punidos e seus bens confiscados. Lula e a direção
histórica do PT são parte desses esquemas de propinas, desvios de
dinheiro público e enriquecimento ilícito. Por isso entendemos que
não é tarefa da esquerda consequente a defesa de Lula, nem de
outros tantos envolvidos em corrupção.
Pois disso se trata. O ex-presidente Lula não está sendo acusado
nem julgado por perseguição política, por apoiar a ocupação de
terras, por desapropriar prédios e entregar-los aos sem teto, por
romper com o sistema financeiro, por confiscar os bens dos
empresários que inflacionam os preços ou que sonegam impostos ou
por desobediência civil. Em qualquer caso de uma condenação
dessas, a CST estaria de forma incondicional na defesa de Lula ou de
qualquer outro. Mas infelizmente, não se trata disso. Lula, à
cabeça de seu partido, integrou-se ao regime burguês decadente que
governa nosso país. Seguiu os passos dos governos que o antecederam
e que sempre denunciamos, e integrou-se aos esquemas de corrupção.
“A opção de Lula e da cúpula petista de aderir ao projeto de
submissão imperialista, converteu as velhas lideranças de esquerda
em capachos do sistema financeiro, do agronegócio e das
multinacionais e levou inevitavelmente a utilizar os mesmos esquemas
e os mesmos métodos corruptos dos governos e regimes anteriores […]
O PT e a maioria de seus dirigentes e parlamentares financiaram suas
campanhas graças às contribuições de madeireiros, bicheiros,
multinacionais e banqueiros… Cabia-lhes, depois pagar a conta,
lembrando o velho ditado que diz: quem paga a banda, escolhe a
música”Do artigo: “Corrupção e neoliberalismo”, publicado
pelo mandato do deputado federal Babá, PSOL/RJ, em agosto de 2005.
Lula e o PT são parte do processo de corrupção sistêmica no
Brasil
É consenso entre a maioria das organizações de esquerda que no
Brasil existe um processo de corrupção sistêmica. Grosso modo, o
sistema político para os maiores partidos (PMDB, PT, PSDB, PP, etc.)
funciona assim: as grandes empresas, como é o caso da Odebrecht,
OAS, JBS, Itau e outras, financiam campanhas políticas milionárias,
de candidatos de diferentes legendas. Terminado o pleito, os
vencedores, através do executivo e do legislativo, passam a defender
os projetos de interesse dessas empresas, seja com projetos de lei,
concessão de obras e serviços públicos. As empreiteiras, umas das
que mais financiam as campanhas, são favorecidas com obras
superfaturadas, que lhes permitem altíssimos lucros e um generoso
excedente para destinar ao financiamento dos partidos e políticos de
forma individual. As obras da Copa 2014 e das Olimpíadas 2016 foram
uma verdadeira farra com o dinheiro público que beneficiou
empresários e políticos, Sérgio Cabral, que sempre foi aliado de
Lula, é o melhor exemplo disso. Se pesquisarmos o financiamento
eleitoral do PT, do PMDB, ou do PSDB, veremos que esses partidos e
seus dirigentes, se beneficiaram fartamente dos dinheiros das
empreiteiras. Os que defendem Lula, e portanto negam que esteja
envolvido nos esquemas de corrupção, entendem que o PT e seus
dirigentes não são parte da corrupção sistêmica em nosso país?
Além disso, sob pretexto da “governabilidade”, e a troca de
apoio aos seus projetos, o partido no governo, distribui cargos para
seus “aliados” que passam a controlar pequenos “feudos”, como
ministérios, secretarias, direção de estatais, desde as quais
comandam fortes esquemas de desvio de dinheiro. É só lembrar as
fotos do apartamento alugado para guardar malas, caixas e pacotes
desbordando dinheiro desviado por Geddel Vieira Lima, queridinho nos
governos de Lula, Dilma e Temer, onde ocupou importantes cargos.
Escândalos de corrupção como Mensalão, Petrolão e o Trensalão
do tucanato de São Paulo, se enquadram nesse tipo de corrupção,
que é o mais comum. O PT não foi o inventor destes esquemas, mas os
adotou e os expandiu.
