terça-feira, 12 de julho de 2011

O PT gaúcho empacotarsou!

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"O PT gaúcho é diferente do PT nacional!" Essa assertiva, tão corriqueira nas análises de alguns comentaristas políticos e no imaginário de muitos lutadores sociais sinceros, sofreu um abalo tremendo com a recente aprovação do "Pacote de Sustentabilidade Financeira" pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul.

O pacote de medidas, que ficou conhecido como "Pacotarso", atacou a previdência pública - privatizando parte dela e aumentando a alíquota de contribuição - e instituiu o calote em grande parte dos precatórios.

Evidentemente que tais medidas dificilmente seriam implementadas por um governo do PT gaúcho há 10 ou 15 anos atrás. Por isso não foram poucos os que buscaram alento no Governo Olívio.

Tentando confortar os saudosistas, o jornalista petista, Marco Weissheimer, escreveu o artigo "O governo Tarso e algumas gotas de governo Olívio" [1], que teve uma repercussão significativa, onde defende que o Governo Olívio teria tido um início similar ao que está tendo o Governo Tarso.

Não é o ponto deste artigo fazer uma comparação entre o início dos dois governos e nem considero que isso seja suficiente para compreender o que está ocorrendo. No entanto, apesar das inúmeras críticas à esquerda que possam e devam ser feitas ao Governo Olívio, considero descabida a analogia do início do seu governo com o de Tarso feita por Weissheimer.

As alianças com a direita (até o PP quase entrou no Governo Tarso), a ampliação de benesses às multinacionais [2] e o ataque à luta pela terra do MST [3] não fizeram parte do Governo Olívio. Tampouco o ataque à previdência pública. São alguns exemplos que bastam para demonstrar a diferença entre um governo e outro.

No entanto este artigo não acredita que bastariam algumas "gotas de governo Olívio" no governo Tarso, até porque estas gotas já secaram há tempos. O PT gaúcho não passou incólume pelo processo de adaptação à ordem pelo qual passou o PT nacional. Longe de ter alguma gota do passado, o PT gaúcho foi inundado pelos ensinamentos do PT nacional, os quais recebeu de muito bom grado com as "comportas" bem abertas. Por isso, mesmo um Governo Olívio hoje seria diferente do que foi no passado. Este artigo aborda esse processo de transformação do PT gaúcho que há muito não se diferencia do PT nacional como imaginam alguns.


A agência do PT gaúcho no seu processo de adaptação e acomodação

É preciso deixar claro que o PT gaúcho não foi uma simples vítima da política do PT nacional. O partido foi desenvolvendo em nível local lideranças políticas e galgando cargos na administração estatal. Foi adaptando-se aos poucos e muitos problemas de burocratização de inúmeros de seus dirigentes já eram visíveis na Prefeitura de Porto Alegre, tida como uma referência nacional do "modo petista de governar".

O processo seguiu se desenvolvendo mas foi no Governo Lula que as contradições se tornaram mais evidentes aos olhos de parcelas do grande público. Isso porque vários dirigentes de prestígio do PT gaúcho integraram - e ainda integram - o governo federal e apoiaram - e apóiam - suas políticas privatistas e de ataques aos trabalhadores. Olívio Dutra, por exemplo, apoiou a Reforma da Previdência.

Menos de um ano depois de denunciar o então candidato do PMDB ao governo do Estado, Germano Rigotto, por votar contra os aposentados, o PT gaúcho apoiava os ataques do seu governo em nível nacional que prejudicava os aposentados e privatizava parte da previdência. Não bastasse isso alguns de seus dirigentes apoiaram a expulsão dos chamados parlamentares "radicais" (Babá, Luciana Genro e Heloísa Helena) por estes defenderem naquele momento o que o PT gaúcho defendia há menos de um ano!

No período da polêmica dos "radicais", o Senador Paulo Paim, tentando posar de coerente, concedeu uma entrevista para a TVE onde afirmou que deixaria o partido caso a Reforma da Previdência fosse aprovada. Como se sabe tal reforma foi aprovada e Paim se manteve no PT até os dias de hoje.

