sábado, 9 de outubro de 2010

Mídia "livre": Estadão demite jornalista por opinião

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A grande mídia privada tem se apresentado como o paraíso da liberdade e atacado qualquer proposta de democratização da mídia como ditatorial. No entanto, no interior das redações dos seus jornais o livre pensar não só é proibido como tem sido vigiado e punido!

Jornalistas têm sido demitidos até por expressar opiniões fora das dependências da mídia "livre". Octavia Nasr, da CNN, foi demitida por seus comentários no Twitter; Helen Thomas, da Hearst, por suas opiniões em um programa de entrevista; no Brasil, Felipe Milanez foi demitido da Abril também por comentários expressados no Twitter. [1]

Esta semana Maria Rita Kehl representou mais uma "baixa" da mídia "livre". Ela foi demitida do Estado de São Paulo após escrever um artigo que desagradou o editorial. É verdade que o artigo dela puxava a brasa para o assado do Governo Lula e que o Estadão já havia declarado apoio à Serra. [2] Mas a sua demissão é mais uma prova de que a mídia privada como o terreno da liberdade é uma grande falácia.

A liberdade que os barões da grande mídia querem é a de fazer o que bem entendem com algo que é de interesse público: a informação.
Querem liberdade para ocultá-la, deformá-la, manipulá-la de acordo com os seus interesses, como deixou bem claro Paulo Uebel, defensor desses barões. [3]

Discordo da postura governista de Maria Rita Kehl, mas repudio, e todos devem repudiar, a repressão da mídia "livre" à liberdade de expressão. Abaixo segue a entrevista que ela concedeu ao Terra:


Quinta, 7 de outubro de 2010, 11h25 Atualizada às 15h25
Maria Rita Kehl: "Fui demitida por um 'delito' de opinião"

Bob Fernandes

A psicanalista Maria Rita Kehl foi demitida pelo Jornal O Estado de S. Paulo depois de ter escrito, no último sábado (2), artigo sobre a "desqualificação" dos votos dos pobres. O texto, intitulado "Dois pesos...", gerou grande repercussão na internet e mídias sociais nos últimos dias.

Nesta quinta-feira (7), ela falou a Terra Magazine sobre as consequências do seu artigo:
- Fui demitida pelo jornal o Estado de S. Paulo pelo que consideraram um "delito" de opinião (...) Como é que um jornal que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?

Terra Magazine - Maria Rita, você escreveu um artigo no jornal O Estado de S.Paulo que levou a uma grande polêmica, em especial na internet, nas mídias sociais nos últimos dias. Em resumo, sobre a desqualificação dos votos dos pobres. Ao que se diz, o artigo teria provocado conseqüências para você...
Maria Rita Kehl - E provocou, sim...

- Quais?
- Fui demitida pelo jornal O Estado de S.Paulo pelo que consideraram um "delito" de opinião.

- Quando?
- Fui comunicada ontem (quarta-feira, 6).

- E por qual motivo?
- O argumento é que eles estavam examinando o comportamento, as reações ao que escrevi e escrevia, e que, por causa da repercussão (na internet), a situação se tornou intolerável, insustentável, não me lembro bem que expressão usaram.

- Você chegou a argumentar algo?
- Eu disse que a repercussão mostrava, revelava que, se tinha quem não gostasse do que escrevo, tinha também quem goste. Se tem leitores que são desfavoráveis, tem leitores que são a favor, o que é bom, saudável...

- Que sentimento fica para você?
- É tudo tão absurdo... A imprensa que reclama, que alega ter o governo intenções de censura, de autoritarismo...

- Você concorda com essa tese?
- Não, acho que o presidente Lula e seus ministros cometem um erro estratégico quando criticam, quando se queixam da imprensa, da mídia, um erro porque isso, nesse ambiente eleitoral pode soar autoritário, mas eu não conheço nenhuma medida, nenhuma ação concreta, nunca ouvi falar de nenhuma ação concreta para cercear a imprensa. Não me refiro a debates, frases soltas, falo em ação concreta, concretizada. Não conheço nenhuma, e, por outro lado...

- ...Por outro lado...?
- Por outro lado a imprensa que tem seus interesses econômicos, partidários, demite alguém, demite a mim, pelo que considera um "delito" de opinião. Acho absurdo, não concordo, que o dono do Maranhão (senador José Sarney) consiga impor a medida que impôs ao jornal O Estado de S.Paulo, mas como pode esse mesmo jornal demitir alguém apenas porque expôs uma opinião? Como é que um jornal que está, que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?

- Você imagina que isso tenha algo a ver com as eleições?
- Acho que sim. Isso se agravou com a eleição, pois, pelo que eles me alegaram agora, já havia descontentamento com minhas análises, minhas opiniões políticas. [4]

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[1] Mídia "livre": demitida por delito de opinião (10/06/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2010/07/midia-livre-demitida-por-delito-de.html

[2] Editorial: O mal a evitar (25/09/2010):
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,editorial-o-mal-a-evitar,615255,0.htm

[3] A liberdade na mídia privada é a que o patrão permite (05/03/2010):
http://blogdomonjn.blogspot.com/2010/03/liberdade-na-midia-privada-e-que-o.html

[4] Maria Rita Kehl: "Fui demitida por um 'delito' de opinião" (07/10/2010):
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI4722228-EI6578,00-Maria+Rita+Kehl+Fui+demitida+por+um+delito+de+opiniao.html
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