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Patrick Cockburn –
Sul21 - 31/jul/2014, 5h59min
Do Counterpunch
Os porta-vozes
israelenses já têm muito trabalho tentando explicar como os
israelenses assassinaram mais de 1.000 palestinos em Gaza, a maioria
dos quais civis, em comparação com apenas 3 civis mortos em Israel
por foguetes e fogo de morteiro do Hamás. Mas pela televisão e pelo
rádio e pelos jornais, porta-vozes do governo israelense hoje, como
Mark Regev, parecem menos enroladores e menos agressivos que
predecessores, que eram muito mais visivelmente indiferentes ao
número de palestinos mortos.
Há pelo menos uma boa
razão para esse ‘aprimoramento’ das capacidades de Relações
Públicas dos porta-vozes de Israel. A julgar pelo que se os veem
dizer, já estão trabalhando conforme um estudo feito por
profissionais, bem pesquisado e confidencial, sobre como influenciar
a mídia e a opinião pública nos EUA e na Europa.
Redigido pelo
especialista em pesquisas e estrategista político dos Republicanos,
Dr. Frank Luntz, aquele estudo foi encomendado há cinco anos por um
grupo chamado “The Israel Project” [Projeto Israel], que mantém
escritórios nos EUA e em Israel, para ser usado “por todos que
estão na linha de frente da guerra midiática a favor de Israel”.
Cada uma das 112 páginas
do folheto é marcada com “proibido distribuir ou publicar”
[orig.“not for distribution or publication”], e é fácil
entender por quê. O relatório Luntz – oficialmente intitulado
“Dicionário de Linguagem Global do Projeto Israel 2009” [orig.
“The Israel project’s 2009 Global Language Dictionary[1]] vazou
quase imediatamente para Newsweek Online, mas até hoje só muito
raramente mereceu atenção, e sua verdadeira importância ainda mão
foi devidamente considerada.
Deveria ser leitura
obrigatória para todos, sobretudo para jornalistas interessados em
conhecer a política de Israel, por causa da lista de “Faça/diga
X” e “Nunca faça/diga Y” dirigida aos porta-vozes de Israel.
Aquelas duas listas são
altamente iluminadoras para que se compreenda a distância imensa que
separa o que funcionários e políticos israelenses pensam e creem, e
o que eles dizem; o que eles dizem é modelado por pesquisa mantida
ativa minuto a minuto, para detalhar o que os norte-americanos
desejam ouvir. Com certeza, nenhum jornalista deveria arriscar-se a
entrevistar qualquer porta-voz de Israel sem conhecer muito bem
aquele manual e ter-se preparado para contra-perguntar sobre os
muitos temas – e sempre com as mesmas palavras e frases – que se
ouvem hoje da boca do Sr. Regev e seus colegas.
O panfleto é cheio de
saborosos conselhos sobre como eles devem modelar suas respostas,
para diferentes audiências. Por exemplo, o estudo diz que
“os norte-americanos
aceitam que ‘Israel tem direito a ter fronteiras defensáveis’.
Mas Israel não tem vantagem alguma em definir com precisão que
fronteiras são essas. Evitem falar em fronteiras em termos de pré-
ou pós-1967, porque isso só faz relembrar aos norte-americanos o
passado militar de Israel. Essa expressão prejudica os israelenses,
sobretudo no campo da esquerda. Por exemplo, o apoio da direita
israelense a fronteiras defensáveis cai de 89% para menos de 60%
sempre que vocês falam em termos de 1967.”
E quanto ao direito de
retorno dos refugiados palestinos que foram expulsos ou fugiram em
1948 e nos anos seguintes, e que nunca mais puderam retornar às
próprias casas e terras? Aqui, o Dr. Luntz é muito sutil nos
conselhos que dá aos porta-vozes israelenses; diz que
“o direito de retorno é
questão difícil para que os israelenses falem dela com eficácia,
porque praticamente toda a linguagem israelense soa muito semelhante
à fala de ‘separados, mas iguais’ dos racistas segregacionistas
dos anos 1950s e dos defensores do Apartheid nos anos 1980s. De fato,
os norte-americanos não gostam, não acreditam nisso e não aceitam
o conceito de ‘separados, mas iguais’.”
Assim sendo, como devem
os porta-vozes enfrentar questões que até o manual considera
‘difíceis’? Recomendam que a coisa seja chamada de “demanda”
– porque os norte-americanos detestam gente que faz demandas. O
manual ensina:
“Digam portanto: ‘os
palestinos não estão satisfeitos com o estado que têm. Agora,
estão demandando mais territórios dentro de Israel.”
Outras sugestões para
resposta israelense efetiva incluem dizer que o direito de retorno
deve ser item de um acordo final “algum dia, no futuro”.
