Me formei em 2012, em
Licenciatura em Ciências Sociais, pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS). Em quase cinco anos de graduação, não li um único texto de Paulo
Freire na Faculdade de Educação, talvez porque a maioria dos docentes o considere
ultrapassado. No Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) Karl Marx era
saco de pancada da maioria dos professores de Ciência Política, Antropologia e
Sociologia. Em boa parte do tempo eu reagia às calúnias proferidas por tais
professores contra o pai do socialismo científico, o que me deixou marcado e possivelmente
queimado para tentar um mestrado. Em uma cadeira de pesquisa recebi uma nota muito
próxima de zero com o argumento de que o meu trabalho era “ideológico”. O tema
gerador dessa censura mascarada de avaliação buscava versar sobre as impressões
das populações que viveram nos países do chamado socialismo real sobre a
restauração do capitalismo, como elas se sentiam e como comparavam os dois
sistemas. A professora talvez não tenha gostado da opinião dos “nativos”.
Inconformado, abri processo de revisão de conceito mas acabei tendo que mudar o
tema do trabalho.
Dá para contar nos dedos de uma
mão, e sobrarão dedos, quantos professores marxistas tive ao longo do meu
curso. O que mais me marcou foi um professor da cadeira de Economia, disciplina
a qual tivemos apenas dois semestres, que cheguei a ter uma boa relação tendo
inclusive a honra de ter emprestado um livro a ele.
Em 2013 ingressei na escola
pública estadual. A maioria dos professores, incluindo os de humanas, têm uma
noção antiquada e conservadora de educação, na qual acreditam que simplesmente
despejando conhecimentos de cima para baixo nos alunos vão transformar o
pensamento deles que por sua vez transformariam o mundo existente, em suma, uma
prática docente totalmente oposta ao que defendeu Paulo Freire. Muitos desses
professores sequer se dignam a lutar por seus próprios direitos e alguns até
fazem movimentos contrários às greves e paralisações da categoria, incluindo
novamente muitos de humanas, o que vai na contramão do que defendeu Freire. Os
poucos que se dispõe a utilizar as ideias do filósofo brasileiro encontram nas
condições materiais e estruturais precárias de trabalho um obstáculo que
praticamente inviabiliza tal empreitada, além de se deparar com o estranhamento
dos próprios alunos que encontram-se aprisionados eles próprios nesse modelo de
educação antiquado, o qual assimilaram e internalizaram.
Apesar dessa realidade a direita
brasileira elegeu como vilão da educação não os cortes anuais de recursos que
são destinados aos banqueiros e especuladores, nem a sobrecarga de trabalho dos
professores, nem seus baixos salários, nem a falta de professores, nem as
demissões de professores para fazer “economia”, nem as turmas abarrotadas, nem
a estrutura precária, nem o fechamento de escolas, tampouco esbraveja contra os
governos que fazem tudo isso (pelo contrário, seus políticos são base
parlamentar deles, como atesta Marcel van Hattem), mas encontrou em uma suposta
doutrinação ideológica marxista e de esquerda a causa de todos os males do
ensino no país.
A atual pressa em impor o projeto
“Escola sem Partido” é uma reação da direita aos levantes secundaristas e às
greves dos profissionais da educação que se alastram pelo país e que lutam
contra as medidas de ajustes que ameaçam a educação pública e que são aplicadas
por todos os governos que administram a crise capitalista, incluindo os do PT e
do PCdoB - deixando claro que práticas freirianas e marxistas passam longe desses
partidos.
Jorge Nogueira, professor de Sociologia da rede estadual no Rio Grande do Sul e militante da CST/PSOL
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