No auge do escândalo do mensalão, Olívio Dutra culpou as más-companhias - os partidos de direita aliados do Governo Lula. Inconsequente com as suas próprias caracterizações Olívio saiu elogiando o governo depois de ser substituído por um homem indicado por Severino Cavalcanti. Mais adiante, como veremos na sequência, o próprio Olívio foi buscar "más-companhias" para compor chapas e apoios eleitorais.

Ainda neste período o PT gaúcho agitou a bandeira da "refundação do PT". Tarso Genro se tornou presidente nacional do partido. Como o tempo demonstrou, o PT não só não foi refundado como chafurdou ainda mais na lama da corrupção e do neoliberalismo. Se naquela época o PT gaúcho criticou dirigentes como Delúbio Soares e José Dirceu, hoje não os repudia, tendo a corrente de Tarso Genro lavado as mãos sobre o retorno de Delúbio e Dirceu convidado recentemente pelo PT gaúcho para promover cursos de formação política. [4]




a) As "más-companhias" viraram boas parcerias

Se em 2005 Olívio Dutra culpou as "más-companhias" pela corrupção do seu partido, menos de um ano depois o mesmo Olívio buscou apoio das "más-companhias" no segundo turno das eleições para o governo do Estado em 2006. Na disputa contra a tucana Yeda Crusius, Olívio buscou o apoio do PMDB e de Germano Rigotto: "Há sintonia na visão dos dois partidos", anunciou o "bigodudo" na época. (Correio do Povo, 05/10/2006). Porém acabou se desmoralizando duplamente pois além de entrar em contradição com o seu discurso ainda ouviu um sonoro "não!" do PMDB.

Em 2008 um descolado Olívio Dutra, com chapéu e bermuda, posou para os flashes jornalísticos ao lado de Berfran Rosado (PPS), outrora fervoroso opositor do seu governo, para selar a aliança do PT com o "brittense" PPS em Cidreira. [5]

No mesmo ano, na cidade de Canoas, o PT gaúcho não se contentou em se aliar somente com a turma do ex-governador Antônio Britto e agregou o DEM e o PP, cuja vice da chapa, Beth Colombo, iniciou sua trajetória política na Arena. [6] O PP que pode ser aliado do PT em Porto Alegre em 2012. [7]

Aos eleitoralistas que argumentam não haver outra forma de governar lembramos das palavras do próprio Olívio Dutra em 1998:
"...temos a experiência de governar sem ser maioria no Legislativo. Há dez anos governamos Porto Alegre e nunca tivemos maioria no Legislativo do município." [8]

É um Olívio bem distinto do dos dias de hoje:
"Em uma das pausas, Olívio disse à presidente da Câmara, Maria Celeste (PT), que é prioridade para o partido ampliar o leque de alianças na Capital..." [9]

É por estas e outras que um Governo Olívio hoje seria bem distinto do que fora no passado e provavelmente decepcionaria muitos lutadores sociais honestos.

b) Uma "oposição" amiga



As "más-companhias" não viraram boas parcerias apenas nos momentos eleitorais. O PT gaúcho tem sido uma "oposição" amiga que procura a velha direita para colaborar na aplicação de medidas neoliberais. Foi assim, por exemplo, em 2006 quando a bancada do partido na Assembléia Legislativa apoiou o "Pacto Pelo Rio Grande", um acordão neoliberal entre os partidos da ordem que pelo teor das suas medidas deveria ter sido chamado de "Pacto Contra o Rio Grande".

Cézar Busatto, outrora antipetista doentio, foi um dos principais idealizadores e difusores do tal "Pacto". Foi com ele que o PT gaúcho se abraçou para aprovar o "Pacto". Mas a amizade do PT gaúcho com Busatto iria além: em 2009 o Prefeito de Canoas, Jairo Jorge, nomeou-o para a Secretaria Especial de Estratégia e Inovação, poucos meses depois dele ter deixado o Governo Yeda devido a divulgação de uma escuta telefônica com o então vice-governador Paulo Feijó, onde Busatto expunha com uma frieza assustadora como se operavam os processos de corrupção no interior das estatais. A repercussão negativa na opinião pública local tornou a nomeação de Busatto insustentável e teve de ser revogada.