Será que as confissões de Marcelo e Emilio Odebrecht, que sujam
ainda mais seu nome e o de sua empresa, uma das maiores empreiteiras,
são somente para conspirar contra Lula e prejudicá-lo? A formação
de um exclusivo“departamento de propina”é uma invenção dos
diretores da Odebrecht para condenar Lula, ou é a maior prova da
existência de uma corrupção sistêmica no país da qual o PT foi
partícipe? A aceitação de devolver bilhões aos cofres públicos
por parte de estas empresas é um surto de arrependimento ou é o
custo calculado por essas empresas ao se enfiar até o pescoço na
corrupção? As delações de Palocci, braço direito de Lula durante
seus governos e principal articulador da sua política econômica
neoliberal, é apenas uma montagem contra o “inocente” Lula e um
suicídio político/moral do ex-ministro de economia? Palocci, que
conviveu por anos ao lado de Lula era um corrupto e Lula não sabia?
Acreditamos que não, que são provas incontestáveis da existência
de um regime corrupto, do qual Lula e o PT também são parte.
Lamentavelmente, há setores de esquerda que acham que tudo isso não
passa de uma armação para impedir Lula de ser candidato.
A comprovação de que o PT é parte da corrupção sistêmica do
capitalismo brasileiro já desmonta o argumento utilizado pelo
petismo e pelos grupos que optaram por serem seus satélites na
defesa do ex-presidente, de que “não há provas contra Lula”.
Mas obviamente existem muitas mais evidências. Boa parte do antigo
alto escalão petista desviou dinheiro público para diferentes
interesses, incluídos os pessoais. Dirceu, Palocci, Delúbio Soares,
Silvinho “Landrover” Pereira, José Genuíno, João Vaccari Neto,
João Paulo Cunha, foram presos por corrupção fartamente
testemunhada e documentada. Todos foram durante anos da equipe de
confiança e do círculo íntimo de Lula. É possível que o
presidente, com toda sua experiência, que sempre comandou com “mão
de ferro” o PT, não soubesse que estes personagens estivessem
fazendo o que fizeram? Obviamente que não.
Além disso, é possível que Lula, que recebia da Odebrecht
altíssimas quantias de dinheiro para fazer “palestras” pelo
mundo e interceder em favor dessa empresa em Cuba, Venezuela,
Argentina, Peru, Equador, países onde hoje também se investigam
graves denúncias contra a empreiteira e há até ex-presidentes
presos como em Peru, “nem sonhasse” que a empresa, onde seus
altos executivos confessaram que mantinham pagamento de propina a
políticos desde a ditadura, tivesse envolvimento com corrupção?
Obviamente que sabia. Fora isso, as planilhas da Odebrecht com
repasses a Lula, além da confissão de Leo Pinheiro, amigo de Lula e
pagador da propina pela OAS, também são provas concretas, ou a
Odebrecht, a OAS, e outras empresas, também querem se suicidar?
O argumento de que “não há prova contra Lula”, levantado não
somente pelo PT, mas também por correntes do próprio PSOL é
lamentável e não condiz com a realidade. É um argumento que traz
consigo ou uma grande inocência ou uma enorme capitulação
política, pois visa “livrar a cara” de Lula e do PT serem parte
da corrupção no Brasil. Mais lamentável ainda quando desde 2005,
com o escândalo do mensalão, a esquerda consequente tinha um claro
entendimento e denunciava que o PT chafurdava na lama junto aos
demais partidos da ordem.“Os esforços das “elites”, da cúpula
do PT e das lideranças do movimento para blindar o presidente Lula e
o Ministro Palocci da crise que vai devorando a cada dia o Partido
dos Trabalhadores, foram vãos […] O argumento que “Lula nada
sabia” torna-se, a cada dia, mais insustentável e até ridículo:
o caixa dois e /ou o mensalão, eram para comprar partidos e
parlamentares do PT e da base aliada do governo Lula; para obter
maioria no Parlamento e para votar os projetos decididos pelo governo
Lula…” Trecho de um artigo publicado pelo mandato do deputado
federal Babá, PSOL/RJ em agosto de 2005 sob o título: A ética de
chiqueiro, está levando o PT e o governo Lula ao túmulo.
A condenação de Lula coloca em risco a “democracia”?
Outro dos argumentos bastante utilizados pelos defensores de Lula, é
que a sua condenação coloca em risco a democracia e poderia
significar um recorte dos direitos democráticos para a classe
trabalhadora. Temos que responder isso concretamente. De quais
direitos democráticos os companheiros falam? A condenação de Lula
restringirá as liberdades do movimento sindical? As greves podem ser
proibidas em breve? A liberdade de reunião e de assembleia será
logo considerada ilegal? Os partidos que fizeram oposição de
esquerda ao PT (PSOL, PSTU, PCB), terão seus candidatos cassados?