O Dr Luntz observa que os
norte-americanos em geral temem qualquer imigração em massa para
dentro dos EUA, “portanto falem sempre de ‘imigração palestina
em massa para dentro de Israel’ –, e os norte-americanos sempre
rejeitarão a ideia. Se mais nada funcionar, digam que a volta dos
palestinos faria ‘descarrilhar o esforço para alcançar a paz’”.
O relatório Luntz foi
redigido logo depois da Operação Chumbo Derretido em dezembro de
2008 e Janeiro de 2009, quando morreram 1.387 palestinos e nove
israelenses.
Um capítulo inteiro é
dedicado a “isolar o Hamás, apoiado pelo Irã, como obstáculo à
paz.” Infelizmente, agora, quando está em curso a Operação Fio
Protetor, iniciada dia 6 de junho de 2014, e nova matança de
palestinos, há um problema grave para a propaganda de Israel, porque
o Hamás está rompido com o Irã por causa da guerra na Síria e
está completamente sem contato com Teerã. Só reataram relações
amistosas há poucos dias – e por causa da invasão israelense.
Muitos dos conselhos do
Dr Luntz tratam do tom e do modo de expor o pensamento de Israe0l.
Diz que é absolutamente crucial mostrar vastíssima simpatia pelos
palestinos:
“Os persuasíveis [sic]
não dão importância ao que você saiba, até que se convençam de
que você lamenta muito, do fundo do coração, toda a situação.
Mostre empatia PELOS DOIS LADOS!”
Isso provavelmente
explica por que tantos porta-vozes israelenses vão praticamente às
lágrimas quando falam do sofrimento dos palestinos bombardeados por
bombas e mísseis israelenses.
Em frase escrita em
negrito, sublinhada e toda em maiúsculas, o Dr Luntz diz que os
porta-vozes ou líderes políticos israelenses NÃO DEVEM, NÃO
PODEM, nunca, de modo algum, justificar “o massacre deliberado de
mulheres e crianças inocentes”, e devem reagir agressivamente
contra qualquer voz que acuse Israel por tal crime. Vários
porta-vozes israelenses esforçaram-se muito para seguir esse
conselho na 5ª-feira passada, quando 16 palestinos foram mortos num
abrigo da ONU em Gaza.
Há uma lista de palavras
e frases a serem usadas e uma lista de palavras e frases a serem
evitadas. Há de tudo: “O melhor meio, o único meio, para alcançar
paz duradoura, é alcançar respeito mútuo.” O mais importante é
que o desejo de paz de Israel com os palestinos tem de ser sempre
enfatizado, porque é o que os norte-americanos mais querem que
aconteça. Mas se se observarem pressões para que Israel realmente
faça alguma paz, a pressão deve ser imediatamente reduzida; nesse
caso, os israelenses devem dizer:
“um passo de cada vez,
um dia depois do outro” – expressões que serão facilmente
aceitas como “abordagem de bom senso, para a equação ‘deem-nos
A terra, que lhes damos a paz’.”
O Dr Luntz cita como
exemplo de “pegada israelense muito eficaz” a seguinte frase:
“Quero muito particularmente falar às mães palestinas que
perderam seus filhos. Nenhum pai ou mãe deveria ter de enterrar suas
crianças.”
O estudo admite que o
governo israelense não quer, de fato, qualquer solução de dois
estados, mas diz que isso não pode ser declarado publicamente,
porque 78% dos norte-americanos são favoráveis àquela solução.
Devem-se enfatizar sempre as muitas esperanças de que os palestinos
progridam economicamente.
O primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu é citado com elogios, por ter dito que “já é
hora de alguém perguntar ao Hamás: o que, afinal, estão fazendo
para melhorar a vida de seu povo?!” A hipocrisia, aí, é
inacreditável: é Israel, com os sete anos de bloqueio econômico
que impõe a Gaza, quem reduziu Gaza ao estado de pobreza e miséria
em que vive hoje.
Em todos os casos e
ocasiões, o modo como porta-vozes israelenses apresentam os fatos é
planejado para dar a norte-americanos e a europeus a impressão de
que Israel desejaria muito a paz com os palestinos e estaria disposta
a ceder para chegar à paz. Todas as evidências, e também o Manual
do Dr. Luntz, sugerem que tudo aí, são mentiras. Embora não tenha
sido requisitado ou produzido com essa finalidade, poucos estudos
mais reveladores foram jamais escritos sobre a Israel contemporânea,
em tempos de guerra e paz. *****
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Patrick Oliver
Cockburn é um jornalista irlandês, correspondente no Oriente Médio
desde 1979.
Extraído de:
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