Como já foi dito, a postura do PT gaúcho no parlamento, cumprindo o papel de "oposição", tem sido não apenas inofensiva mas colaborativa. O PT não apenas tem sido inconsequente em relação a seus concorrentes, mesmo dentro dos marcos da via eleitoral - como atesta seus inúmeros vacilos diante dos escândalos de corrupção no desastroso Governo Yeda - como os têm ajudado a implementar medidas prejudiciais à população.

Foi assim, por exemplo, quando o partido ajudou Yeda a aprofundar o endividamento do Estado buscando empréstimo junto ao Banco Mundial. Na disputa dos "dividendos" políticos dessa "conquista" o Senador Paulo Paim fez, em Brasília, o que ficou conhecido como uma "vigília pelo Rio Grande do Sul". Seria mais adequado chamar de "vigília pelo capital financeiro".

Uma vez consumado o empréstimo, o PT gaúcho resmungou que Yeda queria "capitalizar sozinha" os louros dessa "conquista".

Foi com a ajuda desse empréstimo que o Governo Yeda alardeou que havia "equilibrado" as contas do Estado. Uma "conquista" fantasmagórica, como o próprio PT pode constatar na sequência de uma História que ele próprio ajudou a escrever.



Igual ao de "lá"



ELEIÇÃO 2010: PAIM PEDINDO VOTO EM RENAN CALHEIROS
http://www.youtube.com/watch?v=m6wYFtdSKPw&feature=related

Os fatos descritos acima mostram que o PT gaúcho como diferente do PT nacional é um mito há muito insustentável. Seus principais dirigentes, mesmo o mais respeitado, não só apóiam o PT nacional na gestão federal como aplicam no Rio Grande do Sul as mesmas medidas.

O Governo Tarso vem falando, desde a campanha eleitoral, que as gestões Lula e Dilma são a fonte da sua inspiração. Os ataques à previdência e o calote nos precatórios do Pacotarso assim como as benesses ao grande capital demonstram que tal assertiva não é apenas discurso.

E por falar em pacotes, já é possível dizer que, do ponto de vista da transformação social, o PT gaúcho empacotou, ou para empregar um termo novo, mais atual e adequado: empacotarsou!


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[1] O governo Tarso e algumas gotas de governo Olívio (29/06/2011):
http://rsurgente.opsblog.org/2011/06/29/o-governo-tarso-e-algumas-gotas-de-governo-olivio/

[2] Para as multinacionais têm dinheiro, anuncia Governo Tarso
http://blogdomonjn.blogspot.com/2011/07/para-as-multinacionais-tem-dinheiro.html

[3] O MST está perdendo a razão de existir
http://blogdomonjn.blogspot.com/2011/06/o-mst-esta-perdendo-razao-de-existir.html

[4] Encontro Estadual de Formação
http://www.ptrs.org.br/?p=2872

Em Porto Alegre, José Dirceu diz que Brasil será um dos grandes do mundo em 10 anos (11/06/2011)
http://sul21.com.br/jornal/2011/06/em-porto-alegre-jose-dirceu-diz-que-brasil-sera-um-dos-grandes-do-mundo-em-10-anos/

[5] Outros tempos, Rosane de Oliveira, colunista de Zero Hora, 28/01/2008:
http://www.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a1748950.xml&template=3916.dwt&edition=9197§ion=71

[6] PP e PT juntos, Rosane de Oliveira
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a1956622.xml&template=3916.dwt&edition=10037§ion=71

[7] PP e PT discutem possibilidade de aliança em 2012
http://www.ptpoa.com.br/txt.php?id_txt=3329

[8] Galo missioneiro: Conhecido por ser bom de briga, o governador eleito do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, passa a ser a vitrine do modo petista de governar. Entrevista à IstoÉ, 1998:
http://www.terra.com.br/istoe/vermelha/152602.htm

[9] Jornal Zero Hora, 24/08/2007:
http://www.clicrbs.com.br/jornais/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&edition=8327&template=&start=1§ion=Pol%EDtica&source=Busca%2Ca1598208.xml&channel=9&id=&titanterior=&content=&menu=23&themeid=§ionid=&suppid=&fromdate=&todate=&modovisual
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