Teremos um salto qualitativo nas prisões de dirigentes sindicais, do
movimento estudantil ou popular? A polícia vai passar a reprimir
ainda mais nas periferias? Enfim, são perguntas que exigem respostas
daqueles que agitam aos quatro ventos que a condenação de Lula
atingirá a esquerda e à maioria da população brasileira. Não
vemos que nada disso vai dar um salto qualitativo a partir da
condenação de Lula. As liberdades democráticas continuarão com as
limitações da democracia burguesa. A democracia burguesa, não é
um direito universal, é a democracia dos ricos, por isso sempre as
liberdades democráticas estão ameaçadas de serem cortadas, como é
próprio do regime burguês repressor que impera em nosso país. Em
determinados momentos se restringem, em outros se ampliam, dependendo
da mobilização.
As liberdades democráticas sofreram ataques também durante o
governo do PT. Grande parte das restrições democráticas, que foram
impostas à esquerda e os trabalhadores, foram apoiadas pelo próprio
PT! Assim como na era Lula/Dilma, veremos processos e detenções de
ativistas em manifestações. O povo da periferia seguirá sendo
vítima da barbárie policial, o que já existia na era petista. É
bom relembrar que graças à Lei de Drogas, de 2006, imposta pelo
Governo Lula, durante os 13 anos de governo petista, a população
carcerária (em sua maioria composta por jovens pobres e negros),
dobrou no país. As greves continuaram sendo declaradas ilegais,
sofrendo interditos proibitórios e pesadas multas aos sindicatos,
assim como nos governos petistas. Ou seja, a condenação de Lula não
altera as poucas liberdades democráticas alcançadas até o momento
para a classe trabalhadora e o povo pobre. Não há uma mudança de
regime a partir da condenação de Lula. Infelizmente, grande parte
das organizações da esquerda brasileira está agitando esse
fantasma para ajudar o PT a transformar Lula numa vítima, em um
símbolo das liberdades democráticas para a nossa classe. Logo ele e
o seu partido, que atentaram várias vezes contra ela!
Na verdade, quem mais teme depois da condenação de Lula são os
próprios políticos corruptos. Não podemos aceitar que há que
defender Lula, porque Temer, Aécio, José Serra, Renán ou Romero
Jucá estão soltos. Com esse argumento deveriam exigir a liberdade
de Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, Eduardo Azeredo, Palocci, Geddel
Vieira Lima e tantos outros e que tenham seus direitos reintegrados,
porque Aécio e Temer estão em liberdade. Esse argumento não passa
de uma conveniência momentânea, e só servirá para defender Lula,
ninguém mais. Por que não defendem a liberdade de Dirceu, Palocci
ou João Vaccari Neto? Porque mais uma vez se trata de uma
capitulação política, onde os argumentos são jogados para
justificar a defesa de que Lula é “diferente” dos outros. De
nossa parte defendemos investigação e punição de todos os
corruptos.
Alguns ainda ousam comparar os casos de Lula e Rafael Braga, como foi
o caso da Deputada Maria do Rosário (PT-RS). Debatendo sobre os
direitos democráticos e a estúpida comparação entre os casos
Rafael Braga e Lula, Cecília Oliveira, colunista do site
www.theintercept.com coloca: “Este paralelo fica ainda mais raso
quando você lembra que a vida de jovens negros e pobres como Rafael
foram impactadas severamente por situações específicas onde o PT é
algoz, não aliado. Lei de Drogas é uma delas. Instituída em 2006
durante o governo petista, foi fator chave para o drástico aumento
da população carcerária no Brasil, especialmente contra jovens
negros e pobres, como Rafael. Foi também na gestão petista que
houve um recrudescimento penal que nos deixou como legado a Lei de
Organizações Criminosas, a Lei Antiterrorismo e a indicação de
ministros nem sempre ligados ao campo jurídico progressista para o
Supremo Tribunal Federal e de Justiça. E temos ainda a gestão
penitenciária precária e a criação da Força Nacional de
Segurança. ” Rafael Braga é um símbolo da luta pelas liberdades
democráticas, sobretudo para os pobres e negros. Lula, não!
Essas posturas banalizam a luta pelas liberdades democráticas e
levam confusão às fileiras da esquerda. A possibilidade de Lula
concorrer ou não na próxima eleição não está relacionada com a
restrição das liberdades democráticas, nem com a perseguição do
petista, mas com fatos de corrupção. Tanto é assim que uma
importante parte do regime democrático burguês, que compõe a
“ordem” neste país, lamenta essa situação. O “golpista”
Temer e Henrique Meirelles, as duas principais figuras deste governo,
ao lado de Renan Calheiros, cacique do governante PMDB, Eunício de
Oliveira, o bandido que preside o senado, Fernando Henrique Cardoso,
chefe tucano, e tantas outras figuras deste regime podre, se
manifestaram lamentando que Lula possa ser impedido de participar no
pleito eleitoral de 2018 e não desejam que o PT desapareça porque a
pesar da perda de prestigio, ainda lhes pode servir como uma
ferramenta de controle das massas como se demonstrou durante anos.
Nenhuma confiança no sistema judiciário
Como colocamos em recente nota: “Não podemos depositar nenhuma
confiança na justiça burguesa que integra o acordão que deixa
impune Michel Temer e seus ministros, Aécio Neves e José Serra, os
presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Eunício de
Oliveira, ex-presidentes como Sarney e FHC, os chefes do quadrilhão
do PMDB/PSDB. (…). Todos deveriam ser condenados por corrupção,
perder seus cargos e ter seus bens confiscados. A justiça burguesa
nunca é imparcial. O juiz Sergio Moro e a operação Lava Jato, por
exemplo, colocaram sob sigilo a lista da Odebrecht em 2016, ajudaram
Temer vetando perguntas formuladas por Eduardo Cunha e agora se
compadece com um bandido como Sergio Cabral. Para ver uma efetiva
punição de todos os corruptos, sem seletividade, é preciso ocupar
as ruas, lutando contra a retirada de direitos e a reforma da
previdência. (…) Retomar nas ruas o Fora Temer e todos os
corruptos, contra todos os envolvidos em esquemas ilícitos: PMDB,
PSDB, DEM, PT, (…) exigir a divulgação de todos os áudios e de
todos os sigilos dos envolvidos na Lava Jato, a prisão e confisco
dos bens de todos os políticos e empresários corruptos, a
estatização das empresas envolvidas na Lava Jato, bem como a
revogação de todas as medidas contra o povo, votadas durante a
vigência do mensalão e da lava jato, como a reforma da previdência
de 2003, as MP’s 664 e 665 de 2016, a PEC 55 de 2016, a
terceirização e a reforma trabalhista de Temer. (Sobre a condenação
em segunda instância do ex-presidente Lula. Corrente Socialista dos
Trabalhadores, 25 de janeiro de 2018.)”
Ou seja, a nossa posição não é a de organizar mobilizações e a
defesa de nosso “corrupto de estimação” (como faz grande parte
da esquerda brasileira), mas de lutar para desvendar o gigantesco
esquema montado pelos sucessivos governos, punir os responsáveis e
confiscar seus bens. É errado abandonar esta luta porque o
judiciário é uma instituição burguesa e portanto completamente
parcial. Existem sim elementos de seletividade e temos que denunciar.
O estranho é que essa seletividade não tenha sido denunciada quando
o TSE julgou a chapa Dilma/Temer e a inocentou claramente por razões
políticas, para não desestabilizar o governo e o regime. O que fez
o PT, a CUT e seus aliados? Nada! Porque salvava Dilma de ter seus
direitos casados e impedia a queda do governo Temer levando o
processo às eleições de 2018, algo que interessava ao PT. Temos
que denunciar a seletividade, não para salvar Lula, mas para exigir
que a investigação se estenda a todo o arco de políticos
notadamente corruptos.
Alguns debates com os companheiros do MAIS
Não é a primeira vez que temos diferenças com as posições do
MAIS. Já discordamos de sua política de defesa da Venezuela de
Maduro onde impera um regime ditatorial que, aí sim, reprime com
bandas para-governamentais e corta fortemente as liberdades
democráticas. Agora, em nome das liberdades democráticas, o MAIS se
converteu num dos mais destacados defensores dos direitos de Lula,
ainda que para isso tenham que distorcer as posições de outras
correntes.
O dirigente do MAIS, Gibran Jordão, em recente artigo, faz uma
ferrenha critica à nossa postura frente ao julgamento de Lula. Nos
acusa de ultra esquerdistas e sectários e reafirma a posição de
sua corrente: a defesa de Lula é um dever, uma tarefa fundamental da
esquerda para evitar a perda de mais direitos e o advento do
semi-fascismo. Para confirmar nosso suposto erro e tentar demonstrar
contradições, Gibran provoca:“… Nesse raciocínio pobre de
dialética, não seria coerente que os camaradas (da CST) fizessem
uma autocrítica de suas posições na Argentina? Em dezembro do ano
passado a corrente irmã da CST na Argentina publicou uma nota
defendendo os direitos democráticos de Cristina Kirchner e outros
dirigentes kirchnerista contra ações do poder judiciário daquele
país…. Estariam os camaradas da CST/UIT capitulando ao
Kirchnerismo na Argentina? Nós pensamos que não, tiveram uma
posição correta em defesa de liberdades democráticas sem prestar
apoio aos Kirchneristas. O que está completamente equivocado é a
postura ultra esquerdista dos camaradas da CST no Brasil em relação
ao julgamento de Lula. ” Numa manobra condenável e pouco honesta,
Gibran seleciona uma frase do artigo citado:“O juiz federal
Claudius Bonadio ordenou a prisão de vários Kirchneristas e pediu o
impeachment de Cristina Fernandez de Kirchner. Além das profundas
diferenças que temos com eles, rejeitamos essa manobra pelo governo
Macri e seus juízes cúmplices.”e a tira completamente de contexto
para demonstrar sua“verdade”. A ordem de prisão do juiz Bonadio
aos kichneristas, era por suposta “traição à Pátria”,em
relação aos acordos do governo argentino com seu par de Irã,
referente às investigações pelo atentado à AMIA (Associação
Mutual Israelita Argentina) ocorrida em 1994, que deixou mais de 80
mortos durante o governo Menem. Fica claro, nessa frase, que Esquerda
Socialista rejeita uma condenação de tipo político. Mas, o artigo
completo do jornal, é coerente com nossa posição de punir aos
corruptos. No mesmo texto, nossos camaradas do Izquierda Socialista,
colocam: “Essa rejeição às prisões ordenadas por Bonadio não
deve se confundir com nenhum apoio político a estes personagens
repudiáveis do kirchnerismo. Estivemos a favor de que De
Vido(principal Ministro dos governos K) e Budou(vice-presidente de
CFK)sejam presos por provadas causas de corrupção, e se alguns dos
agora detentos se encontram comprometido em causas similares, não
duvidaríamos em defender o mesmo”. Ou seja, nossos companheiros do
IS, defenderam cadeia para os Kirchneristas envolvidos em corrupção.
Nada mais desonesto do que dizer que devemos fazer uma “autocrítica”.
Mas o MAIS não para por aí. Em sua incansável cruzada em defesa de
Lula, outro de seus dirigentes, Valério Arcary, fez uma proposta
curiosa, para não dizer estapafúrdia. Numa pequena nota onde
analisa a situação de Lula depois do julgamento em segunda
instância, preocupado, Arcary lhe sugere à direção do PT: “O
que farão Lula e o PT? Aceitarão o encarceramento de Lula? Uma
possibilidade é a desobediência civil, o que significaria desacatar
a ordem de prisão. Outro caminho, por exemplo, foi a decisão de
Puigdemont na Catalunha de ir para Bruxelas. ” Inacreditável!
É inacreditável que Lula, um defensor da ordem e “apagador de
incêndios” para salvar o regime, cogite a “desobediência
civil”, nem a sua, nem da população, como muito bem caracteriza o
historiador Lincoln Secco, um conhecedor do lulismo: “… o PT vai
reagir com força verbal à sentença, mas será difícil no curto
prazo mobilizar resistência nas ruas, porque os dirigentes atuais
não comandam mobilizações há 20 anos e desconhecem sua base
social”. Mas o curioso é a proposta de Lula fazer o mesmo que
Puigdemont. Antes de tudo há que dizer que o dirigente catalão ia
ser preso por desobediência civil, por uma luta política justa (a
declaração da Independência) e não por corrupção como é o caso
de Lula. O que surpreende é que Arcary recomende a covarde decisão
de Puigdemont de fugir à Bélgica abandonando o povo que lutava
contra a aplicação do articulo constitucional 155. Uma decisão
errada, que fortaleceu o governo Rajoy e a monarquia causando tanta
confusão como suas vacilações na hora de declarar a independência
e enfrentar o governo central espanhol.
A relação entre a defesa de Lula e o projeto político para o
próximo período
A esquerda brasileira precisa se afirmar como alternativa ao projeto
Temer/PSDB e também ao lulopetismo construindo um terceiro campo,
com um programa classista e de ruptura com a ordem. Ao se alinhar com
qualquer um desses projetos burgueses atolados até o pescoço no
lamaçal de corrupção, não poderemos criar uma alternativa que
seja referência para milhões de trabalhadores que foram vítimas
das políticas dos governos petistas e hoje são de Temer e da sua
quadrilha instaurada nos ministérios e no congresso nacional.
Com uma política de defesa de Lula, acusado por atos de corrupção
e comparecendo aos atos petistas, além de se desmoralizar, o PSOL
fica atrelado a um projeto falido. O objetivo do PT, CUT, PCdoB e CTB
é salvar Lula para chegar às eleições de 2018 e voltar a aplicar
o mesmo projeto. Os objetivos da classe trabalhadora e das
organizações políticas que dizem defender seus interesses devem
ser outros, bem diferentes, lutar para derrotar Temer e suas
contrarreformas, denunciando que a atual situação do país também
é responsabilidade de Lula e do PT e nesse processo construir uma
alternativa, um terceiro campo, independente da velha e da nova
direita.
As mobilizações em defesa de Lula demonstraram que a população
trabalhadora não está preocupada com a condenação de Lula. Isso
se comprovou poucos dias depois, em pesquisa realizada pela
Datafolha, onde mais da metade dos entrevistados 53% se manifestou
pela prisão de Lula, enquanto 83% acreditam que Lula “sabia da
corrupção”. Como identificamos em várias pesquisas, o sentimento
generalizado é que a corrupção é um grave problema e que os
responsáveis desse flagelo devem ser punidos, sem seletividade. Essa
não é uma posição ultra esquerdista nem sectária como tratam de
caricaraturizar algumas correntes, mas a justa vontade de milhões
que se vêm burlados pelos políticos. Temos que nos preparar para
responder a esse sentimento oferecendo uma alternativa de confronto
com o Governo Temer e seus aliados, mas também com a direção
lulopetista. Importantes setores de massa estão rompendo há anos
com essa direção, mas ao não achar uma proposta clara e crível
começa a se gerar uma dispersão perigosa. Só rompendo de vez com
essa direção traidora e apresentando um programa que aponte uma
saída de classe para o país, seremos enxergados como uma
alternativa viável.
A construção de um terceiro campo, que realmente represente o
projeto da classe trabalhadora, começa desde já pela luta contra a
Reforma da Previdência e pela anulação da Reforma Trabalhista, da
Lei das Terceirizações e da PEC do teto de gastos. Lula e o PT já
anunciaram que não irão rever essas medidas aplicadas pelo corrupto
governo Temer, por isso essa saída deve se construir sobre os
escombros do lulismo, não sobre seus alicerces. Para fortalecer esse
projeto, temos que propor um nome que encarne nossas propostas nas
próximas eleições presidenciais. Por razões obvias esse nome não
pode ser do campo lulista. De nossa parte propomos o companheiro
Plínio de Arruda Sampaio Jr. A postura intransigente de Plínio
ajuda a construir uma alternativa desde um terceiro campo,
independente, de ruptura com o regime que está ai e com um programa
capaz de superar o Programa democrático-popular e propostas de
conciliação como o programa da Plataforma Vamos.
Uma saída diferente de tudo que está aí e que se propõe a romper
com os pactos e acordos com o sistema financeiro, auditando e
suspendendo o pagamento dívida pública para ter recursos para
investir em saúde, educação, moradia e demais demandas sociais,
anulando as contrarreformas e demais medidas contra os interesses dos
trabalhadores aplicados pelos últimos governos tucanos, petistas e
pemedebistas que atacam direitos trabalhistas, democráticos e de
manifestação. Que visa impor a renacionalização das empresas
privatizadas, uma Petrobrás 100% estatal e um plano de obras
públicas capaz de gerar milhões de empregos dignos e melhores
salários.
Extraído de: